A lógica nem sempre casa com a política,
e o que pareceria óbvio a um distante observador no tempo (ou no espaço), pode
custar mais esforços e expectativas
de o que previsto.
Talvez o erro original, o ur-equívoco haja sido a admissão de um
milhão e cem mil refugiados por Angela Merkel, no passado próximo,
revoltada talvez pela cínica negativa das grandes potências em sequer
considerar parâmetros um pouco além do medíocre e do egoístico.
Decerto foi um beau geste o de Angela Merkel, abrindo as cancelas das mesquinhas
alfândegas. Nem sempre, porém, a
iniciativa generosa atende aos requisitos do cotidiano. E o mais de milhão de
refugiados, a que o mundo ocidental
fingia não ver, assim como o cadáver do menininho morto, em alguma praia
da Turquia, se poderia enternecer a mídia, não era peso para movimentar as
balanças do egoismo.
Agir segundo o certo eticamente
falando, é um caminho que pode ser perigoso, quando principiam a aumentar as
ameaças dos hunos acolhidos pela
compaixão, e que trazem para o mundo regrado dos hipercivilizados a carantonha
da miséria, da fome e do desespero, que se esquecem rápido da misericórdia e caem
nos aut-aut da violência e do crime.
Há muitas dúvidas no horizonte
político alemão. A eleição de 24 de
setembro último deixara a Chanceler Merkel e seu partido enfraquecidos. Os
neofascistas da Alternativa para a
Alemanha, em aparência, se deram bem, mas não se desconhece que os
sufrágios nos neonazistas são pouco mais do que folhas ao vento. Na verdade,
restringem a capacidade dos partidos democráticos, tornando-lhe o espaço vital
cada vez mais apertado e sem alternativas.
Colocada sob pressão, são poucas as
saídas para a Merkel, com os cães do nazismo nos próprios calcanhares. A gratidão e a memória não são personagens benvindos nesse tipo de
jogo. O eleitor, por seu lado, tem a
memória curta, exige muito, mas concede pouco.
Em outros mundos, pareceria que o
abandono pelos Livre Democratas (FDP) da liderança da CDU não semelha ter lógica. No entanto, a gratidão é moeda de parvo valor
na política. Para um partido tantas vezes salvo pela CDU como os democratas
livres, a recusa no ano passado do
necessário apoio rescende a covardia, ou, o que dá no mesmo, a exigências
absurdas que se agarram ao presente e ignoram as insídias do futuro.
É estranho como o maximalismo dos
grandes partidos como o SPD possa
ignorar a realidade. Apesar de que a CDU
e a CSU (a seção bávara) admitam o limite de duzentos mil ingressos, eis que a
SPD quer mais e assim dizem se deva ignorar quaisquer restrições. A generosidade nesse assunto deve, no
entanto, caminhar ainda mais na companhia do bom senso. O pretérito gesto da Merkel de admitir mais
de um milhão de estrangeiros decerto surpreendeu em mundo onde prevalece o
egoismo no conta-gotas imigratório, a exemplo de tantos outros países. Dadas as
suas implicações, o bom senso, mesmo na
extrema bondade, deve prevalecer sobre arroubos que acabam beneficiando os
neo-nazistas, que são os manipuladores do medo e da burrice, além de seu
próximo, quase carnal parente, que é o velho, cauteloso, mas quase sempre
estúpido, que é o egoismo acima de tudo.
( Fonte: The New
York Times )
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