O presidente Donald Trump tem um problema pendente. Todos sabem disso, até a loquaz mídia, que se
diverte em passar recados.
Enquanto, lentamente, o inverno
atravessa o território dos Estados Unidos, e as pessoas cogitam de como
vencê-lo, e em escapar das gélidas nevadas e das ocasionais tempestades, lá
dentro da Casa Branca Trump pensa em como avançar e também resistir ao lento
degelo que a ronda das estações há de trazer.
Na Antiguidade, as populações contemplavam com temor a passagem
dos cometas. Diziam que aqueles brilhantes intrusos na esfera celeste seriam
mensageiros de desgraças, de secas terríveis, de bárbaras invasões, de pestilência e da sorte madrasta.
Superstição, diziam os sábios de antanho, mas o zé povinho olhava para o firmamento,
balançava cabeça e nada dele ficava, ao desaparecer no infinito. Aqueles correios tardavam em aparecer, mas
quando repontam no silêncio do céu azul profundo, boa coisa diziam os mais
velhos eles não prenunciavam naquela passagem tão luminosa quanto solitária, em meio às imóveis, cintilantes estrelas, que
adentrava o cerúleo e profundo silêncio, em uma travessia vinda de destino
ignorado rumo ao silente abismo celeste, onde reina a noite das abóbadas sem
nuvens, como um real arauto, a anunciar indecifráveis, e, no entanto, próximas calamidades.
O presidente Donald Trump tem problemas pendentes. Ora, vejam só. Em junho último, ele se defendera
por haver demitido o diretor do FBI, James B. Comey, denegando que o ato
estivesse conexo à maneira com que ele tratara
da investigação da Rússia. Acrescentou Trump, a
par disso, que ele estaria "cem por cento" desejoso disposto a prestar declaração sob juramento
para Mr Mueller.
Perguntado agora sobre depoimento
sob juramento para o Conselheiro especial Robert S. Mueller III, que investiga
se a sua campanha conspirou com a Rússia para alterar o sentido da eleição de 2016, o
Presidente Trump declinou, nesta quarta-feira, de comprometer-se nesse sentido
com Mueller, voltando atrás de seu compromisso no ano passado de que falaria para o Promotor Mueller sob juramento.
Agora na conferência de imprensa
com a Primeira Ministra Erna Solberg, da Noruega, perguntado de novo sobre a
questão, Trump disse que "falarei
com advogados". "Veremos o que
acontece." Como o público terá presente, a resposta atual é muito diversa
daquela de junho, em que disse que estaria "cem por cento" concorde
em prestar depoimento juramentado para Mr Mueller.
Sem embargo, Trump voltou a
repetir a crítica do inquérito de Mr Mueller
como "uma caça às feiticeiras", e que as investigações realizadas pelos
comitês congressuais era "um embuste Democrata." Através do Tuíter, ele se referiu à Senadora Dianne Feinstein, da Califórnia, a democrata
mais antiga no Comitê do Senado que
conduz investigação sobre a
interferência russa como "sneaky" (descuidista, ardilosa), um adjetivo
pejorativo que se emprega para furtos que passem desapercebido, etc. Trump
ficou enfurecido com a sra. Feinstein, em especial, por transcrever testemunho
ao Senado por um dos fundadores da firma
que produziu um dossier picante e, em grande parte, não comprovado, que esboça
o esforço da Rússia em favorecer a
campanha de Trump. Nesse sentido, o presidente exigiu que os republicanos
"tomassem afinal controle" das investigações.
Ainda na quarta-feira, os Democratas
do Senado divulgaram extenso relatório
que conclui em que a interferência russa na eleição presidencial de
2016 se amolda à perfeição em prática de duas décadas de interferência russa com governos em toda a
terra, e acusa o próprio Trump de obstaculizar a resposta dos Estados Unidos à séria
ameaça à segurança nacional.
"Nunca antes na história
americana uma ameaça tão clara para a segurança nacional tem sido de forma tão
evidente ignorada por um Presidente estadunidense", assevera o Relatório.
Mr Trump, nas suas observações,
repetiu a afirmação feita amiúde, que ele, na verdade, foi inocentado (cleared) de conspirar com a
Rússia."Foi determinado que não houve qualquer colusão - e por virtualmente todos",
disse o Presidente. "Quando eles não tem qualquer colusão para mostrar, e
ninguém encontra alguma colusão em qualquer nível, parece improvável que se
realize até mesmo uma entrevista."
Sem embargo, o Comitê do Senado
sobre Inteligência e as contrapartes da
Câmara não chegaram a conclusão nessa questão, que também se crê Mr Mueller
esteja explorando, juntamente com a possibilidade de que o presidente esteja
examinando se o Presidente ou sua equipe obstruíram justiça ao demitir Mr
Comey.
Por sua vez, o relatório
democrata sobre a interferência russa examinou os esforços do governo Putin em
dezenove países, descreve campanhas de desinformação assim como o financiamento
de causas de extrema direita e a manipulação das fontes de energia que
antecedem de muito a campanha de 2016, de forma a dar elementos aos agentes
americanos como reagir a esforços similares dentro dos Estados Unidos.
O documento em tela
oferece mais de trinta recomendações para salvaguardar o processo político
eleitoral dos Estados Unidos, trabalhar
com os seus aliados, máxime na Europa,
para estabelecer novos moldes para enfrentar esse tipo de ameaça. Para
tanto, incluem sanções novas contra essas ameaças: propõem, dessarte, novas
sanções contra estados que realizem ataques cibernéticos nas eleições, ou
contra infraestrutura de crítica importância,
assim como reuniões internacionais de cúpula, v.g., obrigar as
companhias da mídia social a revelar as fontes de custeio para anúncios
políticos.
Em consequência, o documento
do Congresso conclama mr Trump "a afirmar a liderança presidencial"
para estabelcer uma resposta de todo o governo aos esforços da Federação Russa,
inclusive criando um centro interagencial
segundo o modelo do Centro Nacional de Contra-terrorismo, com vistas a
coordenar a consequente reação estadunidense.
É relevante, outrossim,
a atenção especial dispensada à ascensão e à manutenção do poder na Rússia,
que se deveu notadamente ao emprego da força e à sabotagem de instituições dentro da Rússia (as inquinando de
suspicácia como se fossem agentes estrangeiros, e por conseguinte desleais).
Nesse sentido, o relatório dá informações relevantes para as ações coordenadas
tomadas por nações Européias, inclusive Alemanha e países nórdicos, como
modelos para contra-arrestar os
instrumentos russos, e.g. desinformação e hacking.
Nesse contexto, é de
sumo interesse a observação do Senador Benjamin Cardin. Na sua qualidade de
representante da minoria democrata no Senado, disse o Senador por Maryland:
"não são as investigações da intromissão russa, mas a própria inação do
Presidente diante do atrevido ataque de Moscou que está prejudicando o país. Enquanto
o Presidente Trump nada faz, mr Putin continua a refinar o seu arsenal assimétrico e explorando futuras oportunidades para
desgovernar a governança e solapar o apoio para as instituições internacionais
e democráticas, " disse o Senador Cardin.
Ainda na entrevista de
quarta-feira, com a Primeira Ministra Solberg, da Noruega, Trump valeu-se do Tuíter e da conferência de
imprensa para taxar as investigações sobre a Rússia como uma farsa de motivação
política. Por outro lado, pressionado
pela entrevista sob juramento com Mr Mueller,
Trump voltou a valer-se de seu batido recurso de uma vez mais desviar a
atenção pública das próprias faltas e culpar Hillary no caso do uso de seu
servidor de e-mails.
São ações de alguém que se sente na
desconfortável posição de ter de responder
por suas faltas (ou crimes). Sem
dar-se conta do ridículo da ação, pensa ainda ser possível usar Hillary
Clinton pelo seu emprego do ramal público do computador como uma conveniente,
mas deslavadamente cínica tentativa de procurar desviar a atenção sobre eventuais crimes por ele cometidos.
( Fontes: The New York Times; The New
Yorker )
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