A foto do bebê inerte, mas ainda vivo,
levado pelas mãos do socorrista, evoca lembrança do menino de tenra idade que
parece repousar nas areias de praia do Mediterrâneo oriental.
O que tem Davi Martins, de seis meses
de idade, com Aylan Kurdi? Talvez sejam vítimas da indiferença dos homens. No
caso do garotinho de três anos que se encolhe, com o rosto encoberto, nas
ásperas areias de praia esquecida do Mediterrâneo oriental, o veredito será demasiado
fácil. Aylan Kurdi dá a impressão de
dormir, eis que um naufrágio de
refugiados sírios devido à superlotação
nos faz crer que o gurizinho foi docemente empurrado para aquele canto que a
placidez da imagem nos grita sobre o
sacrifício dos inocentes.
Pode-se dizer que os socorristas do bebê Davi Martins tudo fizeram para
salvá-lo de destino tão perverso quão incompreensível. No entanto, não atravessamos nenhuma guerra
civil na Síria que o mar cruel lançou para a praia esquecida, onde o seu corpo
foi dar empurrado pela maldade dos poderosos.
Não. Ele e o irmão mais velho estavam
ao lado da mãe, na lancha superlotada. O pessoal encarregado fez questão de dizer
e reiterar que todos os requisitos de segurança foram atendidos. A lancha,
dizem as autoridades, apesar de levar muita gente, os limites de segurança
estavam preservados. Muita, muita gente
ía nela, porque queria viajar para a ilha de Itaparica...
Logo que zarpou, no entanto, uma
onda mais forte a sacudiu, e a mãe não pode reter o filho menor, que a fúria
das vagas fez cair no mar...
Que tipo de segurança é essa em que
os barcos vão superlotados e bebês de colonos são arrancados dos colos
maternos pela fúria das ondas? Onde
estão os equipamentos de segurança? Onde está a segurança da embarcação?
A mãe chora copiosamente e se
sente culpada de que não segurou mais forte a Davi Martins? Mas se é para
perguntar, onde estão os cintos de
segurança para quando o mar estiver encapelado?
Quantas vidas estão ao deus
dará nesses barcos como o de Pará, que era clandestino, apesar de estar lotado
de passageiros? E Davi Martins, que recebeu todas as atenções com o carinho e a
devoção de que nossa gente é capaz ?
Regras mais estritas, barcos menos carregados de gente, observância
pelas autoridades das condições de segurança, evitam o efeito Bateau mouche... Alguém se lembra
daquela gente alegre que embarcara na baía de Guanabara para curtir o novo
Ano? A situação dos barcos e as suas
regras de segurança, tanto dos passageiros, quanto da própria embarcação foram
realmente melhoradas, tornadas mais adequadas para esse mar que pode ser azul e
límpido, como cinzento e encapelado?
O Povo brasileiro é único
pelo seu coração grande, tão grande que até uma baleia Jubarte consegue salvar,
enquanto outros povos a transformariam em carregamento de sushi?
O que falta ao povo
brasileiro é a consciência de que se
Deus é nosso co-nacional, por vezes ele exige um pouco de atenção, respeito e a
canseira das providências da segurança que podem ser trabalhosas e
enfadonhas, mas estão longe de ser faina inútil. Juntemos a esse sopro bom e generoso
que nos anima e alegra um pouco, uma pitada quem sabe de cuidado e atenção com
a segurança.
Assim como baleias, brinquemos
também de salvar vidas humanas.
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