Por falar em crueldade, essa
volúvel presença na História, a chamada sorte madrasta que a ela está tão
intrínseca, incompreensivel e revoltantemente ligada, não é que essa helênica
característica a entrevemos com pesar e mesmo desconforto demasiado ligada a
uma mulher brilhante, contra quem os fados parecem conspirar.
A tal ponto, ela
se desencadeia, que podemos abrir-lhe as portas e recorrer a essa franqueza que
só nos é concedida em instantes extremos.
Personagens
do destino, personagens que por qualidades e perseverança, se destacam do próprio cenário, cabe-lhes, por
capricho da Fortuna, que a sorte madrasta venha visitá-los com a força do
inesperado e o diverso diapasão de que outros são não tão estranhamente
poupados.
Porque a
candidata Hillary, ainda que nascida alhures, vem do Arkansas, pequena
província no sul dos Estados Unidos, a que a turma que gravita em torno da
Costa Leste muita vez torce o nariz.
Por outro lado,
só é compreensível que ela, com tantas contribuições para a República - e não
será a menor delas uma reforma da Saúde que de longe supera a lei que aí está
(e mesmo assim suscita o ódio da direita republicana) - venha a sofrer tal
campanha animosa que merece das fileiras da agremiação que não se peja de
chamar-se Grand Old Party ?
Hillary cometeu
erros na passada eleição? Sim! Mas antes de condená-la, passem-nos, por nímio
favor, o cartapácio dos equívocos cometidos pelo seu Adversário!
Talvez a mãe de todos os seus erros esteja
na circunstância de que ousou servir-se de um servidor particular na
computação. Por mais que os seus implacáveis perseguidores - empoleirados no
abrigo sereno que lhes proporcionara o gerrymander
desencadeado após o shellacking que
o inexperiente Obama fizera cair-lhe por
cima e até hoje tão fervorosamente silenciado tanto pela mídia, quanto por
todos que dele se beneficiam. Encarniçaram-se,
na sua eterna enquanto dure falsa maioria na Câmara de Representantes, e
literalmente contra ela se lançaram, primo, para inculpá-la da morte de um
pobre embaixador, abatido na linha do dever, na longínqua Líbia, e, secondo,
diante do malogro da primeira investida, porque não uma segunda, com o achado
do sucessor de J.Edgar Hoover, sim, Mr James Chamey, diretor do Federal Bureau
of Investigations. Como nas touradas, ele não aparece matando o touro (desculpe
Hillary) do famigerado servidor privado, mas como esse bom republicano se
empenhou em procurar reduzir, ou talvez, infirmar, a dita capacidade de Hillary
Clinton de ser uma boa administradora.
Pela sua
persistência - que se assinala por desconhecer as determinações de seus
superiores - e nisso Mr Chamey entra com largas e pesadas passadas no rastro
portentoso do grande criador do F.B.I., a figura de J.Edgar Hoover - que por
décadas pairou no cenário de Washington e adjacências (sobretudo adjacências),
quando infernizou a vida de muitos secretos desafetos (em geral os infelizes só
muito tarde se aperceberiam dessa distinção dele recebida). Não sei se o
imortal Charlie Chaplin entrou nessa categoria por ser inglês, suposto
comunista ou - o que é pior para as mediocridades coroadas - um gênio, no caso
do cinema. Talvez o único erro de
Chaplin tenha sido aceitar o prêmio de Oscar-consolação, que é o de conjunto de
obras (justamente àqueles que tudo fizeram por merecer a invejosa admiração da
Academia).
Mas estava
escrito. Hillary, por ser fiel ao marido, Bill Clinton, por ter abraçado o
Arkansas, e pela sua trajetória política, será que mereceria ser derrotada por
essa nêmesis da Democracia, e que tanto mal - ele e seus cupinchas republicanos
- promete fazer à amada Pátria americana ?
Na
política, não há justiça, mas talvez, ao
escolher Mr Donald Trump, o Povo americano tenha realmente pisado na bola
(metáfora de erro crasso no soccer), e
não vai demorar muito para que disso, tanto os redneck, os moradores no
cinturão da ferrugem, and you name it (em termos de listas de alegados
infelizes da sorte) para explicar esse auto-golpe (na verdade, um murro contra
si mesmo, aplicado pelo gigante americano ou o Capitão America - a escolha é
livre).
Agora, se
querem encontrar o responsável pela vitória de Trump, não será o intelectual
Mitch McConnell que de novo voltará à liderança no Senado, nem o gerrymander da
Câmara de Representantes, esse segredo de polichinelo (que a corajosa mídia se
empenha em não mencionar), nem Mr James Comey (parabéns, Obama, por escolher um
republicano para o FBI!) - ele é na verdade o Povo Americano!
E como a
crueldade sói ser atributo dos medíocres e dos fracos da mente, preparem-se - e
como dizia meu velho chefe Silveira - apertem o cinto, que aí vem muita
turbulência!
(Fontes: mundo atual, eleições na América do Norte).
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