Timothy Garton Ash escreve oportuno
artigo, sob o título "A onda do populismo nacionalista se move pelo
Ocidente". Traduzido pelo Estadão, essa matéria ganha ainda maior
relevância pela estapafúrdia vitória de Donald Trump sobre Hillary Clinton
(como de hábito, nesses casos, ele venceu no colégio eleitoral, mas perdeu no
voto popular).
Assim, o
populismo também ganha na América. O 'triunfo' de Trump sobre Hillary tem
muitas causas, muitas delas as restrições do establishment liberal americano
contra a candidata democrata. Sob uma capa de alguns arrevezados elogios, o que
se vê é uma cachoeira de reprimendas à
esposa de Bill Clinton, seja pelo fato de perdoá-lo, seja por vir do Arkansas,
seja por ter sido ótima Secretária de Estado. A própria New York Review dedicou
um número à candidata Hillary, e ler as matérias preparadas por seus amiguinhos
liberais democratas pode explicar muito dos votos que faltaram à Hillary
Clinton, quando deles precisou.
O resultado de tanta enraivecida
simpatia, quanto o voto rancoroso e pequeno burguês da "Little
America" produziu esse monstro do GOP, que hoje pode estar enganando a
muita gente, inclusive o próprio
Presidente, ao cabo de uma hora de conversa.
Vamos esquecer, por um instante, os
propósitos declarados desse 'expoente' da direita nacionalista, por ora
superficial (por enquanto é amigo até de V. Putin...), e apliquemos a este
senhor o dito evangélico: dize-me com quem andas e eu te direi quem és...
Não é que Mr
Putin, o inovador político, já desencavou muitos amigos seus, como Chris
Christie, de New Jersey (como agilizar o tráfico auto-estradal), Rudolph
Giuliani, de New York, Newt Gingrich
(Contract with America). O que os caracteriza é que são todos de segunda
mão, e as suas propostas ou estão
ultrapassadas, ou esquecidas.
Mas voltemos
ao artigo de Garton Ash, na sua análise de populismo nacionalista. Na França,
Marine Le Pen por enquanto tem sido controlada, por conta do segundo turno
francês, quando a esquerda esquece as suas rixas, e se une para evitar o pior.
Por isso, o socialista François Hollande pode até reeleger-se, pois felizmente
o Front Nationale ainda não logrou a maioria de votos que conduzisse a filha de
Le Pen para o Elysée.
Na Europa, e o
Brexit é prova de que essa doença da mediocridade política também já contaminou
os Estados Unidos, pois não é crível que em um país com uma política saudável
Mr Trump possa ser eleito.
O populismo nacionalista que Timothy Garton
Ash ressuscita no seu artigo para o Economist apresenta preocupantes
características nessa reedição lamentável de um movimento histórico que
caracterizou a Europa do entre-guerras, quando tentara resolver o extremo malaise social (mal-estar) com o recurso
à direita (excluídas, então, a França e a Inglaterra). Naquela, o front populaire de Léon Blum, e nesta o
predomínio dos Conservadores de Neville Chamberlain (que pensou até 1939 que se
podia negociar com Adolph Hitler) a democracia seria mantida.
No resto da
Europa, no entanto, o que se viu foi o triunfo da direita: Francisco Franco, na
Espanha, Salazar, em Portugal, e na Europa do Meio (Mittel-Europa) uma série de
governos fascistóides, que seriam presa fácil para a Alemanha nazista.
Na Europa
atual, mesmo aquela nominalmente sob o estandarte de Bruxelas, como a Hungria,
de Viktor Orban,com o seu regime fascistóide, já é desde muito uma contradição
viva dentro da União Européia. O Brexit, na Inglaterra, pela sua
irresponsabilidade (caracterizada pela ligeireza com que o medíocre David Cameron
tratou do assunto). Incrivelmente ele
julgara possível despertar o monstro da saída da UE como se fora um bicho-papão
bonzinho, com emprego passageiro e inócuo, que só serviria para livrá-lo de uma
facção incômoda dentro dos tories... Deu no que deu, e agora esta senhora
Theresa May (que não é nenhuma Thatcher) bate pé contra os altos tribunais, que
num gesto de clarividência (hoje extremamente em falta) votou contra o Brexit.
Talvez a vinheta final, para desmoralizar
esse arroubo pequeno-burguês, esteja na aliança entre a 1ª Ministra May e Boris
Johnson (que chegou ao cúmulo de escrever dois artigos, um contra e outro a
favor do Brexit...). A par das perspectivas para o Reino Unido - que deixará de
ser Unido - com a confirmação da suposta vontade popular, a realidade inglesa
de hoje nada tem a ver com a postura churchilliana que seria determinante para
a posterior vitória dos Aliados contra o nazismo.
Com a acessão
de Donald Trump, os Estados Unidos surge como um cativo da direita
envergonhada, tanto na Flórida, quanto alhures, e não promete para o chamado
'mundo livre' perspectivas demasiado promissoras.
Em política,
e em especial a internacional, as amizades são presas dos interesses nacionais
e do respeito à democracia e à liberdade. Mr Trump, se confirmada a sua
estreita amizade com o senhor do Kremlin, terá de fazer grandes escolhas. Se
Vladimir Putin é o amigão, o que fazer da NATO?
Qual será o significado dessa aliança dos Países do Atlântico Norte, se
o seu Padrinho acredita nas boas intenções de Bábuchka (Paizinho) Putin ? E
como fica a luta contra o ditador Bashar al-Assad, que, convenhamos, o bom
presidente Barak Obama muito contribuíu para enfraquecer, negando a idéia de Hillary e dos demais chefes de ministério de dar mais apoio militar à união dos adversários do ditador Bashar ?
Relembrar a
década dos trinta no século passado não é exercício agradável e prazeroso. Os que então viviam assistiram ao crescimento
do nazi-fascismo e dos pequenos ditadores (Hungria, Iugoslávia, Romênia), todos
movidos pela ilusão de que era possível um acordo com o demônio, no caso, Adolph
Hitler.
Hoje em
dia, não me parece que a Grã-Bretanha de então, e a própria França - que tinham armas e exércitos capazes de
enfrentar (segundo se pensava) o Fuhrer, disponham de força suficiente para
agirem de forma autônoma para deter o fantasma do III Reich.
Agora, é
bem verdade que a União Soviética pode ser considerada um fantasma do passado,
embora gospodin Vladimir V. Putin tenha
herdado grande parte do arsenal atômico da anterior segunda Super-Potência.
Expulso
do G-8 como ficará agora Putin, com o seu Amigão como líder nominal do
Ocidente? E os outros países - aqueles do Báltico, a Ucrânia, e até a Polônia -
todos esses, como se sabe, são informalmente incluídos na política do Kremlin
como pertencentes ao estrangeiro próximo,
como serão tratados pela OTAN ?
Se Trump pensa
que as amizades contraídas fora do poder são suscetíveis de valer em uma nova
realidade, como é que fica a posição de Washington - como campeão da democracia
e da Aliança do Atlântico Norte ? Tudo
isso o novo Presidente americano pensa resolver diretamente com o Amigão Putin
?
E ao fim e ao cabo, dentre os
não-mencionados, existe segundo Timothy Garton Ash, como a hodierna líder do
Mundo Livre, a Chanceler Angela Merkel.
Creio que não haveria melhor
nome para substituir a Barack Obama, mas o termo líder do Mundo Livre tem que
ter, no meu pobre entendimento, o arrimo da força nuclear. Senão, que
significado terá para um realista como Putin? Há muitas explicações porque
Angela Merkel não dispõe dessa condição. Ela tem decerto a força moral, mas de
que lhe valeu tal força nas discussões com V. Putin acerca dos acordos
provisórios discutidos sobre a Ucrânia? E ela tinha a companhia do Presidente
francês François Hollande...
Quem sabe o jeito seria ladear o novo
presidente Donald Trump com a Merkel e o presidente francês ?
( Fontes: Estado de S. Paulo,
The New York Review of Books, Timothy Garton Ash )
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