sábado, 12 de novembro de 2016

Populismo nacionalista ?

                                                                

        Timothy Garton Ash escreve oportuno artigo, sob o título "A onda do populismo nacionalista se move pelo Ocidente". Traduzido pelo Estadão, essa matéria ganha ainda maior relevância pela estapafúrdia vitória de Donald Trump sobre Hillary Clinton (como de hábito, nesses casos, ele venceu no colégio eleitoral, mas perdeu no voto popular).
         Assim, o populismo também ganha na América. O 'triunfo' de Trump sobre Hillary tem muitas causas, muitas delas as restrições do establishment liberal americano contra a candidata democrata. Sob uma capa de alguns arrevezados elogios, o que se vê  é uma cachoeira de reprimendas à esposa de Bill Clinton, seja pelo fato de perdoá-lo, seja por vir do Arkansas, seja por ter sido ótima Secretária de Estado. A própria New York Review dedicou um número à candidata Hillary, e ler as matérias preparadas por seus amiguinhos liberais democratas pode explicar muito dos votos que faltaram à Hillary Clinton, quando deles precisou.
        O resultado de tanta enraivecida simpatia, quanto o voto rancoroso e pequeno burguês da "Little America" produziu esse monstro do GOP, que hoje pode estar enganando a muita gente,  inclusive o próprio Presidente, ao cabo de uma hora de conversa.
        Vamos esquecer, por um instante, os propósitos declarados desse 'expoente' da direita nacionalista, por ora superficial (por enquanto é amigo até de V. Putin...), e apliquemos a este senhor o dito evangélico: dize-me com quem andas e eu te direi quem és...
       Não é que Mr Putin, o inovador político, já desencavou muitos amigos seus, como Chris Christie, de New Jersey (como agilizar o tráfico auto-estradal), Rudolph Giuliani, de New York, Newt Gingrich  (Contract with America). O que os caracteriza é que são todos de segunda mão, e as suas propostas  ou estão ultrapassadas, ou esquecidas.
         Mas voltemos ao artigo de Garton Ash, na sua análise de populismo nacionalista. Na França, Marine Le Pen por enquanto tem sido controlada, por conta do segundo turno francês, quando a esquerda esquece as suas rixas, e se une para evitar o pior. Por isso, o socialista François Hollande pode até reeleger-se, pois felizmente o Front Nationale ainda não logrou a maioria de votos que conduzisse a filha de Le Pen para o Elysée.
        Na Europa, e o Brexit é prova de que essa doença da mediocridade política também já contaminou os Estados Unidos, pois não é crível que em um país com uma política saudável Mr Trump possa ser eleito.
        O populismo nacionalista que Timothy Garton Ash ressuscita no seu artigo para o Economist apresenta preocupantes características nessa reedição lamentável de um movimento histórico que caracterizou a Europa do entre-guerras, quando tentara resolver o extremo malaise social (mal-estar) com o recurso à direita (excluídas, então, a França e a Inglaterra). Naquela, o front populaire de Léon Blum, e nesta o predomínio dos Conservadores de Neville Chamberlain (que pensou até 1939 que se podia negociar com Adolph Hitler) a democracia seria mantida.
        No resto da Europa, no entanto, o que se viu foi o triunfo da direita: Francisco Franco, na Espanha, Salazar, em Portugal, e na Europa do Meio (Mittel-Europa) uma série de governos fascistóides, que seriam presa fácil para a Alemanha nazista.
          Na Europa atual, mesmo aquela nominalmente sob o estandarte de Bruxelas, como a Hungria, de Viktor Orban,com o seu regime fascistóide, já é desde muito uma contradição viva dentro da União Européia. O Brexit, na Inglaterra, pela sua irresponsabilidade (caracterizada pela ligeireza com que o medíocre David Cameron tratou do assunto).  Incrivelmente ele julgara possível despertar o monstro da saída da UE como se fora um bicho-papão bonzinho, com emprego passageiro e inócuo, que só serviria para livrá-lo de uma facção incômoda dentro dos tories... Deu no que deu, e agora esta senhora Theresa May (que não é nenhuma Thatcher) bate pé contra os altos tribunais, que num gesto de clarividência (hoje extremamente em falta) votou contra o Brexit. Talvez a vinheta final,  para desmoralizar esse arroubo pequeno-burguês, esteja na aliança entre a 1ª Ministra May e Boris Johnson (que chegou ao cúmulo de escrever dois artigos, um contra e outro a favor do Brexit...). A par das perspectivas para o Reino Unido - que deixará de ser Unido - com a confirmação da suposta vontade popular, a realidade inglesa de hoje nada tem a ver com a postura churchilliana que seria determinante para a posterior vitória dos Aliados contra o nazismo.
         Com a acessão de Donald Trump, os Estados Unidos surge como um cativo da direita envergonhada, tanto na Flórida, quanto alhures, e não promete para o chamado 'mundo livre' perspectivas demasiado promissoras.
          Em política, e em especial a internacional, as amizades são presas dos interesses nacionais e do respeito à democracia e à liberdade. Mr Trump, se confirmada a sua estreita amizade com o senhor do Kremlin, terá de fazer grandes escolhas. Se Vladimir Putin é o amigão, o que fazer da NATO?  Qual será o significado dessa aliança dos Países do Atlântico Norte, se o seu Padrinho acredita nas boas intenções de Bábuchka (Paizinho) Putin ? E como fica a luta contra o ditador Bashar al-Assad, que, convenhamos, o bom presidente Barak Obama muito contribuíu para enfraquecer, negando a idéia de Hillary e dos demais chefes de ministério de dar mais apoio militar à união dos adversários do ditador Bashar ?
           Relembrar a década dos trinta no século passado não é exercício agradável e prazeroso.  Os que então viviam assistiram ao crescimento do nazi-fascismo e dos pequenos ditadores (Hungria, Iugoslávia, Romênia), todos movidos pela ilusão de que era possível um acordo com o demônio, no caso,  Adolph Hitler.
            Hoje em dia, não me parece que a Grã-Bretanha de então, e a própria França  - que tinham armas e exércitos capazes de enfrentar (segundo se pensava) o Fuhrer, disponham de força suficiente para agirem de forma autônoma para deter o fantasma do III Reich.
             Agora, é bem verdade que a União Soviética pode ser considerada um fantasma do passado, embora gospodin  Vladimir V. Putin tenha herdado grande parte do arsenal atômico da anterior segunda Super-Potência.
              Expulso do G-8 como ficará agora Putin, com o seu Amigão como líder nominal do Ocidente? E os outros países - aqueles do Báltico, a Ucrânia, e até a Polônia - todos esses, como se sabe, são informalmente incluídos na política do Kremlin como pertencentes ao estrangeiro próximo, como serão tratados pela OTAN ?
             Se Trump pensa que as amizades contraídas fora do poder são suscetíveis de valer em uma nova realidade, como é que fica a posição de Washington - como campeão da democracia e da Aliança do Atlântico Norte ?  Tudo isso o novo Presidente americano pensa resolver diretamente com o Amigão Putin ?
               E ao fim e ao cabo, dentre os não-mencionados, existe segundo Timothy Garton Ash, como a hodierna líder do Mundo Livre, a Chanceler Angela Merkel. 
                Creio que não haveria melhor nome para substituir a Barack Obama, mas o termo líder do Mundo Livre tem que ter, no meu pobre entendimento, o arrimo da força nuclear. Senão, que significado terá para um realista como Putin? Há muitas explicações porque Angela Merkel não dispõe dessa condição. Ela tem decerto a força moral, mas de que lhe valeu tal força nas discussões com V. Putin acerca dos acordos provisórios discutidos sobre a Ucrânia? E ela tinha a companhia do Presidente francês François Hollande...
                 Quem sabe o jeito seria ladear o novo presidente Donald Trump com a Merkel e o presidente francês ?


( Fontes:  Estado de S. Paulo, The New York Review of Books, Timothy Garton Ash )   

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