Bashar
al-Assad já teve várias vidas, nenhuma delas merecedora de elogios e respeito.
Herdou o poder como um reizinho, após a morte do pai, o general Hafez al-Assad (1930-2000), que com mão de
ferro, depois de empolgar o poder em 1970, reprimira com enorme crueldade a
principal contestação que lhe fora feita, no interior sírio.
O filho
Bashar, morto o irmão mais velho que o pai preparara para o poder, jamais teve
visão nem liderança que o habilitasse a crescer diante do legado familial. Ele se encaminhava para outra existência, a de
fugitivo do Tribunal Penal Internacional, quando se decidiu a uma última jogada,
na sua visita in-extremis, de outubro
de 2015 ao Presidente Vladimir Putin, a quem, sob a promessa de dar à Russia,
além do porto e base naval, nas águas quentes do Mediterrâneo Oriental (Tartus),
conceder outras bases tanto aérea, quanto naval à Federação Russa, submetendo-se a Moscou, nos termos dos antigos
submissos aliados do Império Romano.
Nessa
visita acima citada, Bashar viera como suplicante, e de acordo com o ritual de
tais "alianças", Putin fê-lo esperar
o tempo que julgara necessário, para que a "aliança" entre os dois
países pudesse ser estabelecida como num
acordo entre senhor feudal e postulante aliado. Se
Bashar na prática deixava de ser soberano no próprio país, despojando-se do
respectivo orgulho, mantinha sob a "aliança" com o presidente russo a
possibilidade de escapar da sina que pela própria falta de visão política já
lhe pareceria inelutável: na melhor das hipóteses o exílio.
E gospodin Vladimir Putin cumpriu a sua
palavra, acolhendo como aliado um Bashar al-Assad, que pela própria falta de
visão política, ao invés de responder positivamente às ainda tímidas pretensões
de seus súditos descontentes, deixara alastrar-se a revolução síria,
transformar-se em conflagração que tinha as regiões da Terra da Passagem como
infeliz hospedeira.
Se
a mão e o poder do Presidente Putin, mediante as recompensas exigidas, serviram
para afastá-lo da quase inevitável estrada do exílio, Basha continua a mostrar
a velha insensibilidade - que ajudara os rebeldes sírios a escolher o caminho
da revolução.
Apesar do protetor que arranjou,
Bashar não conseguirá decerto
mostrar o que não tem, vale dizer, respeito ao próprio povo, a par de uma
mínima capacidade de governo e de entender que não será como um barão feudal -
que ignora a capacidade de granjear seja respeito, seja gratidão - que terá
alguma possibilidade de manter-se no poder, quando o seu protetor não mais
estiver em condição de ser visitado.
As atrocidades cometidas por Bashar - e esta última, lançando o gás
sarin contra a sua gente, matando muitas crianças - não
só confirmam a sua provada incapacidade de conviver com qualquer tipo de
governo voltado para a vida e os interesses da população, mas também o quanto
ganharia a pobre Síria em ver-se afinal livre desse avantesma da burrice
maligna.
Já referi em outro texto escrito sobre a
revolução síria, que um dos principais e mais pesados erros do Presidente
Barack H. Obama foi a sua negativa de aceder a proposta a ele apresentada pela
Secretária de Estado Hillary Clinton e pelos demais chefes dos departamentos e
agências dos Estados Unidos.
Obama tem recebido atenção muito benfazeja da grande imprensa americana
(v.g. New York Times, Washington Post), no que tange à sua
presidência, e, em grande parte, essa atenção é merecida. No entanto, no que
tange à Siria, a avaliação não será das melhores, sobretudo nesse episódio que,
até o presente, excetuada a sinalização do blog
não encontrou a atenção e o eco que, s.m.j.,
faria por merecer.
Nesse particular, é merecedora de
muita atenção - muito maior daquela que vem até o presente recebendo - a
circunstância de que no que tange ao Afeganistão, autêntico cemitério das
empresas militares ocidentais, esse país continuou a receber uma ênfase
prioritária com relação aos outros teatros de ação - e, em particular, a
abandonada Síria, que não teve a atenção
que faria por merecer.
Por uma triste ironia, o Presidente Obama preferiu omitir-se no que
tange à infeliz Síria, mesmo diante de propostas como a liderada pela sua então
Secretária de Estado, no final de seu primeiro mandato presidencial.
Já escrevi bastante sobre esta matéria. Não há saída diante da extensão
da própria negativa que a omissão em tal causa da parte de Barack Obama não
venha ainda bater-lhe à porta. É nesse particular interessante que o seu
sucessor no encargo de velar pelas questões atinentes aos Estados Unidos da
América, por primário que seja em alguns aspectos, tem mostrado mais sensibilidade ao problema da
Síria, do que ele próprio. A repressão ao ISIS, que tanto avançou no Iraque,
por força do anterior governo de Bagdá, só veio a merecer maior ênfase já quase
no final da Administração Obama.
No que tange à Síria, como premissa deve-se sublinhar que é auspiciosa a
revolta expressa pelo Presidente Trump
quanto ao gesto infame de Bashar, pois é importante que o sucessor de Obama não
se acomode em deixar o "problema" por conta exclusiva do amigo Putin,
que não parece ter a mesma sensibilidade do novo presidente americano, no que
concerne à questão.
O que sairá dessa eventual
iniciativa de Donald Trump acha-se ainda nas sombras dos chamados organismos
competentes. Com efeito, é revoltante
que Bashar al-Assad continue a
evidenciar atitude tão negativa em
relação a sua própria gente, a ponto de
bombardeá-la com o letal gás sarin, como acaba de ser comprovado
Se os Estados Unidos
houvesse mantido presença mais
afirmativa diante do inferno sírio, conforme fora proposto ao então Presidente
Obama pelos quatro chefes, encabeçados por Hillary Clinton, Bashar al-Assad não
teria ousado dispensar a seu povo tratamento de tamanha brutalidade, que, em
beirando o absurdo, compelia o
presidente Donald Trump a prometer pronto
engajamento na Síria - possivelmente em intervenções aereas - para evitar que tais
barbaridades possam repetir-se.
(
Fontes: The New York Times, O Estado de S. Paulo )
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