Não será fácil desfazer uma união de 44
anos. Primo, porque a causa desse
divórcio não foi precedida por nenhum litígio. A própria maneira com que foi
desencadeado o processo, como referido acima, não reflete um movimento popular
ou mesmo a postura de partido político. Não se deve esquecer que o UKip, um
partido anão, não tem qualquer peso em Westminster, e a sua campanha pela saída
de Bruxelas jamais teve impacto substancial no grande cenário político.
O brexit
surgiria por causa de irresponsável gesto de medíocre primeiro ministro, que
pensara livrar-se de problema menor ao concordar com mais um referendo sobre a
permanência na U.E. A própria mediocridade o induziria a "ganhar tempo",
fazendo que o próximo verão resolvesse para ele um problema sem maior
envergadura. Tolo que foi, ao transformar o louco propósito de partido
insignificante em outro muito mais sério, em que tudo se resolveria em passe de
mágica. A velha Inglaterra enfim se livraria dos liames burocráticos da Europa
Continental, e voltaria a alcançar o antigo fastígio, a exemplo da enganosa
facilidade de muitas décadas antes para os jovens soldados alemães que
marcharam com o júbilo de que estariam de volta aos lares respectivos "wenn der Laub fällt" (quando as folhas começam a cair).
A Inglaterra na sua longa caminhada
para participar da construção européia sempre havia deixado aos políticos o
encaminhamento de seus eventuais interesses. Por primeira vez, se entregou ao
Povo, em um momento de confusão política a possibilidade de voltar atrás. Dar a
ele a senda na floresta que o levaria para a clareira translucente da antiga
grandeza, em decisão democraticamente tomada por voto maravilhoso, que livraria
a velha Inglaterra do abraço incômodo dos burocratas do Continente, enquanto a
poderosa Álbion retoma o antigo terreno e poder. Nada de aborrecidos acordos e
convênios de gabinete, enquanto nossos políticos se envolvem e se debatem nos
corredores e nas quizílias do Continente.
Que a velha Inglaterra volte a ser grande, não mais sufocada por
questões e pequenas rixas de regiões e países dos quais nada ou tão pouco
conhecemos!
Seria como se as velhas atoardas do
suposto pacifismo de novo ecoassem, como acontecera às vésperas da IIª Guerra
Mundial.
As decisões simples, tomadas às
carreiras, podem ter resultados desastrosos. Para domar os demônios do
nacionalismo e a ilusão de que prevaleciam as condições que tinham feito da
Grã-Bretanha a superpotência do século XIX, nada mais fácil do que um pedaço de papel a ser transformado em
mágico referendo, decidindo com ilusória simplicidade questões e problemas cuja
complexidade irrita e exaspera os ardorosos patriotas, que fremem por exercer o
encantamento de dispor, às carreiras, no seu caminho do veraneio, de todos os
dissabores e longas esperas, que o dédalo de Bruxelas abriga e procrastina.
Contudo, ao esquecerem que um gesto, uma assinatura, uma solução de exasperante
questão nos corredores da burocracia comunitária, por vezes tende a ser
enfurnada nas letras pequenas dos acordos, que não possuem os sangrentos
choques das antigas batalhas. Esquecem os tolos que a burocracia pode ser
enfadonha, mas não será jamais sangrenta, nem descuidará do auxílio a ser
prestado aos grupos carentes, que pode ser tedioso e por vezes mofino, jamais
te fará lembrar as másculas delícias do mundo hobbesiano.
(
Fontes: Homero, Churchill, Chamberlain )
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