O reconhecimento por Donald Trump da
nova política é anátema àquela seguida por sete décadas pelos Estados Unidos ao
colocar sua embaixada em Jerusalém. A superpotência, embora defensora de
Israel, sempre evitara que tal posição fosse confundida com perigosa e
incondicional submissão à política israelense.
Não é decerto por acaso que Benjamin
Netanyahu possa celebrar com a Superpotência um alinhamento sem precedentes. No
passado, a despeito dos favores de Washington, a superpotência sempre cuidara
de manter uma sombra de abertura para o lado palestino. Essa sombra se torna de difícil determinação
diante de Mike Pompeo, o atual Secretário de Estado, e do Conselheiro de Segurança
Nacional, John Bolton, este último sobretudo marcado por atuação radical, que o
marginalizara em diversas administrações dos dois partidos.
O primeiro ministro de Israel, que
tem sérios problemas na área interna, por ser investigado por corrupção, pode também
celebrar a dádiva da missão estadunidense em Jerusalém, algo impensável em
tantas décadas da crise oriental.
Nunca presidente americano terá
assumido posições tão nefastas - e manifestamente contrárias ao interesse da
paz no Oriente Médio - quanto esse estranho no ninho. E 'Bibi' Netanyahu terá dificuldade de
acreditar em tantas benesses em tão curto espaço de tempo. Perseguido por
investigação policial em matéria de corrupção, eis que surje Trump benefactor, com a maçã na boca do inacreditável
reconhecimento da embaixada dos EUA em Jerusalém, o que despedaça toda a louça
de cuidadosa diplomacia quanto à paz no
Oriente Médio, que carece senão de equidade, pelo menos de uma crível sombra de
igualdade de direitos às Partes nesse litígio.
Tal inauguração ensejada pelo calamitoso
despreparo, ou coisa pior, de parte de Donald Trump - que escarnece de tantas
décadas de respeito aos cuidados e rituais políticos de imponente número de
antecessores políticos (bipartidários na verdade na observância de regras que
não mudavam, tanto sob democratas, quanto republicanos) - ao irromper agora
nesse terreno, com o descuidado que é próprio dos eternos aprendizes - só tende
a prometer ulteriores dissabores, eis que a direita de Trump, pela sua
incompetência, das duas uma, ou é instrumentalizada pelo finório Netanyahu, ou
se deixa carregar a ulterior crise oriental, órfã que está essa antiga causa de
um guardião que, por ter boas ideias na cabeça,
possa vir a livrar-se dos instrumentalizadores de plantão.
(
Fontes: O Estado de S. Paulo, Gláuber Rocha )
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