O que seria já uma dúvida a visitar os
leitores de nossa imprensa se refere justamente ao tópico versado pelo artigo
da Folha - ainda que enfurnado, é verdade,
em página interior do jornal.
Acompanhando a imprensa nacional e
internacional se tem desde logo a noção de que a Odebrecht distribuiu em reais,
dólares ou outra divisa pelos países da América Latina e também da África, e
por conseguinte do risco financeiro em que incorreu.
É justamente movido pelo receio de
que a Odebrecht venha de alguma forma a faltar no vencimento de tais operações
que os bancos brasileiros se estão movimentando. Na sua totalidade, os bancos
nacionais têm cerca de R$ 47 bilhões a
receber da Odebrecht. Com vistas a dar-lhe condições de honrar a dívida, Itaú e
Bradesco - que fazem parte desses credores - estão na fase final de negociação
de novo empréstimo para a Odebrecht, que deve ser anunciado no correr desta
semana.
Sem caixa, com prejuízo da ordem de R$
3 bilhões numa dúvida lançada sobre os auditores de seu balanço, a empresa deixou de pagar R$
500 milhões em juros para investidores que compraram títulos no exterior, há
cerca de três semanas. Além disso, em um
ano, a empresa ainda tem outros R$ 3 bilhões em dívidas vencendo.
Nesse contexto, o temor dos bancos
credores é de que, caso a Odebrecht deixe de honrar o que deve, se desencadeie
um processo de vencimento antecipado de
toda a dívida. Isso levará os bancos a
terem que fazer provisões para perdas que podem afetar diretamente seus lucros.
Somente os bancos públicos têm
cerca de R$ 30 bilhões a receber das em-presas da Odebrecht, valor que não
contabiliza possíveis avais e fianças. Dentro dessa categoria, o BNDES é o
maior credor, com R$ 13 bilhões, seguido do Banco do Brasil com R$ 10 bilhões e
da Caixa Econômica Federal, com R$ 7,5 bilhões.
Já entre os bancos privados, os
maiores credores são Itaú e Bradesco, com uma exposição de R$ 4,5 milhões cada
um. Depois vem Santander e Sumitomo, com cerca de R$ 1,5 bilhão cada, e depois
Votorantim, com R$ 800 milhões. Do total que o grupo Odebrecht deve ao sistema
bancário, a parcela que se reporta a Braskem soma cerca de R$ 17 bilhões. No entanto, isso é o que menos preocupa as
instituições financeiras, já que o braço petroquímico do grupo é considerado o
ativo mais promissor.
A Braskem tem um potencial tão
elevado dentro da atual realidade do grupo Odebrecht, que os bancos entraram
numa disputa para fazer uma espécie de segunda hipoteca das ações da
companhia. Itaú e Bradesco se dispuseram
a emprestar mais dinheiro ao grupo, desde que possam ter a garantia das ações e
a condição de que em caso de calote serão os primeiros a receber o ativo,
apesar de se tratar de uma segunda "hipoteca". A Odebrecht precisa de
R$ 3,5 bilhões para honrar compromissos de curto prazo. Mas não vai conseguir
essa quantia com Itaú e Bradesco.
Encontraram pela frente o Banco do Brasil.
Os executivos do BB não
querem abrir mão da garantia que possuem com as ações da Braskem , obtidas na
renegociação das dívidas da Odebrecht Agroindustrial, que hoje se chama Atvos.
Na época, 100% da
Braskem foi dada em garantia. Desde então, as ações valorizaram e agora é
possível, segundo fonte próxima à Odebrecht, ampliar as garantias por meio das
ações da Braskem. Mas os executivos do BB resistem à ideia. Pesa entre eles o
fato de que o ex-presidente do banco,
Aldemir Bendine, haja sido condenado pelo juiz Sergio Moro a onze anos de prisão
por receber propinas da Odebrecht quando chefiava a Petrobrás, em 2015.
Apesar de a prisão ocorrer quando Bendine estava na
Petrobrás e não no BB, os executivos não querem abrir margem para serem
questionados por não primarem na defesa do dinheiro do banco. Mesmo sob o
argumento de que sem um novo empréstimo a Odebrecht pode caminhar para uma
recuperação judicial.
Os grandes credores não querem que a
negociação venha a cair no foro judicial, que tende a ser mais demorado. Além
disso, para os bancos, quando uma empresa entra em recuperação precisam
imediatamente provisionar metade da dívida a receber. Para cada real de provisão feita é um real a
menos no lucro.
O tamanho da dívida
da empreiteira é um dos motivos que leva Itaú e Bradesco a negociarem um novo
empréstimo. Além da dívida com os bancos, o grupo deve cerca de US$ 13 bilhões
em títulos no exterior. O advogado de um
grupo de investidores estrangeiros que detém parte desses títulos da Odebrecht
- os chamados bondholders - conta que
alguns de seus clientes estão apreensivos com esse novo empréstimo. Apesar de salvar a operação no curto prazo,
podem eliminar ativos disponíveis em caso de insolvência da empresa daqui a
cinco ou sete anos, quando vencem seus títulos.
A liquidez da
empresa é importante para que seja
finalizada leniência e os negócios melhorem, mas essa é uma esperança há
anos e ainda não está resolvida, segundo o advogado que falou sob condição de
anonimato.
Neste aspecto,
não é nada alentador o parecer dos auditores independentes da BDO sobre o balanço
do grupo, divulgado a 27 de abril. O
prejuízo foi de 80% menor do que o de 2016, mas ainda é elevado. Os auditores
dizem que há incertezas sobre a capacidade de continuidade da companhia.
"A companhia
apresenta prejuízo de R$ 2,9 bilhões, situação que, aliada às necessidades de
capital circulante de algumas de suas controladas diretas e indiretas, gera
incertezas, quanto à capacidade de continuidade operacional".
Os bancos e a empresa
não quiseram comentar."
Nota.
Assinale-se que o artigo transcrito acima é de
autoria de Josette Goulart, e foi publicado pela Folha de S. Paulo, a 21 de
maio de 2018, na página A20. Somente os dois primeiros parágrafos não são de
Josette Goulart . Já o terceiro tem apenas pequenas modificações, para
inserir-se no artigo.
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