terça-feira, 11 de julho de 2017

Vitória em Mossul

                                
        A cidade de Mossul - ou o que dela resta - foi reconquistada, os invasores do ISIS (ou Daesh, como o E.I. é conhecido pelos árabes) expulsos ou mortos, e eis que a imprensa corre para relembrar-nos dos enormes riscos remanescentes.
         Realmente, o Iraque oficial do Primeiro Ministro Haider al-Abadi acorreu às ruinas de Mossul para festejar a vitória sobre o Estado Islâmico, e é bom que assim seja. No entanto, como informado na nota de ontem, muito ainda resta para ser recuperado.
         Tampouco se deve esquecer que, se o exército iraquiano se empenhara duramente para lograr a reconquista de Mossul, em luta que se estendeu de casa em casa, para afinal afastar e eliminar os fanáticos guerreiros do Daesh, esse combate fora secundado por comandos e bombardeios de forças ocidentais, notadamente dos Estados Unidos, sem os quais não estaria hoje decerto terminada a reconquista casa por casa para afastar e/ou liquidar os militantes do E.I.
          No passado, o Iraque constituiu uma construção da engenharia ocidental, na verdade da Grã-Bretanha, através da qual este reino fora formado, e entregue a descendente do Profeta. Assim se assegurava a manutenção da influência britânica. Tudo isso desabou a catorze de julho de 1958, através de golpe militar, de influência nasserista.
          Invadido o palácio real, o jovem rei Feisal é levado a um pátio, junto com o tio Abdul Ilah, havido como eminência parda, e, em seguida, brutalmente metralhados, com os demais familiares.
          O único que escapa, a principio, é o Primeiro Ministro Nuri al-Said. Será descoberto no dia seguinte, ao tentar fugir - vestido de mulher - no intento de escapulir para o estrangeiro, e teria sido morto, e por linchamento, tão logo cai nas mãos da multidão, rotineiramente enfurecida.
          Seria de tal grupo de oficiais que reponta o conhecido Saddam Hussein, que breve se firma no poder, com as consequências  já sabidas.
           Como é também do conhecimento geral, o Iraque - que participara da área de influência do Império Britânico - teve formação artificial, em que haviam sido acopladas regiões de influência sunita e xiita (os curdos não foram então contemplados, como se sabe, com um estado).       
            Não há de surpreender, portanto, que até hoje aquela famosa divisão por dois funcionários de médio escalão dos antigos domínios do Sultão permaneça fator ponderável naquela infeliz região, como de resto magistralmente estudado no livro de David Fromkin[1].
           O Iraque continua com duas grandes comunidades - a sunita e a xiita - e a sua História nos séculos XX e XXI tem muito a ver com esta "participação" do Ocidente, cujos resultados não foram, de resto, melhorados pelas desastrosas intervenções das Grandes Potências da época.        Décadas mais tarde, os neo-conservadores, por desejarem trazer a democracia para o Meio Oriente, convenceram da relevância dessa missão  o seu discípulo George W. Bush, presidente estadunidense e por dois mandatos. A tal senhor caberia, no começo do século XXI, a seu próprio   dissabor, iniciar o processo do declínio (decline) da Superpotência através de uma desastrosa intervenção através da guerra com o Iraque, supostamente para descobrir o paradeiro das celebérrimas armas de destruição em massa (WMD).
         As consequências dessa expedição ao Iraque seriam muitas, a maior parte delas negativas. As perdas para o Erário estadunidense foram hiper-desastrosas (computadas em centenas de bilhões de US$), com o discutido início do chamado processo de declínio, com reflexos no interior americano, muitas comparações à obra do alemão Oswald Spengler [2] que além de causarem as já citadas perdas bilionárias para o Erário estadunidense, até hoje, as tais weapons of mass destruction jamais foram encontradas, não obstante as buscas ingentes por intermédio de expedições das Nações Unidas...     





[1] David Fromkin, A Peace to end all Peace (creating the Modern Middle East - 1914-1922)
[2] Oswald Spengler, Der Untergang des Abendlandes (2 vols.) München, 1923.

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