O ente petrolífero da Venezuela enfrenta
profunda crise que, em realidade, é dupla. De um lado, se tem o sucateamento da
maquinária de produção da estatal, que resulta de anos de negligência e de
corrupção.
Como a Venezuela constitui, na verdade,
uma monocultura, dependendo de forma exclusiva da extração do petróleo para
atender às respectivas necessidades em termos de fundos para as suas
importações, e como nos anos de fartura agiram, sob Chávez, como verdadeiras
cigarras quanto às previsões de fundos para o futuro, não há de surpreender o
sucateamento do material de produção do ouro negro.
A circunstância de dispor de petróleo
de boa qualidade é mais do que compensada
ao revés pela carência de investimentos em material pesado, com a consequente
inelutável diminuição na capacidade de produção, por força do envelhecimento
dos equipamentos básicos.
A monocultura, que determina a
crescente ultra-dependência do ouro negro, terá funcionado a contento - na verdade, a demasiado contento - no tempo das vacas gordas, i.e. quando das
altas cotações do barril de petróleo, e do câmbio favorável. A total falta de
previsão e o munificente emprego dos produtos financeiros do principal produto
de renda do país teve consequências ruinosas. pelo esbanjamento das riquezas da Venezuela (que se ressentiam de uma
só base fiável). O caudillo Chávez entrou em uma política distributiva
internacional, com a venda de petróleo a Cuba, entre outros, a preços
concessivos. Por outro lado, a política internacional de Chávez passou a ser
alimentada com subvenções a diversos países, que integraram uma esfera chavista
de poder (Equador, Nicarágua, Bolívia) com uma entidade internacional que
visava congregar esses países que Chávez se propunha subvencionar com as sobras
da produção petrolífera. Na própria Argentina dos Kirchner, há episódio
bastante indicativo: a mala de dinheiro aí descoberta, e que era um
"regalo" de Hugo Chávez, cuja destinação era
"política". Naquele tempo,
também o Paraguai com o padre Lugo havia entrado na área chavista.
Não surpreende, portanto, que depois da
morte de Chávez, o já inepto governo de Nicolás Maduro tenha sido forçado pela
crise na cotação do petróleo, causada por fatores externos à Venezuela, a
abandonar precipitosamente a "política" concessiva sub Chávez.
Hoje, a Venezuela é um país com a sua
infraestrutura em grande parte destruída por um fator "misterioso"
que é a completa falta de competência e de tino administrativo do regime Maduro.
Nesse sentido, a crise que já vinha do tempo de Chávez só cresceu em tamanho.
Além do aparente total despreparo da liderança de Maduro - um ex-caminhoneiro,
bronco e sem outra 'qualidade' do que a de um gangster de manter a própria quadrilha, seja por recursos pouco
usuais em economias estatais, seja pela 'política' de manter a vela de libra a
alta esfera das Forças Armadas.
Com a deterioração dos termos de
intercâmbio, e a queda na produção, decorrente da falta de insumos e de
reparações ao seu devido tempo, a miséria no campo e na cidade se estende ao
"parque industrial".
Coluna do Estado de S. Paulo assinala
que nas Forças Armadas da Venezuela -133 mil homens e mulheres - cerca de um
terço não concordaria com as medidas radicais do governo chavista. Tais
supostas dissidências têm diversos formatos, e elas não seriam compartilhadas
pelos Altos Mandos Militares. Pelo
menos, é o que assevera o Ministro da Defesa, o general Vladimir Padrino López. Segundo ele,
o alto-oficialato é "disciplinado e
fiel às ordens do chefe supremo". Esse tipo de declaração vale pelo tempo
em que é sustentável.
As preocupações dos vizinhos
sul-americanos são de vária ordem: com a larga fronteira com a Colômbia, é
natural que esta, livre da febre aftosa desde 2009, tenha bem guardada a
extensa linha fronteiriça, no intento de resguardá-la de um desastroso contágio
com a desordem sanitária venezuelana.
Em Brasília, a preocupação do
Ministério das Relações Exteriores é com os 32 mil brasileiros que residem na Venezuela.
Por sua vez, um choque armado interno
teria graves consequências. Desde 2002, data do golpe contra Chávez, começa
processo de esvaziamento da presença da classe média entre a oficialidade. A
consequente popularização traz perda de
qualidade e de capacidade. A aeronáutica tem enormes dificuldades com a
formação de seus pilotos militares. Há muito material militar em termos de
armamentos distribuído por todo o território da Venezuela. Há dúvidas quanto a
eventual utilização desse profuso equipamento, que parece corresponder à tática
do "divide et impera". Dada a penúria que caíu sobre todo o país, a
hiper-inflação (e a consequente desvalorização da poupança e até do
investimento), a carência de insumos que é outra consequência da crise geral na
economia - falta quase tudo nesse país, a partir dos alimentos básicos e dos
medicamentos mais comezinhos.
Qual é a saída proposta por Maduro. Além
de mais do mesmo arrocho, a chamada Nova Constituinte, que não será eleita pelo
critério universal, mas sim por uma escolha do público simpatizante, dos
chamados "coletivos" (grupos para-criminosos que visam a intimidar
pelas armas o povo venezuelano) e dos ditos bastiões do chavismo - como se vê mistura explosiva, um verdadeiro chutaço para a frente, que pensa resolver radicalizando o país. Como?, hão
perguntar. Talvez com o inevitável e inelutável "calote" que marcará,
por um processo regido pela insanável incompetência do regime Maduro e a dura
realidade econômico-financeira, com a consequente entrada da Venezuela para o
rol dos países fracassados.
Teremos então na América do Sul uma
nova Somália, só que vizinha do Caribe, e com larga fronteira verde-amarela. E
como sói acontecer nos estados ditos fracassados, terrorismo e miséria. Será
que a Senadora Gleisi Hoffmann irá visitar essa nova Venezuela?
( Fonte: O Estado de S. Paulo )
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