terça-feira, 11 de outubro de 2016

Qual é o padrão Trump?

                              

        Será cedo para fazer juízos de valor, no que tange à candidatura Trump? Talvez, porque a contribuição do nominee republicano para a qualidade desse pleito ainda é relativamente imprevisível.
        Se é igualmente imprevisível por ora a qualidade da resposta do eleitorado e dos principais atores nessa eleição presidencial, pode-se partir de algumas premissas  para julgamentos futuros.
       Há na história política americana, pelo menos no corrente  século e no anterior, algo que se possa comparar com o padrão Trump?
       Penso que não haveria objeção maior a afirmar-se que não há nada na história política americana nesse nível, seja contemporânea, seja em passado relativamente mediato, que se lhe possa comparar.
       No entanto, se subsistem ainda possíveis dúvidas quanto a divergências nas potenciais consequências do fator Trump, não creio que haveria muita discordância no que tange ao crescente negativismo da contribuição da candidatura Donald Trump para a história política americana.
       Não é só  a maneira e o eventual conteúdo de sua mensagem que podem ter impacto negativo. Talvez ora se possa entender melhor porque Trump tem admiração por Vladimir Putin, e acha possível, e mesmo natural que se estabeleça  relacionamento amistoso entre os dois países, se os Estados Unidos tiver um presidente Trump.
       Nesse contexto, não surpreenderá tampouco que Trump possa visualizar a sua antagonista Hillary na cadeia, se ele vencer a eleição. E, sem embargo, não há nada de mais antiamericano e antidemocrático do que essa ilação. Ela nos ajuda, de resto, a entender porque na Rússia e em outras democracias autoritárias a consequência do candidato eventualmente perdedor  acabar na cadeia não constitui nada fora do normal, dentro desses regimes autocráticos.
         Mas o fator Trump pode ter consequências positivas para a democracia americana. O recente artigo de Elizabeth Drew em The New York Review[1], e de que me ocupei no blog, sobre a influência do gerrymander no sistema político estadunidense, como se vê no domínio do GOP sobre a Câmara de Representantes - em consequência do shellacking de  2010, a que se sucedeu a adequação feita pelas instâncias do Partido Republicano para as eleições bienais seguintes nessa Câmara, como descritas no citado artigo da respeitável politóloga americana - talvez a próxima eleição geral ofereça uma oportunidade ímpar para que o arrendamento da Câmara baixa pelo GOP possa desaparecer, ou então surjam condições para que tal anomalia política seja varrida do mapa.
          A possibilidade é concreta, como atesta o nervosismo do Tea Party e das alas mais à direita do GOP, com a postura do Speaker Ryan da Câmara, de oposição ao nominee dos republicanos, o que é visto com quase pavor pelos deputados mais à direita, que temem uma avalanche democrata em reação à candidatura Trump.
           Deve-se admitir que essa possibilidade representaria uma senhora dádiva do candidato Trump à democracia americana. Estou plenamente consciente de que nada está mais longe de Donald Trump que advogar a possibilidade de que por um autêntico fluke[2] surja a oportunidade de limpar as cavalariças de Augeas, como uma consequência ainda que indesejada pelo candidato do GOP.
            Sabe-se que o gerrymander feito pelo GOP criou condições quase perfeitas para que esse monstrengo antidemocrático venha permanecendo desde 2010/12 na prática.  Só um landslide potencializaria a volta dos democratas à maioria na Câmara de Representantes. No recente segundo debate tivemos a oportunidade de apreciar, uma vez mais, a lucidez do raciocínio da deputada Nancy Pelosi.  Seria um grande prazer vê-la de volta com o gavel[3] de Madam Speaker,  mas o prazer será maior ainda se esta mancha na democracia americana puder ser expungida.
              Porque o que interessa ao eleitor não é que este ou aquele partido ganhe a maioria na Câmara, mas sim que o jogo eleitoral seja honesto e não-trucado, para que este órgão possa refletir não as artimanhas do gerrymander, mas a vontade da Nação.
              Existe, por outro lado, um grande temor nos republicanos que um eventual landslide da candidata democrata Hillary Clinton, devido sobretudo à crise desproporcional na candidatura Donald Trump, possa desequilibrar as representações federais, em especial nas assembléias.
                Não é por acaso que a Constituição americana é a decana das Leis Magnas. A habilidade do constituinte do século XVIII, com as emendas pontuais dos séculos subsequentes, permitiram que esse documento persista válido e atual.
                De certo, os efeitos políticos e sociais da candidatura Trump não se restringem aos referidos acima. Mas de qualquer forma, mesmo o surgimento do candidato imprevisto, de um homo novus pode trazer alguns resultados positivos, ainda que em segmentos parciais, por mais negativo que seja à primeira vista o conjunto do aporte de  Mr Donald Trump às eleições gerais da terça-feira,  oito de novembro de 2016.

( Fontes:  The New York Review, The New York Times )



[1] "American Democracy Betrayed", Elizaabeth Drew, The New York Review of Books, Aug.18-Sept.28.2016.
[2] resultado imprevisível, em geral decorrente da sorte.
[3] martelo  utilizado pelos chairmen de assembléias.

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