Esses simpáticos roedores, que habitam a
tundra ártica, por motivos não precisados, têm o estranho hábito de atravessar
céleres os penhascos e jogar-se para a morte que os espera indiferente há
algumas dezenas de metros abaixo, sob as águas nervosas e gélidas do mar oceano.
O que motivará tão demencial corrida? Até hoje,
que eu saiba, o bicho homem, que pensa saber de tudo, ainda não se pronunciou.
Mas tal insólita disparada continua um
mistério, segundo muitos, naquele acervo de enigmas que dona Ignorância abraça
com fervor, imbuída daquela força que anima àqueles que põem sua fé em
crendices várias e nas falsas soluções para problemas reais.
Pois que me perdoem os ingleses - essa
gente com que a geografia tem sido tão parcial - para essa má imitação da
corrida dos lemingues.
Através dos séculos, as invasões das
Ilhas Britânicas têm sido generosas, em relação aos povos do Continente. Por
isso, a Inglaterra, ao cabo da IIa.
Guerra Mundial, preferira de início não associar-se aos seis países que
encetaram a caminhada para a união européia, a princípio pelo carvão e o aço (Alemanha, França, Bélgica, Holanda, Itália e
Luxemburgo).
De
Gaulle fecharia a porta, nos anos sessenta, ao desejo inglês de associar-se
ao organismo de Bruxelas. Fê-lo em conferência de imprensa, que era o
instrumento por ele preferido para lançar seus propósitos e até mesmo suas
negativas, como foi o caso célebre daquela porta que o velho general batia com
força, aludindo à insularidade da pérfida Álbion.
Não pretendo aqui rememorar as dúvidas
britânicas sobre a sua permanência ou não na C.E. O trabalhista Tony Blair acederia em realizar um
primeiro referendo, em que o povo inglês recusou a saída de Bruxelas.
Infelizmente - para os ingleses - o anterior
Primeiro Ministro David Cameron
julgara oportuno, em jogada parlamentar, considerar a hipótese do referendo
sobre a permanência na U.E, como medida para ganhar tempo, e sempre sob o
pressuposto de que o propósito negativo não
avançaria.
Cameron poderá, no futuro, ser o triste Primeiro
Ministro que lançara o Reino Unido na corrida dos lemingues, ainda que
alegadamente fosse da posição contrária.
Deve-se dizer, de parte de alguém que
segue, ainda que de longe, os movimentos do Reino Unido, é que tal amor de
Cameron pela organização comunitária de Bruxelas, se real, ele o soube
dissimular muito bem.
Dado o resultado do referendo - a que
precedeu o estúpido sacrifício de deputada contrária ao Brexit, pela mão de um
energúmeno - forçoso será reconhecer que só alguém como Cameron ousaria pôr em
risco uma conquista que tanto custara ao partido Conservador. Em verdade, fora
com Ted
Heath, que em 1973, o Reino Unido se tornaria membro da União Europeia
(O general Charles de Gaulle já havia saído de cena, pela barca de Caronte).
Agora a imprensa revela dado
importantíssimo sobre a seriedade (ou melhor, falta de ) com que o estamento dito conservador tratara dos motivos
pró e contra a permanência na organização de Bruxelas.
A irresponsabilidade da liderança dita
conservadora (já prenunciada pela aludida atitude de David Cameron) foi levada
ao cúmulo na postura de Boris Johnson. Este último levou ao ápice
a sua irresponsabilidade - e aqui esse termo para falta de responsabilidade
corresponde igualmente ao cinismo de falta de convicção como demonstrado pelo
ex-prefeito de Londres, Boris Johnson.
Com
efeito, o atual Ministro das Relações Exteriores britânico, Boris Johnson, escreveu um artigo defendendo a permanência
do Reino Unido na União Européia. Isto foi feito dois dias antes de apoiar
publica e fervorosamente o Brexit.
Supostamente, Johnson havia escrito
uma matéria a favor e outra contra a
saída do Reino Unido. Uma vez escritos os dois artigos, ele optaria pelo Brexit.
Na verdade, quem fizera campanha com
maior veemência para abandonar a U.E. não é ficara em dúvida até o último instante sobre
que lado apoiar ?
Dessarte, no artigo contra a saída
, Johnson adverte sobre o abalo econômico após o Brexit e sobre o risco que a iniciativa
representa para a própria unidade territorial do país. Boris Johnson também afirma que os aportes financeiros do Reino
Unido à União Européia são o preço mínimo diante do acesso proporcionado ao
mercado único. E a falta de seriedade de Boris
Johnson é ressaltada pela hodierna
descrição desse mercado por Johnson "como
crescentemente inútil".
A forma engajada com que a Primeira Ministra Theresa May pretende
levar as negociações com Bruxelas está refletida na inserção no grupo dos mais
enfáticos eurocéticos do seu Gabinete.
Chega-se mesmo a especular que a
novel Primeira Ministra busque um rompimento total com a União Européia. Será
que as peregrinações do passado, e dos esforços dos tories de ingressar na Comunidade Europeia, serão jogados às
baratas?
Nesse radicalizado comitê - de
que participa Johnson - as instruções seriam de "supervisionar as
negociações de saída do país da UE e formação de nova relação entre o U.K. e a
UE, assim como estabelecer a política britânica para o comércio
internacional".
Esse grupo - que parece imbuído
da certeza de poder impor condições, quando tal não passa de doce ilusão -
conta com todos aqueles seis membros
que fizeram campanha pelo Brexit: assim, além do chanceler Johnson,
o ministro do Comércio Internacional, Liam Fox; o Ministro do Brexit, David Davis; o Ministro
do Desenvolvimento Internacional, Priti Patel; o Ministro dos Transportes, Chris
Grayling; e Andrea Leadson, Ministra do Meio Ambiente.
Tal aparente radicalismo do
grupo central do gabinete May tende a reforçar as suspicácias e temores de
empresas e investidores de que o governo britânico esteja planejando uma
ruptura brusca, na qual priorizará os controles de imigração em detrimento do
acesso livre a bens e serviços do mercado único da União Européia.
Bancos internacionais
advertiram que terão de deslocar parte de suas operações e equipes de Londres
para outras cidades da União Européia, caso a Primeira Ministra May não consiga
garantir acordo que permita aos bancos continuar provendo serviços nos 27
países-membros da U.E..
As incertezas quanto às
futuras relações com a U.E. contribuíram para a desvalorização da libra-esterlina
para o seu menor patamar em três décadas frente ao dólar americano.
Nota. Se o gabinete May for dominado pelos
radicais, as perspectivas não são boas para os investidores ingleses e o status de Londres como grande centro econômico-financeiro.
Se eles pensam que, com o pouco cacife de que dispõem, podem impor condições à
U.E. sobre o status de Londres, o erro de avaliação tenderá a ser grande, eis que ninguém cede favores a troca de nada. Esquecem esses senhores porventura que
Londres cresceu como centro econômico-financeiro, porque dispunha da U.E. para
respaldá-la ?
Agora os radicais do
gabinete Theresa May imaginam que podem pôr e dispor, quando a realidade
financeira de Londres como centro viável carece de ser reforçada por um mínimo
de união e funcionalidade. Ninguem
retorna favores a pontapés.
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