Em um de seus filmes sobre a tragédia
das matanças estudantis nos Estados Unidos, intitulado Bowling for Columbine, Michael Moore, com a sua carteirinha de
membro da associação vai visitar Charlton
Heston, que era o diretor de pessoa jurídica que é a defensora do
armamentismo americano sabe-se lá contra quem.
A cena, na verdade, é tragicômica
porque a tal associação tem apoio garantido no Congresso americano, que teme o lobby das armas e a própria cínica
defesa de uma das primeiras emendas da Constituição estadunidense, dos tempos
primevos em que os cidadãos da jovem república das Américas se armavam para
defender-se contra os selvagens indígenas, que buscavam, cruéis, defender as
próprias terras.
Ao ver na tv ontem, e hoje nos
jornais, dir-se-ía que voltamos a imitar os States,
com os velhos rancores de antigos alunos que retornam à escola para ajustar
macabras contas, sabe-se lá porquê, como acaba de suceder em Suzano, na grande
São Paulo, em que uma dupla de ex-alunos invadiu a escola para liquidar
estudantes e funcionários do colégio, culpados que seriam de uma vivência
comum, povoada de rancor e ressentimentos.
Que velhas, intratáveis raivas a
dupla queria exorcizar, matando a torto e a direito? Pois um adulto e um
adolescente assassinaram pelo menos sete pessoas - cinco estudantes e duas funcionárias, além
de ferir mais onze em ataque contra a escola estadual Professor Raul Brasil, na manhã de ontem, treze de março.
Com a chegada da polícia, a
terrível reinação acaba como sóem findar tais reinações - o adulto, Luis
Henrique de Castro, com vinte e cinco anos, mata o adolescente Guilherme Monteiro,de dezessete
anos, e, em seguida, se suicida.
Na macabra preparação do massacre - que
semelha cópia-xerox de desatinos que se tinha a impressão só pudessem ocorrer
nos Estados Unidos da América - deparamos um ritual se desenrolar: a doentia
maquinação de uma eliminação coletiva de
pessoas que terão para os autores-vítima, decerto cargas pesadas, que despertam
rancores que, pelo visto, só podem ser lavados em sangue. Que fundas mágoas são
essas que estão na raiz dessas raivas incontidas e selvagens, encenadas em
ambiente em geral confundidos com doces, irrelevantes memórias infanto-juvenis?
Que fundos ressentimentos
levaram tais assassinos a chegar ao requinte de eliminar também bedéis e,
porventura, os mestre-escola, como se até essas anônimas criaturas contaminassem pela respectiva presença
- e quem sabe até conivência - as ofensas e os delitos que os ex-alunos anseiam
agora lavar com o profundo desespero dos rancores da adolescente violência e o sangue dos massacres, que
carregarão para o dantesco inferno as
maldições de tempos que outros, com a sua deformada memória, carimbam de
próprios para jogar na vala comum de recordações sem outra estória do que
aquela por que passa o rio do Letes?
(
Fontes: Folha de S. Paulo; Inferno, da Commedia de Dante Alighieri , AMB)
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