Não
é de hoje que a República Popular da China tem no seu flanco sul, na área
voltada para oeste o que remonta a uma de suas conquistas sobre a enorme extensão
no seu flanco oriental. Aí está localizada a região de Xinjiang, em que os
habitantes são de maioria uighur, e de credo islâmico.
Mesmo antes que Xi Jinping, na
prática, modificasse a constituição chinesa[1],
essa larga área no oeste vem representando um desafio para os intentos de
asserção da soberania de Beijing na região. E a principal motivação para que
tal repto se verifique é facilmente deter-minável. Sendo a mais forte, a China
- e tal constitui uma longa e deplorável tradição - só vê obstáculo para a
consecução dessa 'política' em uma
estrutura de resistência estatal com condições de criar dificuldades maiores
para o alargamento do imperialismo de Beijing.
Se a área a ser "absorvida" não reúna elementos que tornem em extremo difícultoso ou de perspectivas
bastante precárias o intento de alargar o sino-imperialismo, o caráter suzerano
do poder central não deixará de ser implementado .
Dessarte, o chamado 'problema uighur', para Beijing exprimiria apenas uma dificuldade
material, sem qualquer conotação de resquício de respeito ao eventual direito à soberania por uma etnia que, na
verdade, para o mandarim chinês não reuniria condições de pleitear tais garantias do direito público ocidental.
Nestes termos, a província de
Xinjiang, em fases anteriores da dominação - quando o chamado método de controle
era mais brando - constituía um local para que quadros promissores da classe
dirigente chinesa eram regularmente enviados, como local de aprendizado e
também de demonstração na prática que reuniam condições para enfrentarem os
desafios que sóem confrontar aos
funcionários mais dotados de um sistema de governo colonial, representando, mutatis mutandis, uma escala hierárquica
de dificuldade pela qual deveriam transitar, para evidenciar a própria
capacidade de lidar com desafios maiores nos encargos futuros.
Na realidade, o que está
acontecendo com a chamada província de
Xinjiang é, na prática, um enorme endurecimento da 'resposta' da
hierarquia burocrática chinesa ao desafio representa-do pela reação do povo
uighur no que tange ao sistemático desígnio de Beijing de tratar de forma colonial esse desafio - em linguagem toynbeeana -
representado pelo povo uighur que tanto
racial, quanto religiosamente, se recusa a ser absorvido pela RPC.
No caso, o tratamento aplicado por
Beijing configura a forma brutal do imperialismo chinês, pois
não só Xi, mas vários outros gerarcas chineses, julgaram factível o
recurso a métodos. Talvez a única
diferença, esteja na graduação crescente desse método opressivo, e que desrespeita o povo uighur.
Pois, além de ser inadmissível
determinar a uma etnia uma cartilha nacional, o quadro fica ainda mais absurdo
pela implementação de sistema - apoiado em campos de concentração !- e, que são
mais do que simplesmente reminiscentes dos métodos stalinianos descritos por Alexandr
Solzhenitsyn no seu famoso livro Arquipélago Gulag.
O autoritarismo chinês, exercido não só por Xi Jinping, mas também por seus
antecessores, foi portanto sendo implementado em um crescendo, que se "explica" pela incapacidade do mais
forte no caso de forçar o mais fraco a 'obedecer' às regras com que pretende não só modificar a
sua postura tanto política, quanto religiosa,
o que só pode ser interpretado como se a crença religiosa possa vir a ser
entendida também como uma atitude de
conveniência ideológica, o que, na verdade, implicaria em rebaixá-la para uma
postura perigosamente relativizada, a que nem mesmo um ateu convicto acreditaria
fosse possível implementar.
De qualquer forma, torna-se
mais fácil de entender que esse método de desilamização hoje implementado nesse espécie de "campo de ateismo forçado", aplicado por preleções, como se se tratasse do
desaprendizado de uma outra formação política, na verdade é um método demasiado
rudimentar ideologicamente falando se se pretende afastar uma comunidade de uma crença com a
conhecida e atávica fé do Islã... E por
isso não espantar decerto quais sejam os "resultados" dessa
desislamização forçada, que estaria
necessariamente votada aos mesmos resultados
negativos de que outros métodos - suasórios ou não - anteriores, aplicados pelo
poder imperial chinês.
E tampouco há de surpreender
que esses mesmos uighures possam tornar-se
elementos 'subversivos' dentro de uma sociedade que, além de querer convencê-los à
força, não admite que professem outro
credo, senão o ateísmo do regime comunista chinês.
(Fontes:
A Study of History, A. Toynbee; A. Solzhenitsyn, Arquipélago Gulag)
[1]
Obviamente, esta é uma liberdade verbal do
articulista. Não se trata de nenhuma Carta Magna, mas da brutal asserção da soberania
chinesa sobre a citada região, em termos similares ao que antes ocorrera com o
Tibete que, por ser mais antigo e mais conhecido, tem mais condições de ter a
simpatia ocidental quanto à fruição de liberdade que é negada ao Dalai Lama, líder religioso
tibetano, pelas mesmas razões que intentam
"justificar" a injustificável suzerania de Beijing.
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