sábado, 24 de março de 2018

Trump e o Pandemônio


                         

        A palavra encerra um quê de exagero e despropósito. Em tais condições, seu emprego pareceria afastado, pela própria circunstância de tratar-se do governante estadunidense.

         No entanto, já entrados no seu segundo ano de mandato, se nos detivermos para a análise dos procedimentos da Administração Trump, forçoso será considerar a ambiência que o caracteriza, a própria circunstância de que Donald Trump tem no pescoço o exame pelo Conselheiro Especial Robert Mueller III das diversas irregularidades que marcam a entrada em funções de seu governo, imperioso será reconhecer que a característica dominante dessa presidência é, por assim dizer, a mudança pela mudança.
         A sua pretensa reforma do comércio internacional, precedida pela inquietante declaração de Trump de que as guerras comerciais são boas e costumam ser rápidas, conduziu a rápido exame dos passados conflitos desse gênero, o que demonstrou que tais guerras não costumam ser breves, nem trazerem bons resultados para os países respectivos, como exame abrangente das conflagrações tarifárias realizadas no passado pelos Estados Unidos conclui que nenhum delas terminou com os contornos otimístas que presidiram ao início das 'hostilidades'.
          No entanto, sucedeu-se em breve espaço de tempo mais uma modificação no formato dessa suposta guerra comercial.  Conforme já transmitido, a tal guerra não seria tão ruim, pela circunstância de que Brasil e outros países e organizações (como a União Européia) continuariam a poder exportar o aço nas mesmas condições anteriores, enquanto a artilharia se voltaria contra a China. Tudo isso já foi referido pelo blog.
          Mas as coisas com o Presidente Trump não costumam ser tranquilas, e, por isso,  tampouco  este caso discrepa da regra. E nada é como parece a princípio, consoante a regra pirandelliana.  Como é óbvio, o que motiva o presidente americano nada tem a ver com o célebre dramaturgo italiano, mas sim com o próprio caráter truculento. As consequências desse tipo de comportamento pela sua violência e caráter imprevisível não nos ajudam muito em prever-lhes o resultado.

          Há termo em português que ajudaria a melhor compreender o mecanismo do comportamento do presidente americano. Sem embargo, pode ser considerado, ainda nos liberais tempos da atualidade, como demasiado vulgar, baixo mesmo e, portanto, seguirei sem torná-lo explícito, embora ouse contar com a colaboração do leitor em captar o sentido básico  de tal comportamento.

          Como assinala o editorial de O Estado de S. Paulo, a segunda etapa da situação  desta incipiente guerra comercial se caracteriza por duas ações simultâneas: (a) concentração da 'artilharia' na China, escolhida como o grande inimigo; e (b) isentar das barreiras, mas só temporariamente, alguns parceiros - Brasil, Argentina, União Européia, Austrália e Coréia do Sul  (o México e o Canadá já foram isentos, desde que cooperem com a Zona de Livre Comércio da América do Norte).
            Incongruamente, a primeira reação quanto a suposta mudança do regime Trump reflete efeito natural do comportamento humano, que sempre tende a esperar bom senso da outra parte. No entanto, a suspensão provisória das barreiras não é, como se pensou a princípio, um sinal de bom senso do Regime Trump.
             Eis que, na verdade, a suspensão provisória das barreiras aduaneiras, longe de ser um benefício, é condicionada ao início de negociações. Como assinala o editorial do Estadão: é uma proposta de início de conversas e de tratativas feita com a arma apontada para o interlocutor.

            Trump, na verdade, é um arcaismo vivo. Como governante, o seu comportamento se  molda bastante naquele do fanfarrão de algum  bairro. Dadas as lacunas - numerosas - na respectiva cultura, ele costuma partir de presunções sem base na realidade, ou de premissas toscas, sem maior fundamento. A começar, se estudasse ou mandasse estudar, iria verificar que as guerras tarifárias e comerciais, em geral encetadas em séculos passados, com grande otimismo, terminaram sob o signo do malogro. Além disso, o aspecto mais negativo desse tipo de atitude, é que o comércio internacional é um composto complexo que depende de múltiplos fatores, e são muito raras as situações em que uma parte, por mais forte economicamente que seja, detenha um controle a tal ponto preponderante que os resultados tenderão a ser-lhe amplamente favoráveis. Em geral, essas visões tipo estória da carochinha inexistem na realidade. Aliás, para os novatos neste campo, basta leitura um pouco mais intensa para determinar que, nas guerras comerciais, os prejuízos são muitos e generalizados, e como o passado está aí para demonstrá-lo, ambos os lados saem perdendo.
               Como a história - as guerras comerciais dos séculos XIX e princípios de XX - está aí para demonstrá-lo, tais conflitos sóem começar com muita fanfarra e otimismo, para depois surpreender-lhes queda geral no montante das transações comerciais e o consequente prejuízo (e até mesmo descalabro) para ambas as Partes.

( Fontes:  O  Estado de S. Paulo, The New York Times, Luigi Pirandello )               

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