A imprensa do Rio e São Paulo ao falar
do favoritismo do candidato oficial do estamento russo - Vladimir Putin - devo confessar que me senti próximo daquele
personagem de Henfil - gastão, o
vomitador - chegou a dizer que ainda levaria alguns anos para igualar o
recorde de outro presidente russo - ou que hoje é computado como se fora - que
seria Jozef Stalin, que ainda teria uns tantos anos de governança à frente
desse Putin...
Pensando bem, até que a comparação me
parece apropriada. Porque Putin tampouco
costuma pensar muito, como esse outro dito antecessor dele, em dar destinação
política aos seus adversários... Ora, achar que Stalin e os demais da lista
soviética seriam comparáveis aos presidentes da atualidade parece-me ir um
pouco longe demais nas comparações. É notório que quando Jozef Stalin convocava
para audiência algum figurão do partido, este ía suando frio, porque não se
sabia nunca como ela acabaria, ou com a morte do infeliz, ou com a inéfavel sensação
de que escapara dessa feita do
carniceiro... Por isso, chamar isso de chefe de estado me parece exagerar um
pouco.
Os adversários de Putin nesta eleição
estavam ali para fazer número. Quando surgira adversário da têmpera e sobretudo
das qualidades carismáticas de Alexei
Navalny, Putin resolveu o desafio político com uma solução metapolítica. Para outros desafiantes no passado, gospodin
Putin terá encontrado maneiras especiais de resolver a ameaça política. Para
Navalny, um político que pela sua coragem pessoal e pela própria capacidade
representaria um difícil desafio para o atual presidente, Putin optou pela saída burocrático-judiciária, que é hoje
caracteristica da atualidade russa. Pelas suas qualidades e pela própria
coragem, Navalny conquistou e motivou a juventude e grandes faixas do povo
russo, através de sua honestidade e do
desafio que significou para as alianças de Putin. Crescendo a própria popularidade, Putin
recorreu a uma solução administrativa, para tanto mandando inventar
em localidade interiorana um suposto desfalque que Navalny teria praticado.
O primeiro processo contra Navalny estava
eivado de erros, a ponto que o desafiante logrou sentença favorável da Corte Européia de
Direitos Humanos. Mas a máquina de Putin cuidou de fazer nova investida, que,
infelizmente, teve êxito. Como a justiça na Federação Russa é muita vez uma
criatura do Kremlin, não houve desta
feita outros erros que inviabilizassem a "solução" para o afastamento
da eleição de um candidato com as potencialidades de Navalny.
Não é de hoje, por certo, que a
Rússia tenha essa tradição de subserviência ao poder do Kremlin. Infelizmente, a despeito dos esforços do movimento
pró-Navalny o que temos pela frente são mais anos de regime corrupto e
violento, que de resto não trepida em afastar através de "soluções
políticas" uma série de personalidades de grande valor e, sobretudo, de
muita coragem, como a notável jornalista Anna Politkovskaya, assassinada em
2006 muito provavelmente por um contract-killer[1]
no saguâo do modesto prédio em que morava. As suas reportagens tinham
incomodado muita gente poderosa, como o próprio Putin, as lideranças corruptas
na Tchetchênia e por aí afora. Até hoje oficialmente não se sabe quem a
eliminou, no lusco-fusco de curto dia típico da capital russa.
Os leitores deste blog já bem conhecem duas mulheres escritoras que se dedicam à
análise e ao estudo desta personalidade decerto motivante, mas também temível,
que é o atual presidente de todas as Rússias, Vladimir V. Putin. Reporto-me à
russo-americana Masha Gessen (que
tratou da ascensão política de Putin, em São Petersburgo) e a também americana,
a professora universitária Karen Dawisha, que trata mormente da trajetória de Putin
como governante, sob o título "A cleptocracia de Putin". Recomendo
esses livros - ambos em inglês - pela seriedade das respectivas autoras, a par
da própria inegável coragem.
(Fontes:
O Globo, O Estado de S. Paulo)
[1]
O contract killer (o matador
contratual) é o método preferido pelas autoridades russas que se acreditem
ameaçadas pela verdade ou até mesmo pela
popularidade de um adversário político, ou como no caso da Politovskaya, a
própria integridade e firmeza na defesa seja de um povo (os tchetchenos), seja
na capacidade de revelar segredos incômodos, que desvendem 'falsas soluções', negociatas, ou mesmo os
direitos humanos de população muçulmana inserida na Federação Russa.
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