terça-feira, 3 de agosto de 2010

Obama e o Partido Democrata

Já no segundo ano adiantado do mandato presidencial, parecem longe os dias em que seus correligionários democratas desejavam-lhe a presença nos respectivos distritos eleitorais, para fruirem dos chamados coattails [1] da popularidade do Presidente Barack Obama.
Na atualidade, é bem diversa a situação. Conquanto Obama tenha feito aprovar legislação importante, como a da reforma do sistema de saúde, a dos estímulos para a economia, e a reforma de Wall Street, tais grandes êxitos alcançados em conjunto com a maioria democrata no Congresso[2] paradoxalmente não se afiguram bastantes para conferir ao presidente as benesses da aprovação da opinião pública.
Com efeito, depois do esfuziante início, em que os índices de Obama refletiram as esperanças dos eleitores nos ventos de mudança levantados pela exitosa campanha que de início, na temporada das primárias, afastaram a rival democrata Hillary Clinton e, já na fase decisiva, o postulante republicano John McCain, o 44º presidente não conseguiu emular, no meses iniciais da própria Administração, os impressionantes cem dias de Franklin Roosevelt.
Há de convir-se que o cotejo com tal modelo, tal a magnitude das realizações primevas do New Deal de Roosevelt, não era prova de somenos, eis que, desde a longínqua década dos anos trinta do século passado, nenhum outro presidente conseguiu aproximar-se das sobejas demonstrações de capacidade e liderança política daquele líder democrata que se elegeria para quatro mandatos seguidos, reformando o cenário político americano por mais de uma geração.
Mas voltemos à realidade presente. Os presidentes em cujo governo a economia se ache em crise – e o fato de Bush senior ter sido presidente por um único mandato reflete a insatisfação da opinião pública e a mensagem mais convincente de seu adversário Bill Clinton – sofrem em consequência, com a queda de sua popularidade. O povo americano costuma responsabilizar seu líder pela má situação econômico-financeira e, em especial, pela permanência do desemprego em níveis muito acima dos aceitáveis.
Também nesse particular Roosevelt não serve como referência. Eleito para substituir o republicano Herbert Hoover – cujo governo falhou abismalmente no combate à grande depressão -, a despeito de que a situação econômica permaneceria ainda difícil por tempo considerável, era manifesto o empenho de FDR em vencer a crise. Por isso, seja pela nova filosofia do New Deal, seja pelas múltiplas frentes de trabalho criadas para retirar da miséria milhares de operários, seja enfim pela sua notória disposição e carisma, a grande massa do eleitorado não podia inculpar Roosevelt de um estado de coisas que não fora de sua lavra, nem ocorrera sob a respectiva administração.
Se Obama strictu sensu poderia valer-se de tais argumentos – afinal a grande crise financeira internacional irrompeu na administração Bush júnior, com a falência do banco de investimentos Lehman Brothers, em setembro de 2008, resultado da farra das hipotecas subprime e da irresponsável desregulamentação dos instrumentos de controle das atividades bancárias e similares, situação que contara com as bênçãos do Presidente do Fed[3], Alan Greenspan – a continuação da estagnação da economia, os altos índices de desemprego, e a nuvem da recessão econômica transmitem ao homem da rua americano a imagem desfavorável da incerteza e do pessimismo, que ele muita vez tende a associar com o governante de turno, como se responsável fora por tal estado de coisas.
Outro problema é o grande derrame de petróleo no Golfo do México, de que a empresa inglesa B.P. é a notória responsável. Não obstante o empenho de Barack Obama e as suas inúmeras visitas à vasta região afetada – e, portanto, nada de comparável à abúlica reação inicial de Bush júnior diante do furacão Katrina, que assolou New Orleans e o vasto entorno – o desastre ecológico, a continuação da poluição (já considerada como o maior desastre ambiental dos Estados Unidos), a suposta falta de empatia do presidente, tudo isso contribui para de forma perversa corresponsabilizar o governo e o próprio presidente pelos consideráveis estragos que a ganância da B.P., e a sua falta de atenção aos sinais de iminente catástrofe causaram.
Por ora, é difícil prever por quanto tempo hão de perdurar os consideráveis danos causados à região, à fauna e às espécies marinhas, assim como às diversas culturas pesqueiras, com inarredáveis consequências para as atividades econômicas e turísticas das áreas afetadas.
Já se aproximam as eleições intermediárias, para a renovação total da Câmara de Representantes, e de um terço do Senado, além de pleitos para muitos governos estaduais. Como os índices de aprovação do Presidente estão abaixo da marca dos cinquenta por cento, compreende-se que muitos dos representantes – e senadores – democratas não estejam demasiado ansiosos em ter nas suas circunscrições a visita antes requestada de Barack Obama.
O presidente está consciente desse novo cenário. Nesse sentido, tem promovido almoços na Casa Branca em que são convidados deputados e senadores para externar-lhes que tudo fará para ajudá-los e apoiá-lo s nos comícios de novembro próximo, mesmo que para tanto se veja constrangido a auxiliá-los... de longe.
A Casa Branca, através do Chefe de Gabinete Rahm Emanuel e dos assistentes senior de Obama como David Axelrod, tem participado de reuniões com congressistas no Capitólio, para discutir estratégia e a mensagem do partido. A atitude da presidência difere bastante do relativo afastamento que terá sido uma das causas da inesperada derrota de Martha Conkley em Massachusetts. A postura agora é de atento acompanhamento das diversas situações, de modo a evitar que a eventual desvantagem democrata se torne irreversível.
Por isso, Obama planeja realizar banquetes para coletar fundos para o partido, e pretende viajar pelos Estados Unidos. A ênfase seria em defender as bancadas democratas no Senado e na Câmara, de modo a tentar evitar perdas ruinosas para os republicanos, e até serem colocados em minoria em uma ou nas duas Casas do Congresso.
Em um ambiente como o presente, em que a postura republicana está longe de pender para qualquer tipo de atmosfera que de longe se assemelhe a conducente ao diálogo, um tropeço dessa magnitude poderia ser fatal para a administração Obama. Com as suas mãos atadas no Congresso, tendo que tratar com maiorias republicanas ultra-conservadoras, as possibilidades de reeleição do 44º presidente diminuiriam de forma dramática.
Nos Estados Unidos, os presidentes de um só mandato constituem a exceção, mas são em geral marcados pelas tintas do fracasso político. No século XX, tivemos o republicano Herbert Hoover (1929-1933), ceifado pela Grande Depressão; o democrata Jimmy Carter (1977-1981), considerado pouco enérgico; e o republicano George Bush Senior (1989-1993), abatido pela recessão.
Ao contrário do ano passado, em que os índices de aceitação davam grande vantagem a Barack Obama, a próxima eleição intermediária poderá ser um sinalizador importante no que concerne à potencialidade da presente Administração democrata de vencer o desafio de 2012. Por enquanto, os sinais são ambíguos.

(Fonte: International Herald Tribune)
[1] (fig.) ajuda
[2] somente na reforma financeira o projeto democrata teve três solitários votos de senadores republicanos. As demais leis foram aprovadas exclusivamente pela majoritária bancada democrata.
[3] abreviatura do Federal Reserve, banco central estadunidense.

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