Não como raio em céu límpido fulmina o meio político a última pesquisa do Datafolha. Divulgados ontem, os dados enegrecem ainda mais o horizonte do candidato José Serra, do PSDB. A candidata Dilma Rousseff – alcunhada a ‘mulher do Lula’ por eleitores nordestinos de baixa renda – não só incrementa o seu percentual geral, passando a 49%, mas também vence nas quatro regiões do Brasil, com o requinte de superar o ex-governador Serra em São Paulo e também no Rio Grande do Sul.
Por sua vez, José Serra continua a regredir. Dista agora vinte pontos percentuais da candidata do PT. A sua comprida liderança nas pesquisas, que persistiu até maio p.p., com totais na casa dos quarenta, teria sido apenas fruto do maior conhecimento relativo, despojada de maior consistência política ?
Completa o quadro a candidata do Partido Verde, e a sua curva de intenções de voto na verdade persiste como reta na monotonia dos nove por cento.
Há geral desconcerto e constrangimento no campo tucano. Depois do golpe vibrado por Aécio Neves, contrariando a todo o alto tucanato – a começar pelo ex-presidente Fernando Henrique – enjeitando formar a chapa dita puro-sangue com o companheiro Serra, a campanha do governador de São Paulo - que timbrou em respeitar todos os prazos para o lançamento efetivo – entrou em banho-maria.
A própria escolha do vice – não caracterizada por excessivo ímpeto dos medalhões da aliança PSDB-DEM – representou outro momento que tampouco acrescentou gás ou dinamismo à candidatura oposicionista.
Confrontado com a reversão de tendência, pelas sinalizações de diversas pesquisas, a opinião pública não assistiu a qualquer intento de monta que buscasse, seja o reagrupamento das forças partidárias supostamente comprometidas com a sua candidatura, seja um esforço marcado que revelasse disposição clara e oposicionista ao presente situacionismo.
Ao invés, o que se viu foi uma espécie de anti-reação, em que se chegou a reivindicar uma proximidade com o Presidente Lula, além de súbito avatar do ex-governador Serra como o candidato ‘Zé’, o que só poderia gerar confusão e certo mal-estar, menos pelo personagem do que pela natureza errática da sua campanha.
Quando as hostes inimigas em toda parte encontram fronts que se esfacelam, o próprio campo tende a ser convulsionado ou pelo desejo de fuga, ou pelos gerais reclamos, em que a ‘culpa’ será sempre a do outro.
A crise da candidatura José Serra tem muitas causas decerto, a partir da falta de ânimo, coragem ou personalidade do PSDB de fazer oposição ao petismo oficialista. A mediocridade tucana – e a decadência do DEM, que definha a olhos vistos – não terá sido motor de alta octanagem, que instile em todos os seus níveis, dos chefes aos soldados rasos, confiança e denodo que possam configurar uma exitosa empresa.
A altíssima popularidade do Presidente Lula – que beira os inacreditáveis 80% de aprovação , mantendo-se em tal imponente patamar já nos meses derradeiros dos oitos anos de um duplo mandato – há de intimidar os aspirantes a Davi, diante desse portentoso Golias. Constitui, sem dúvida, um enigma que pode devorar a aventureiros mais afoitos, eventuais tentativas de bater de frente contra essa constante arrimada em um sem número de pesquisas.
No entanto, a timidez e a irresolução são más conselheiras defronte de tal desafio. Se ambiciona empolgar o magno prêmio, o candidato oposicionista tem de transmitir à opinião pública clara, inequívoca certeza quanto aos motivos pelos quais se propõe suceder ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Tudo acontece como se o ex-Governador José Serra não lograsse dissociar a criatura do criador. Tampouco tem conseguido passar ao eleitorado a convicção de que não questiona as virtudes e os feitos do antecessor, e que se julgue com melhores condições, tanto pessoais, quanto políticas, de levar ele e não Dilma adiante a obra encetada.
Para imantar uma grande coligação – e não conglomerado de confusos e contrafeitos aliados – José Serra terá de convencer a si próprio que a sua candidatura é viável. Não é através de comportamento quase autista, que parece comprazer-se no marasmo, que o candidato poderá transmitir imagem coerente. A condição sine qua non de convencer a outrem está no simples passo da auto-persuasão de que a façanha é possível. Como pode pretender mover multidões se não irradia vontade inabalável e se se deixa aureolar pela tácita admissão do fracasso ?
Em tempos de crise, este vocábulo de semântica tão rica que nos legaram os antigos Helenos, mais do que repontam, proliferam rumores e suspicácias de toda ordem. Diante da irresolução do comandante, as falanges se mostram inquietas. Correm boatos de generalizada cristianização do candidato, o que a meu ver mais reflete a perplexidade gerada pela ausência de uma atitude mais pró-ativa de Serra, do que a abjeta traição dos correligionários, eis que só contribuiria para tornar-lhes a derrota ainda mais abrangente e irreversível.
Nesta hora e vez dramáticas, estaria acaso tudo perdido para o campo de Serra e dos tucanos ? O bom senso há de dizer que faltam ainda demasiadas semanas, para que das escaramuças das pesquisas se estabeleça a certeza de um resultado, com a imutabilidade que, para muitos, se desenha na frieza dos cômputos dos institutos de opinião.
O silêncio prudente dos dirigentes petistas é o reconhecimento tácito de verdade quase corriqueira, mas que sob tantos golpes pode ser esquecida. Pois os gélidos números de um sucesso virtual refletem realidades momentâneas, suscetíveis, como nas previsões meteorológicas de antanho, a instabilidades imprevisíveis.
O Partido dos Trabalhadores evidenciara no passado ânsia auto-destrutiva, que já lhe fez males imprevistos e desnecessários. Como o ídolo, uma espécie de Baal, sofrem de irrefreado desejo de consumir informações para a produção de dossiers. Paira ora no horizonte um novo escândalo em perspectiva, qual seja a progressão da devassa de dados fiscais, de parte de analistas da Receita Federal, que veio primeiro à baila direcionada a Eduardo Jorge, em seguida a mais três aliados de Serra, e mais tarde a relação que abrangeria cento e quarenta vítimas.
A Justiça já principia a enfronhar-se do caso. Por enquanto, ainda não a Polícia Federal.
( Fontes: Folha de S. Paulo e O Globo )
sexta-feira, 27 de agosto de 2010
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