A balança comercial brasileira continuou no presente governo Lula a crescer. No entanto, há duas características preocupantes: ênfase na exportação de commodities e decréscimo relativo na venda de manufaturados. Nada contra a expansão das exportações nas chamadas commodities (matérias primas). Não obstante, o incremento nesses ítens (café, soja, açúcar, petróleo, minério de ferro) não deve realizar-se em detrimento de manufaturas, e, em especial, daqueles produtos com intensidade tecnológica e de mão de obra qualificada média ou alta.
Malgrado o relativo bom desempenho da economia brasileira e do aumento de seu comércio exterior, continuamos – e com boas razões – a sermos taxados como um precípuo grande exportador de commodities. Ora, especializar-se em matérias primas é uma marca colonial, de economia pouco desenvolvida tecnologicamente.
Por que é importante exportar produtos manufaturados e, em especial, os de maior quociente de alta tecnologia agregada ? Pela simples razão que se estará exportando produtos mais caros, com cotações mais estáveis. O preço mais alto não é decerto consequência aleatória de causas especulativas – como o foi, v.g., a recente alça da commodity petróleo no mercado internacional – mas sim resultado dos valores embutidos de trabalho especializado e de conhecimento tecnológico (o que, obviamente, implica também na adição de outro tipo de trabalho).
Por sua vez, o mercado de produtos de base (commodities), além de sua maior instabilidade de preço, tende a cotações mais baixas em relação aos bens com média e alta intensidade tecnológica. Pela circunstância de não agregarem trabalho qualificado, nem tecnologia, a sua eventual maior rentabilidade exigirá volumes bastante maiores.
As quatro categorias de produtos manufaturados tiveram o seu pior desempenho desde 1997, início da série histórica do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. De um lado, as duas categorias que ainda registram superavit (embora encolhido) são as mais intensivas em mão de obra pouco qualificada, i.e., (a) setor intensivo em mão de obra e baseado em recursos naturais e (b) setor de baixa intensidade de mão de obra qualificada e de tecnologia. Por outro lado, as duas outras categorias tiveram deficits mais acentuados: (c) setor de intensidade média de mão de obra qualificada e de tecnologia; e (d) setor de alta intensidade de mão de obra qualificada e de tecnologia. Com efeito, enquanto os saldos positivos nesse primeiro semestre de 2010 foram de US$ 600 milhões nos setores (a) e (b), o déficit no setor (c) foi de US$ 10,8 bilhões e no (d), de US$ 16,8 bilhões.
A que se deve atribuir essa tendência negativa em nossa balança comercial ? Há dois fatores, entre outros, a serem assinalados: a apreciação do real e a desindustrialização do país.
Não é por acaso que a China se apega à sua política financeira de subvalorização do renmimbi. Essa subvalorização da moeda chinesa, mantida contra vento e maré, é um elemento relevante para garantir os altos superavits da balança comercial chinesa quanto a outros parceiros, como notadamente os Estados Unidos. Não é aqui o lugar para discutir dos instrumentos que ensejam a continuação desses valores artificiais do renmimbi, que favorecem especialmente a posição comercial da RPC.
A apreciação do real é o reverso dessa medalha e dos resultados favoráveis que ela registra. Dentre os países emergentes, o real tem sido valorizado especulativamente (a par da apreciação decorrente dos nossos bons índices macro-econômicos). São conhecidas a propósito as consequências negativas da apreciação: favorecem as importações, pelo seu barateamento; e estorvam as exportações, pelo respectivo encarecimento.
Nesses termos, a apreciação do real tende a produzir efeito perverso no incentivo a desindustrialização. Tal ocorre pelo estímulo de vantagem de preço relativa a embutir mais insumos importados na composição de nossos produtos industrializados exportáveis.
Nesse quadro, se indica recente tese de doutorado do economista Alexandre Comin, professor licenciado da PUC-SP, que defende passar o Brasil por um processo parcial de desindustrialização.
Desse modo, mostra Comin que 21 dentre 23 setores da indústria de transformação registram perda de densidade entre 1996 e 2006. Em outras palavras, segundo Comin “a produção industrial cresce na ponta, mas com uma maior proporção de componentes importados”.
De resto, este menor crescimento da indústria brasileira também se confirma na comparação com os demais BRICs, tanto para a economia da China, que será a segunda maior mundial, quanto para as economias de Índia e Rússia, que tem menor valor agregado que a do Brasil. Assim, o crescimento do valor adicionado industrial é de 3,5% no Brasil (comparado com um crescimento do PIB de 4,6%), nos anos 2005-2008. Somos os nanicos dos BRIC, haja vista Rússia (6,9% e 7%) e Índia (8% e 8,4%), sem falar da China (12,9% e 11,2%), respectivamente.
Somos, portanto, no aspecto industrial, os retardatários do grupo emergente, o que está em contraste com os elevados índices sustentados que mantivemos durante boa parte do século XX.
( Fonte: Folha de S.Paulo, caderno Mercado)
terça-feira, 17 de agosto de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário