É conhecida a queda do povo japonês pelas iguarias do mar. Por causa dessa singular predileção, evitam excluir a pesca a determinada espécie de atum, colocada na lista das em processo terminal de extinção. Sob o manto do cinismo, recusam-se, por motivos formalísticos, a admitir o óbvio. Para eles o consumidor é rei, até o momento em que o prato prelibado venha a desaparecer dos tabuleiros de sushi, uma vez consumada a extinção da espécie ameaçada.
Já assistimos em tempos recentes o embate desigual entre os pesados navios baleeiros do Japão – que são verdadeiras usinas flutuantes – e os frágeis barcos da Greenpeace e do Sea Shepherd (Pastor dos Mares). A propósito, os noticiários documentaram – e não faz muito – a criminosa investida de um desses navios (que parecem cruzadores) contra embarcação da Greenpeace. Por pouco,os súditos do Império do Sol Nascente não a afundaram.
Por vezes, seja por hubris, seja por burrice mesmo, os infratores criam situações que, se examinadas com a requerida prudência, jamais seriam montadas. Por quê? Pela simples circunstância de que proporcionam o cenário ideal para explicitar a real natureza da respectiva atividade. Em outras palavras: ao invés de incriminar o suposto infrator, desvendam a encenação e apontam os verdadeiros responsáveis.
Tenha-se presente de início que a pesca da baleia se acha formalmente proibida por determinação do órgão internacional encarregado desses mamíferos marinhos, antes dizimados pelos baleeiros noruegueses, islandeses e japoneses. É a chamada Moratória da Pesca da Baleia, imposta pela International Whaling Commission (IWC)[1], para evitar que este animal marinho, já ameaçado de extinção, desapareça dos mares.
O Japão – que atribui por causa do singular paladar de seus patrícios alta prioridade ao trato desse assunto – logrou junto a IWC que se instituísse uma exceção (loophole) à regra internacional. Por essa disposição hipócrita, os pesqueiros japoneses podem matar trezentas baleias por ano, para fins de pesquisa científica.
Como é um segredo de Polichinelo, a tal pesquisa científica não passa de uma fraude consentida à proibição internacional. Como assinala a organização Sea Shepherd, uma vez cumprida a formalidade da dita pesquisa, a carne dessas baleias é vendida no mercado nipônico, para ser incontinênti servida aos ávidos fregueses nos restaurantes. Se houvesse dúvida sobre os reais motivos da pesquisa, a sua colocação nas mesas dos restaurantes constitui o carimbo inequívoco da desavergonhada burla.
O incrível julgamento de Peter Bethune.
A japonesa Fisheries Agency[2] julgou oportuno colocar em juízo penal um ativista neo-zelandês, Peter Bethune, de 44 anos. É por primeira vez que tal ocorre, não obstante o longo enfrentamento dos ativistas ambientalistas contra os navios baleeiros do Japão nas águas geladas do Antártico.
Cercado por guardas uniformizados, Bethune compareceu nesta quinta-feira perante um magistrado penal japonês para responder às acusações formais – reputadas graves pelo juiz : de (a) invasão de propriedade; (b) dano à propriedade; (c) ataque violento (assault); (d) obstrução coatora de negócios legais; (e) posse ilegal de uma faca.
O advogado da Sea Shephard, Dan Harris, que está em Tóquio para acompanhar o juízo, embora não seja o advogado japonês oficialmente encarregado, declarou a propósito:
“Todo esse julgamento surgiu por motivos políticos, mais do que criminais. Na verdade, Pete Bethune nada fez. Subiu em um navio japonês. Ninguém correu perigo algum. Ninguém ficou com medo. Para o Japão agir como se estivesse aplicando uma lei criminal é um pouco farisaico (disingenuous), se atentarmos para o que Pete Bethune fez.”
Joji Morishita, o porta-voz da Fisheries Agency, a autora da ação, responde: ‘As leis devem ser aplicadas, e por isso submeter os responsáveis a juízo’. E acrescenta: ‘Reconhecemos o direito de protesto, o direito de manifestar-se, o direito de expressão as próprias opiniões. Isto não significa que se possa atacar pessoas mediante força física (sic), atacar os nossos navios e as tripulações nos próprios barcos’.
O acusado, Peter Bethune, deverá testemunhar na segunda-feira, 31 de maio. O veredito é esperado para a quinta-feira, dez de junho.
Espera-se que essa pantomima legal termine com a absolvição do ativista. Assinale-se, por oportuno, que se o absurdo for levado a seus extremos, Peter Bethune ficaria quinze anos atrás da grades.
Em fim de contas, se formos otimistas, a hipocrisia e a instrumentalização podem ser as vitimas desse julgamento montado. Se exposta a desfaçatez japonesa – a fraude consentida da pesquisa científica como espécie de quota subreptícia para a matança desses mamíferos marinhos – talvez sirva para encaminhar a mais do que devida abrogação dessa imoral autorização da IWC para matar.
( Fonte: C N N )
[1] Comissão Internacional para a Pesca da Baleia (com sede no Reino Unido)
[2] Agência de Pescarias
quinta-feira, 27 de maio de 2010
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