Doce Ilusão (02)
É um trecho da praia onde se estende larga faixa de areia. Como está iluminada, vai caminhando até a arrebentação. Por comodidade, tira os sapatos e as meias. Sente os pés afundarem na areia a princípio morna e solta. Aos poucos, fica mais compacta. Por fim, o espaço batido, úmido, a que as águas chegam esporadicamente.
Absorto, contempla as ondas e a progressiva escuridão do oceano. No breu noturno busca seguir os desenhos das brancas espumas, nervosas crinas que, mais ao largo, a noite vai enegrecendo..
“ Moço, me dá um trocado !”
No braço, pousam dedos frios, crispados.
A princípio, não entende. A atenção custa a soltar-se do mundo que tem à sua frente.
“ Moço, não brinca comigo!”
A pressão aumenta. A mão se mexe só um pouquinho, e no entanto algo parece riscar-lhe a pele.
“ Passa logo a grana !”
Com um repelão, ele se afasta. No antebraço, um fio rubro.
Diante dele, um vulto descarnado, que se agita.
“ O que é isso ?!”, grita.
Na contraluz, mal distingue as feições, mas entrevê um corpo adolescente.
Assustado, busca afastar-se do perigo.
Quem o investe, tem gestos ágeis. Entre os dedos, trará a ameaça da gilete.
Bate forte o coração. Tem impressão esquisita de que o silêncio da praia e o estrondo das vagas sejam sensações distintas. Como se estivesse de fora, a contemplar qual assistente aquela cena.
“ Ó meu, acorda ! Chega de brincadeira !”
Na penumbra, Alberto vê olhos dilatados e feições contorcidas.
Tenta refletir.
Não vale a pena arriscar. Melhor não contrariar quem deve estar drogado, e não tem nada a perder.
Sem fazer movimento brusco, devagar, ele recua um passo.
“Tudo bem... olha, eu vou te dar o que tenho...”
“ Tu fala demais... quedê o dinheiro?”
Ele faz menção de pôr a mão no bolso.
Inquieto, o assaltante, de supetão, levanta o braço.
“ Calma, numa boa !”
Intui que é necessário aparentar controle. Nada que leve jeito de reação.
“ Calma... veja, tou tirando do bolso o dinheiro que eu tenho pra te dar...”
Lentamente ele puxa a nota de vinte reais que traz consigo.
“ Só isso ?”
“ Ó meu, só vim passear na praia... é tudo o que eu trouxe...”
Em rápida estocada, as mãos do adolescente se afundam nos seus bolsos.
“ Tu tá duro, ô meu...”
Por instante, ele para, como se em dúvida.
De imediato, sequer um átimo depois, sai o corpo ágil em desabalada carreira.
Enfim trêmulo, confuso, irritado com si mesmo pelo tolo risco incorrido, Alberto, com passo estugado, quase a correr, começa a longa travessia pelas frias areias da praia escura e deserta, em busca de farmácia para o curativo.
*
sábado, 15 de maio de 2010
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