Depois das manifestações de júbilo esportivo, ao ensejo da assinatura do acordo tripartite, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, irritado talvez seja pelo súbito isolamento, seja pela efêmera duração da tentativa de resolver a crise iraniana, julgou oportuno manifestar-se junto a um público não exatamente familiarizado com questões político-diplomáticas.
Como de hábito, falando de improviso e na sua lingua coloquial, declarou para o público da 13ª Marcha dos Prefeitos: “É muito engraçado que algumas pessoas não gostaram que o Irã aceitasse a proposta, porque tem gente que não sabe fazer política se não tiver o inimigo, e sou daqueles que só sabem fazer política construindo amigos”.
Outra vez tenho de mencionar a observação de Lord Altrincham, a respeito da ainda jovem Elizabeth II, e de sua vozinha nos discursos,”que lhe dava um mal-estar no pescoço”. A expressão inglesa alude a um vivo desconforto sentida por alguém a propósito de uma determinada situação.
Quiçá examinando a atitude de Lula possamos entender melhor a nossa perplexidade. Diplomacia não é arte de fazer amigos, mas de compor interesses e encontrar soluções aceitáveis, nos âmbitos bilateral e multilateral. A amizade entre os Estados e as Nações é um conceito que se fundamenta nos interesses respectivos, assim como na capacidade de cada país de fazer valer tais interesses e posições.
As cercanias regionais podem servir para o maior entendimento entre os países, que terão presentes experiências comuns do passado, a par da validade da cooperação, como instrumento de paz e prosperidade. Se o mundo moderno e o temor das armas nucleares contribuem para tentar construir realidades mais consentâneas com o convívio pacífico e não as oposições maniqueístas e os métodos hobbesianos do passado, enganam-se aqueles – como Rousseau dizia do Abbé de Saint Pierre – ‘com grandes ideias e estreitas visões’ que pensam construir amizades duradouras sobre a areia de interesses contrapostos.
Confiando a um grupo de políticos municipais e sindicalistas a sua visão da diplomacia, que é versão do ‘fazer amigos e influenciar pessoas’ de Dale Carnegie, o pai da auto-ajuda, Lula prestaria aos brasileiros um favor, ao entremostrar a rationale que subjaz à sua incursão na área da grande política.
Quando Clemenceau declarava que a guerra era coisa demasiado importante para ser deixada aos generais, não queria decerto substituir-se ao conhecimento tático dos militares, mas trazer para a ‘Grande Guerra’ a visão mais larga do estadista.
Lula, por sua vez, não pode intrometer-se em searas que lhe são desconhecidas, ou de que possui compreensão superficial, similar a de seus eventuais ouvintes. O Brasil se pauta por manter boas relações com a maior parte do mundo, mas isto não quer dizer que tenhamos muitas afinidades e interesses comuns com o governo de um país como o Irã, que enforca dissidentes de opinião, renega diversos acordos, se empenha na construção de usinas subterrâneas votadas ao enriquecimento do urânio, etc.etc.
Passados os seus quinze minutos de notoriedade internacional, o Cara, ungido por Obama, começa a descobrir que prestígio e trânsito internacional têm muito a ver com as respectivas posições e eventuais amizades.
Não vamos aqui desfiar a série de tropeços da diplomacia do senhor Lula da Silva. O ingênuo é pensar que se pode continuar a ser o rei da cocada preta, enquanto diz e faz o que lhe dá na veneta.
Reza a sabedoria popular, que nosso Presidente tanto preza, que quem diz e faz o que bem entende, não só ouve, mas também vê o que não quer.
( Fonte: Folha de S. Paulo )
sexta-feira, 21 de maio de 2010
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