sexta-feira, 21 de maio de 2010

CIDADE NUA III

Doce Ilusão (07)

A contradição dos votos assumidos será decerto a primeira regra no comportamento amoroso. Para quem não desejasse trair cuidados excessivos, aparecer antes das seis denotaria um zelo que não casava bem com a afivelada máscara da naturalidade.
Não obstante a sua plena consciência do papel que faria, foi assim mesmo que procedeu.
*
Passados uns cinco minutos depois da hora, ela apareceu.
“ Ué, você está aí ?”
“ Não foi o que combinamos ?”
“ Não me lembro de ter combinado qualquer coisa com você”, disse, olhando contrafeita para os lados.
“ Tudo aconteceu tão rápido, né ?...” disse, com um sorriso. “Mas já que estamos aqui, não vejo mal em que aproveitemos a oportunidade...”
A sua atenção tornou a vagar à volta, como se buscasse cientificar-se de que ninguém os observava.
“ Não sei... nós nem nos conhecemos...”
“ Pois é justamente o meu objetivo !”, exclamou ele. “Que tal se nos apresentássemos ?”
Ela continua a fitá-lo com um olhar tipo espelho, que não deixava filtrar um aceno que fosse de reação.
“ Eu me chamo Alberto. Será que podia saber a sua graça ?”
Não queria parecer insistente. Tampouco denotar algum nervosismo. Por isso, se refugia no sorriso.
“Você fala meio esquisito... Graça quer dizer nome ?”
“ Sim...”
“ Me chamo Gardênia.”
“ Que lindo nome !”
“ Não acredito ! ‘Cê não tá me gozando ?”
Por um instante, entreviu a sombra de dúvida passar-lhe no semblante.
“ Nem de longe. Gosto muito do seu nome”, respondeu com jeito quase sério.
Percebeu então que o clima entre os dois havia mudado. A atitude dela não lhe parecia contraída como antes.
A pretexto de acertarem um programa – “assim nos conhecemos melhor” – ele indagou onde morava.
“Copacabana.”
“ Que feliz coincidência ! Moramos no mesmo bairro !”
E por um fugidio, mas não desapercebido momento, tocou-lhe na mão de dedos finos e elegantes.
*

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