Confundador da Natura, o empresário Pedro Passos
diz que o Brasil precisa "tomar juízo" quando o assunto é preservação
ambiental. Segundo ele, conquanto a
soberania do País na região seja "indiscutível", isto não isenta o
governo brasileiro de responsabilidade pela preservação do ativo - que, de
resto, é importante para todo o planeta.
Para Pedro Passos, o governo Bolsonaro
logrou, em oito meses, reverter a imagem de líder ambiental que o Brasil conquistara desde os anos
noventa. "A Amazônia vinha em tendência de desmatamento menor. Essa
política recém-implantada mudou a percepção sobre o Brasil e assustou o
mundo", afirmou o empresário.
Para ele, a "retórica
radical" do governo inclui o incentivo à fiscalização mais frouxa, que se
reflete em mais desmatamento e queimadas. Segundo o INPE houve alta de 40% no
deflorestamento da Amazônia.
- Quanto à possibilidade de que falte ao Governo Bolsonaro visão de exploração sustentável na Amazônia, Passos respondeu: A Amazônia é um Brasil a ser descoberto, com enorme potencial, mas que até hoje não projeto efetivo para abordar essa riqueza de forma consistente. Há alguns exemplos bem-sucedidos, mas nada em escala para explorar a Amazônia como se deve.
Por que a Amazônia deve ser prioridade para o governo ?
-
Primeiro, porque é uma riqueza essencial para manter a situação
climática global razoavelmente sob controle. Às vezes, parece que, quando
falamos de soberania da Amazônia, a gente não se subordina à verdadeira
soberania, a do planeta. Segundo, há a questão da preservação da
biodiversidade. E, por fim, há as cadeias de produção - é importante investir
na Amazônia para produzir mais conhecimento.
Ou seja: é preciso reinventar a forma de explorar a floresta?
-
A gente só vai mudar o jogo da exploração
extrativista de baixo valor agregado se agregarmos mais conhecimento.
Infelizmente, não existe essa alocação de recursos hoje. Mas tenho expectativa
de que se construa um projeto entre poder público e empresas privadas. Podemos
explorar a Amazônia de forma diferente.
Como assim ?
- No passado a gente desenhou a Zona Franca de
Manaus como solução. Parece-me que não é.
Ela exige um subsídio alto, de R$ 30 bilhões ao ano. Imagine alocar esse
recurso para conhecimento, ciência, (busca de) ingredientes para alimentação,
cosméticos e produtos farmacêuticos... A gente poderia conseguir muito mais resultados.
Como o senhor vê a discussão sobre soberania na Amazônia ?
- A
soberania brasileira é indiscutível, mas precisamos ser responsáveis por um bem
de que todos dependem. Existe um interesse multilateral. Estudos dizem que â
medida que aumenta o desmatamento, podemos chegar num ponto irreversível do
ponto de vista climático. Não podemos virar as costas para dados científicos -
eles estão aí provando que a Amazônia tem uma influência no clima do planeta.
O Sr; acha que o País
já foi visto como uma liderança na questão ambiental e que, agora, essa visão
sobre o Brasil mudou ?
- O Brasil vinha numa
tendência muito positiva em relação à preservação da Amazônia.Desde o
fim dos ano 90, quando se introduziram mecanismos de monitoramento, a Amazônia
vinha em tendência de desmatamento menor. A política recém-implantada, em oito
meses, mudou a percepção e assustou o
mundo. Hoje a retórica é radical. O
incentivo a uma fiscalização mais frouxa e os resultados de desmatamento e
incêndios podem ter um impacto muito
sério não só na parte ambiental, mas na economia. Já vivemos um momento em que
o Brasil estava desmatando a Amazônia, conseguimos evoluir e rapidamente estamos
perdendo isso. Precisamos tomar juízo.
Várias empresas internacionais dizem que deixaram de comprar do Brasil por causa da Amazônia. O Brasil pode estar dando um tiro no pé ?
- Não vamos ser ingênuos, pois tem dois lados. Existe a efetiva preocupação com a sustentabilidade. E há os interesses financeiros de outros países.Precisamos estar atentos. O Brasil tem posição privilegiada para fazer da Amazônia um ativo importante e ocupar posição de liderança nas negociações comerciais. Hoje, a moeda de troca não é mais tarifa. A moeda são regulações ambientais e trabalhistas, imposições não tarifárias que poderiam acelerar a preferência pelo Brasil.
Como o sr. vê o papel do agro-negócio nesse
cenário ?
-
Vejo o agronegócio brasileiro como de alta produtividade e inovação. Grande parte do agronegócio se opõe a essa postura contrária à preservação
ambiental. Existe um pedaço do setor, de baixa tecnologia, que usa o
desmatamento para ampliar áreas de produção. Muitas pessoas do setor dizem que
não é necessário mais um hectare de desmatamento para ampliar a produção.
Essa tensão ambiental afeta as empresas
brasileiras globais?
- É uma preocupação da Ministra da Agricultura (Tereza Cristina). Rodrigo Maia (presidente da Câmara dos Deputados) está organizando uma viagem internacional
para explicar a legislação ambiental brasileira a investidores. Isso mostra que
haverá dano a empresas brasileiras se não fizermos um contraponto. No caso da
Natura, procuramos desenvolver uma rede de relacionamento consistente,
mostrando nossa política. Esse histórico talvez possa nos proteger um pouco.
Mas não é favorável ter uma postura radical como a que temos visto.
( Fonte: O Estado de S. Paulo )
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