Após
a Suprema Corte britânica considerar a 24 de setembro ilegal a suspensão do
Parlamento articulada pelo Primeiro Ministro Boris Johnson, os deputados retomam hoje suas atividades. Cresce
igualmente a pressão pela renúncia do Primeiro Ministro, de parte de seus inúmeros
opositores.
Por
que foi ilegal a decisão do Primeiro Ministro?
Pela simples razão de que teve o efeito de frustrar ou impedir a capacidade do Parlamento de
desempenhar suas funções constitucionais, "sem justificativa razoável",
segundo explicou a presidente da Suprema Corte, a baronesa Brenda Hale.
Imediatamente, o presidente da Câmara dos Comuns, John Bercow, expediu
instruções para que as sessões do
Parlamento sejam retomadas hoje, 25 de setembro, com o início das atividades
previsto para as llh30, mas sem a sessão semanal de perguntas ao primeiro
ministro - que encurtou sua agenda nos Estados Unidos e voltará mais cedo para
casa.
O deputado nacionalista escocês Ian
Blackford tuitou: 'Precisamos responsabilizar o governo por sua ações. Boris Johnson deveria renunciar depois
de violar a lei". Do congresso anual do Partido Trabalhista, em Brighton,
o líder da oposição, Jeremy Corbyn
também exigiu a renúncia do primeiro ministro. Dificilmente, porém,a Oposição
conseguiria os votos necessários para derrubar o gabinete Johnson.
Assinale-se que já havia uma surda insatisfação com o decreto ilegal que
o Primeiro Ministro convencera a idosa Rainha a subscrever. Essa indignação foi
representada pela Baronesa Brenda Hale, de 74 anos, presidente da Suprema
Corte do Reino Unido. A decisão unânime,
contrária à suspensão do Parlamento, que
critica a decisão do prime minister, e "afronta à
Constituição britânica". Dentre os
casos de maior realce de Lady Hale, já estava a decisão de o governo ter o
poder de invocar o art. 50 do Tratado de Lisboa da União Europeia, que
constituiu o início formal do Brexit.
A Inglaterra atravessa um momento difícil. O atual Primeiro Ministro tem
logrado acumular uma série de erros em curto espaço de tempo, mas é protegido
pela deusa Fortuna, pela circunstância de que o líder da Oposição, Jeremy Corbyn, do Partido Trabalhista,
ostenta uma pouco invejável impopularidade.
Por infortúnio, a sorte - e uma série de idiossincrasias do chefe do Labour Party - atribuíu a Corbyn um frágil suporte político, o que tem
favorecido Johnson, mas prejudicado a velha Inglaterra ao não dar ao Povo
inglês - pelo menos até o momento - uma real opção entre o líder da Minoria e o
Primeiro Ministro - que até o presente
só tem de chuchilleano um ego
indomável, ainda que não acompanhado do firme discernimento do líder britânico
na luta sem quartel contra o Fuhrer.
Há, portanto, na velha
Inglaterra uma espécie de maldição, que começara com o incrível erro do
patrício David Cameron, cedendo à enésima petição de um ulterior referendo, ele
que circulava pelos salões da UE em Bruxelas, com o óbvio desagrado de um
aristocrata em meio à plebe da MittelEuropa.
Terá pensado o infeliz que tantos referenda
tinham sido tentados, que não faria mal submeter a Inglaterra a mais um, e que
vencesse como Tony Blair, um
ulterior inútil desafio. Que se tenha ido com tal erro, a sua carreira
política, seria golpe menor, se tal não ocasionasse igualmente que o sonho da
aristocracia inglesa - que aguardara paciente o desaparecimento do rochedo de Gaulle - não fosse igualmente para o
ralo das causas perdidas, como se o sonho da intelligentsia britânica tivesse que morrer refém de uma estúpida
conspiração - que fecha o sonho do Continente para a sua juventude, que não
mais é bem-vinda nas universidades europeias - e abre doravante para as sólidas
mediocridades que pensam reviver espectros o estranho retrocesso de uma exitosa
necromancia...
O que de bom pode
trazer esse tão falado brexit ? O que de grandioso tem essa melancólica saída da União Europeia,
sonho perseguido com tanto afinco por uma plêiade de homens que hoje não mais
existem, afortunados eles, que não tiveram de presenciar o referendo estival,
que se traduziu em triste slogan de
termos latinos, uma língua hoje morta, mas que se destinara no passado a
investir de antigas sílabas palavras que careciam de perdida nobreza, muita vez
um velho disfarce para ideias que não são mais ideais, despojadas que estão das
suas sonoras promessas de uma grandeza que os jovens - esses juízes implacáveis
- não mais logram distinguir.
(
Fontes: O Estado de S. Paulo, The Economist, The New York Times )
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