Para quem falou tanto de golpe, como o Partido dos Trabalhadores, assim como a própria
Dilma, será com naturalidade que, graças a um conjunto supostamente feliz de
circunstâncias, a minoria no Senado cuidou de apresentar medida de exceção,
diante da sentida inevitabilidade da condenação.
Com efeito, a Constituição determina que
o mandatário condenado pelo Senado por impeachment,
tenha automaticamente suspensos os direitos políticos por oito anos, não podendo
inclusive ser contratado para cargos públicos.
Dada a arrolada e verificada gravidade
das causas do impeachment, esta
disposição adicional não foi prevista em requinte de crueldade suplementar do
legislador. É curial que a ré deveria ser afastada igualmente no que concerne à
inabilitação provisória para a vida pública.
Essa 'bondade', outorgada para a
presidente cassada, se deveu, não só ao apoio do PT e dos demais partidos da
aliança, mas sobretudo ao presidente da sessão, Ministro Ricardo
Lewandowski. Como refere oportunamente
Merval Pereira, o presidente do STF "revelando afinal sua benevolência com
a 'presidenta' que transformou o documento de pronúncia em uma 'proposição',
que é sujeita a destaques de votação. Sendo assim, foi vitoriosa a proposta de
separar do texto principal a punição acessória de inabilitação, que acabou
sendo recusada."
Como se verifica, portanto, o fatiamento - que ora parece estar em moda - poderia ser encarado como
meio seguro de contornar a severidade da legislação.
Contudo, não é à toa que, na disposição
constitucional, consta tal exigência suplementar. Ela aí está inserida pelo
simples motivo que a cassação, sendo reservada aos altos cargos, afigura-se por
conseguinte necessário que a sua influência seja cerceada por algum tempo
prudencial, para evitar a aglutinação de um núcleo contrário ao interesse
público. Trata-se de criar a proteção necessária para que o fator havido por
desagregador (e por isso cassado) fique impedido de obstaculizar por um tempo apropriado
as forças políticas que prevaleceram (no que se presume seja pelo interesse
público).
Concordando em fatiar a norma
constitucional, dando ao Senado a oportunidade de tratá-la como se fora matéria
ordinária, não foi decerto pequena a gentileza prestada pelo presidente Ricardo
Lewandowski.
O precedente é grave. Conhecer de tal
recurso - excluída a eventual simpatia do presidente Lewandowski (em outras
questões tão estrito na afirmação das próprias limitações processuais, enquanto
presidente da sessão) não é coisa de somenos e poderia inclusive merecer de
quem de direito a conhecida ADI
(ação direta de inconstitucionalidade) para a qual o Supremo deverá
proporcionar a atenção devida.
Com efeito, não é decerto todo dia em que
uma assembleia, mesmo com a hierarquia do Senado Federal, inventa um rito
deveras especial para derrogar disposição constitucional.
No entanto, forçoso será reconhecer
que a matéria é controversa. Mestre Joaquim Falcão, no Globo de hoje, "Lewandowski plantou
a dúvida" assevera notadamente: "Ninguém pode dizer qual será a decisão do Supremo. Ela é, por
natureza, incerta. É justamente na gestão da incerteza política, ou A ou B, que
reside seu poder. O Supremo assim se aumenta. Ele é hoje o gestor das
incertezas nacionais.Até quando? (...) O bom senso sugere que as instituições
tomem decisões que colaborem para a
manutenção de seu próprio poder. Dificilmente o Supremo tomara decisão que
anule o impedimento de Dilma. (...) Colocaria em dúvida sua própria
legitimidade. É ônus pesado demais. Mas ninguém garante o bom senso."
( Fontes: Joaquim Falcão, O Globo, Folha de S. Paulo,
O Estado de S. Paulo )
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