Não creio que a memória me engane.
Penso que houve pelo menos uma viagem de
meus tios para Porto Alegre - Chico tinha sido promovido na Swift, e o casal se transferira para São
Paulo, onde ficava a sede da sucursal brasileira da companhia americana.
Naqueles tempos de guerra, o
transporte aéreo era antes uma exceção do que a regra. De qualquer forma, me
recordo da viagem de Porto Alegre até Rio Grande de meus pais e meus padrinhos. Levaram-me junto. Dado o
desconforto da travessia, minha mãe enjoou bastante.
Não me recordo quanto tempo passamos
em Rio Grande, e como voltamos. Minha mãe passando mal com o sacolejo do carro,
talvez o retorno haja sido de navio pela lagoa dos Patos. Dada a circunstância
de que não se tinha de cruzar mar aberto, a alternativa, diante do desconforto
anterior, se impunha.
Chico voltava ao Rio Grande não só
para rever familiares, mas por ter um sítio próximo daquela cidade. Ele pensara
que seria um bom investimento. No papel, tudo contribuía para dar-lhe rósea
visão das perspectivas que abria ao ver-se transformado também em proprietário
de terras.
Em teoria, tudo lhe prometia
sucesso, com gordos lucros uma vez negociada a colheita. Chico tinha no sangue
o amor europeu pela terra, e pelas oportunidades de seu cultivo.
Depois que gastou as economias do
casal com a aquisição da chácara, consumia muito do seu tempo de lazer - ao
retornar do diuturno trabalho de responsabilidade na direção do setor
financeiro no Brasil da Swift - em mandar instruções ao capataz, para tornar realidade seus planos
para a referida propriedade.
Como Chico contraíra empréstimo
bancário para adquirir a propriedade (e levantar casa para o dito capataz), ele
mandava cartas para o empregado, com as suas instruções. Fundado no que
acreditava fosse a própria experiência - posto que fundada em livros e
publicações outras, mas sem qualquer conhecimento pregresso da atividade
agrícola - Chico mergulhou nesta atividade à distância com o típico otimismo
que, como bom descendente de italiano, o caracterizava.
Não sei qual tinha sido a
opinião de minha madrinha sobre a empresa. Bi (este era o apelido familiar da
tia Déborah) tinha personalidade na aparência terna e doce.
No entanto - e o próprio Chico
me diria muito mais tarde, quando eu, já crescido, ele julgara-me merecedor de
suas confidências - as Mendes tinham
muita personalidade e Deborah delas não discrepava. Era bom não brincar com
ela, pois gênio era o que não lhe faltava.
Posto que já estivesse meio
grandote na época desse desabafo, a princípio não acreditei. Mais tarde, vi que
Chico tinha certa razão, embora eu
sempre tenha mantido com minha madrinha ótimas relações.
Assim, pois, começou a
atividade de meu padrinho como proprietário de terras. Conquanto a chácara não
fosse nenhum latifúndio, ele a princípio iria depositar além dos muitos
mil-reis que iria retirar de suas economias, agregadas com muito zelo, as
grandes, imensuráveis esperanças na potencialidade produtora daquela
propriedade, tão bem situada, junto aos mercados do Rio Grande e de Pelotas.
Francisco Lanzetta, como bom
filho de imigrante italiano, confiava na terra generosa do Brasil.
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