sexta-feira, 2 de março de 2018

Xi e a reeleição sem limites


                              

          A frase evangélica: 'dize-me com quem andas e te direi quem és' pode ter significados que vão muito além de o que pensara a irrepressa ambição de Xi Jinping.
           Já falara alto a sua inegável admiração por Mao Zedong. E, não obstante,  grande foi o dano que o poder ilimitado de Mao trouxe para a República Popular da China.
            No entanto, nas administrações que sucederam a Mao, se as diferenças são por vezes marcantes na ambiência democrática, uma delas se aproxima bastante da democracia, quando o Primeiro Ministro Zhao Ziyang, com o apoio de Deng Xiaoping, foi Primeiro Ministro e Secretário-Geral do Partido. A má-sorte e o oportunismo do grupo de Li Peng levou, na ausência de Zhao (em viagem oficial à Coréia do Norte), a que esse grupelho prevalecesse sobre Deng, que assinou um comunicado claramente provocatório contra os então manifestantes na Praça Tiananmen, publicado no jornal do regime.
             De volta à China, e instado por Deng a aplicar o que então chefe informal do Poder assinara, embaído na provocação pelo grupo direitista de Li Peng, Zhao Ziyang, como verdadeiro herói trágico se recusa a fazê-lo, o que levou ao massacre da praça de Tiananmen, com o Exército chinês se transformando no executor dos estudantes. A queda de Zhao - que perdeu todas as suas posições, mas não a honra - levaria à sua prisão na própria residência em Beijing, onde morreu em 2005. Dada a sua popularidade,  o regime cuidou de que o seu enterro fosse secreto.
              Com isso, mais uma vez um capricho da História evitou que as forças democráticas prevalecessem na China. A própria Imperatriz viúva Ci-Xi que governara sob um regime democrático, no final de seu longo reinado, não pôde viver o suficiente para legar à democracia a força necessária para afirmar-se após sua definitiva partida.
                Xi Jinping, com o seu culto a Mao, já antecipava o que traria para a RPC. Pena que a sua admiração desmedida a Mao Zedong o terá obnubilado acerca dos desastres para a China que trouxe o poder ilimitado  desse líder revolucionário. O poder absoluto não pressagia tampouco com otimismo qual será o ambiente e as condições prevalentes durante a sua guarda do mando supremo.
                 O longo estirão do império de Mao se caracteriza pelo falso conformismo, pela insegurança quase absoluta - como nas revoluções dentro da revolução que o tirano se comprazia em trazer à superfície - e a penosa situação em que a sua suposta onipotência trouxe para o Império do Meio.
                  O que mais prejudica nessa situação de poder absoluto será a influência desmedida dos cortesãos e do seu estreito círculo, que costuma viver sob a tensão dos alcagüetes.
                  A censura na RPC é infelizmente uma presença que está em toda a parte. Zhao Ziyang punha muita fé na democracia, como meio de controlar a corrupção, que grassa com demasiada força nesses regimes fechados. Zhao acreditava até em controlar o Partido Comunista Chinês através da liberdade de imprensa. Esse conúbio - que matou o pobre Liu Xiaobo (e que mantém até hoje a sua mulher Liu Xia em prisão domiciliar) - pode ser terrível, mas Zhao confiava em derrotá-lo através da verdade. Pena é que tal, pelas circunstâncias acima descritas, não lhe tenha sido possível fazer acontecer, o que explica, de resto, a razão pela qual o governo hodierno da China tenha caído uma vez mais nas mãos de um admirador de Mao Zedong.
                     Mas há solitário aspecto que poderá um dia fazer repontar outra oportunidade para o grupo libertário de que Zhao Ziyang é o símbolo. Daí o medo e a ânsia que acompanha os poderosos, como este que ora surge, Xi Jinping.  Como eles podem confiar em  governança serena e tranquila, se a nuvem da desconfiança está em toda parte, como se vê no coitado do censor desse regime, de quem se exige tal ingrata faina?

( Fontes: O Estado de S. Paulo, The Secret Journal of Premier Zhao Ziyang, Empress Dowager Cihi, de Jung Chang )

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