sábado, 17 de março de 2018

O honesto Alexei Navalny


                                       
      Vladimir Putin deverá ser reeleito amanhã, domingo, dia dezoito de março. Há poucas dúvidas sobre tal resultado.  Os seus eventuais adversários não passam de nulidades.
        O maior rival do atual presidente não está entre os nomes que possam ser votados.  Nesse campo se acham comprovadas nulidades, partícipes de uma tragicomédia na qual esses 'adversários' estão presentes para fazer número.
        Seria como se houvesse um script oficial, em que luz a personalidade do grande estadista russo, que acumula presidências como se fora um ás da política, e que está predestinado pelo esquema de poder a assumir uma vez mais o encargo de máxima autoridade da Federação Russa.
         Se contemplarmos o campo oficial dos candidatos à Presidência, há diversos concorrentes que constam do quadro dos que postulam essa grande honra, mas todos seriam joãos (na expressão de Garrincha) ao lado do presidente em exercício - Vladimir V. Putin - que, para júbilo oficial e uníssona comemoração dos órgãos do regime, continuará a ser tão logo ultimado esse pleito de fachada nenhum outro que o próprio Putin.
         Sem embargo, esta eleição de fachada exigiu muito trabalho para que afinal, quem sabe já pouco depois de abertas as primeiras urnas ele possa comemorar o seu falso triunfo.
          A oposição ainda tem um grande nome na Rússia, com carisma e coragem - é indispensável tê-lo para concorrer contra esse grande presidente, que foi trazido para o Kremlin pela curriola de Boris Ieltsin, já decadente, e que por isso ameaçava os privilégios dos oligarcas pelas sombrias perspectivas de governo futuro. De nada lhes serviu trazer Putin para o poder, pois ele, na realidade, era igual a eles, ou até melhor do que eles.  Por isso o vento forte do poder, nas mãos do ex-KGB Putin, os levaria todos.
            Mas esqueçamos a memorável trajetória inicial do Putin neo-governante. No caminho dos tiranos, sói surgir sempre um novo desafiante, e o atual Alexei Navalny é um paladino da democracia  - que também o vento de Putin levou. Não sei quantas eleições enfrentou esse grande russo, e como as outras, esta lhe deu muito trabalho.
              Não, caro leitor, não é erro do redator. A eleição será amanhã, mas tudo o que conta já está decidido. Explico-me. Putin - ou sua curriola - obteve da dócil justiça russa a condenação de Alexei Navalny.  O rival foi condenado  no fim de 2017 por apropriação indébita e danos ao Erário. A denúncia se refere a serviços de consultoria prestados pelo advogado Navalny ao governo de Kirov, cidade de quinhentos mil habitantes a cerca de mil km de Moscou. Segundo a promotoria, Navalny tentou desviar  16 milhões de rublos (cerca de R$ 915 mil) da Kirovles, empresa estatal que vende madeira. A primeira condenação, em 2013 - com Navalny candidato à prefeitura de Moscou - foi anulada pela Corte Europeia de Direitos Humanos, por irregularidades no julgamento.
              No entanto, a questão foi retomada e o caso voltou a ser julgado em 2017. O juiz Alexei Vtyurin, da Corte Distrital de Leninsky, tribunal de primeira instância, proferiu contra Navalny uma sentença condicional - que pode ser cumprida em liberdade - de cinco anos.
               Foi o suficiente para que o registro de sua candidatura fosse negado pela Comissão Eleitoral Central da Rússia.  Desde esse veto do regime, Navalny vem pedindo a seus partidários - e são muitos - que não votem em candidato algum. 
               Como por virtual falta de concorrentes válidos - e não apenas figurantes - o relevante é evitar que Putin tenha votação expressiva.  Por isso Navalny cuida de aumentar o número de fiscais populares para cuidarem de impedir falsificações. Nesse sentido, de acordo com a equipe de Navalny, cerca de sessenta mil pessoas se registraram no site do ativista para atuar como observadores.
                 Alijado o único desafiante da campanha, o principal foco do comitê  passou a ser qualificar os voluntários para identificar fraudes, além de distribuir fiscais para além de Moscou e de São Petersburgo. Dentro do mesmo espírito, Navalny convocou um comitê para mandar 50 de seus observadores para a Chechênia, onde o partido situacionista Rússia Unida teve 99% dos votos nas eleições parlamentares de 2012.
                  Tampouco Navalny e seu grupo descuram do Twitter (tem 2,1 milhões de seguidores) e do Facebook (400 mil). Outro auxiliar voluntário de Navalny é Beryozkin. A respeito de seu líder, este último especula: "Não tenho certeza se outra pessoa seria capaz atualmente de organizar as pessoas da mesma forma que Navalny. Na Rússia, temos o seguinte ditado: 'Um lugar pode ficar vazio para sempre'. Mesmo assim, acredito que surgiria um substituto, caso Navalny fosse colocado fora do jogo, com uma prisão, por exemplo. Foi o que aconteceu depois da morte de Boris Nemtsov (opositor de Putin assassinado  em 2015). Navalny assumiu o lugar de líder da oposição. Da mesma forma, alguém despontaria para manter o trabalho. As pessoas estão cansadas deste governo.
   
( Fonte: O Globo, Bernardo Mello )                     

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