terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

Rafael Correa e a esquerda sul-americana

                  

        A consulta popular no Equador mostra clara vitória do  presidente Lenin Moreno e, sobretudo, a pesada derrota do ex-presidente Rafael Correa, que pensara, ao empenhar-se pela eleição de Moreno, em ter em Quito alguém que cuidasse da casa enquanto ele estivesse repousando no exterior.
       O ex-mestre escola, que editara leis pesadas para a imprensa e perseguira a liberdade de crítica do poder, veio a ser derrotado pelo eleitorado de forma muito mais pronta e pesada de o que pensariam seus eventuais aliados.
       A derrota do correismo, se lhe soa um dobre sobre as perspectivas no futuro, é outro aviso importante para aqueles integrantes de uma esquerda pronta à censura da imprensa e às leis mordaça.
       A par disso, na América do Sul há dois outros fortins do esquerdismo autoritário, i.e., Evo Morales, que prefere desconhecer a advertência de sua derrota no referendo sobre a reeleição, e o sucessor de Hugo Chávez, que se converteu em verdadeiro flagelo da Venezuela, a que me referi amplamente no blog de ontem, i.e. Nicolás Maduro.
        Os chamados "homens fortes" sentem particular dificuldade em preparar sucessores.  Este é o caso de Evo Morales,  que resolve contrariar o sentir popular, contrário à reeleição,  e bancar nos 30% de eleitores que ainda lhe parecem dar apoio incondicional.
         Quanto a Nicolás Maduro, apenas os cortesãos e a quadrilha dos chavistas, em processo de serem engolidos pelo inferno em que aquele transformou a antes próspera Venezuela,  podem ainda aferrar-se ao que resta do chavismo.
         Nem as lentes de Monsieur Pangloss lograriam discernir algo de positivo nos horizontes de regimes que pensaram ter o futuro pela frente. Agora, faces cansadas perscrutam, temerosas, as cavalhadas que, com traços trêmulos, riscam entre cruéis e cruentos, nos volúveis redemoinhos das nuvens de poeira, aquelas mesmo que tanto às vistas ofendem, e, não obstante o angustiado desconforto, ainda intentam, malgrado injetadas, e até purulentas, entrever o que parece reservar-lhes  esse desgraçado turbilhão, de chofre saído não se sabe bem de onde. Costuma ser assim o desfecho dos longos regimes, e sobretudo os que empilham, miséria sobre miséria, no que pensam seja o ledo passar dos dias sem história. Quantas desgraças e injustiças, quantas febres terçãs que a gente pobre na botica não encontrará poção alguma que ponha fim a tanto padecer. Se os ricos esquecem - e mais ainda os vis governantes que se prevalecem de um poder indigno, nascido das sombras e a elas destinado pelo sentir conjunto de um ódio mastigado devagar, na irada e teimosa espera que de uma greta infernal irrompam malditos turbilhões, de repente saídos não se sabe bem ao certo, mas será sempre de os que aguardam, com a paciência curtida em alguma  greta infernal,  pôr as mãos  suarentas e calosas, na hora suprema da vingança por demasiado tempo engolida.
            O Tirano e toda a súcia de os que lhe vivem ao redor, fartando-se do que lhes abre a mesa do poder,  não pensa, sequer medita, da hora terrivel que preparam eles, essa plebe para Ele ignara e abjeta, para o encontro marcado com as próprias maldades, ganâncias vis e toda sorte de menosprezo pela gente pequena. Por mais bem guardado que seja o Palácio, nesta hora ele estará aberto para que o Povo possa enfim regalar-se com seus prazeres em geral simples, mas amiúde terminais quando se rasgam as cortinas e a maldade pura, o egoísmo sem peias, a própria humana estupidez diante de toda a insensibilidade do passado, e de o que produz o brutal, ignóbil mesmo, contraste entre a opulência crua e nua, e a subexistência, tão sofrida quanto humilhada daqueles que ofendera e espezinhara mesmo sem sequer conhecer.       

(Fontes:Folha de S.Paulo,O Estado de S.Paulo,Voltaire,Fernando Sabino )




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