A notícia tem o atraso
de uma semana, mas diante dos naturais retardos de tais questões, não creio que
seja demasiado tarde para evitar-se não só um grave erro no contexto da
tradição diplomática brasileira, mas também apontar para as características que
marcam a atitude do Brasil através dos tempos em salvaguardar a liberdade de
opinião, assim como o direito maior de respeitar a orientação democrática
diante das posturas das ditaduras, assumidas ou não.
É vezo das ditaduras e de regimes
assemelhados, como o que vem sendo tentado, uma vez mais, reimplantar na
Turquia por Recep Tayyip Erdogan, que a ideologia dos partidos e movimentos
de oposição não seja havida como democrática, sendo assacada,até mesmo, de
subversiva. A ideologia democrática pode representar um desafio para regimes
como o de Erdogan, que desde muito se vem empenhando em radicalizar e até mesmo
assacá-la de terrorista, como se vê agora com os procedimentos intentados pela
virtual ditadura de Erdogan contra aqueles que, por motivos de consciência,
tomam a corajosa postura de opor-se ao
atual regime implantado na Turquia.
Para nossa tristeza, os trezentos
turcos residentes no Brasil e que se opõem ao regime de Erdogan, e que se
filiam ao Hizmet, entidade política
encabeçada pelo clérigo Fethullah Gülen, asilado nos Estados Unidos, podem vir
a ser considerados terroristas, se o governo brasileiro, para vergonha da
tradição diplomática de Rio \Branco, vier a aceitar o que lhe tenta impingir o
regime corrupto-autoritário de Erdogan. O absurdo de tal rationale é acentuado pelo detalhe
que o clérigo Fethullah Gülen vive há muitos anos nos Estados Unidos da América,
o que para pessoas informadas quanto à realidade estadunidense, semelha
indicação que expõe como absurda essa ridícula acusação de terrorista a alguém que se refugiara na terra de Abraham Lincoln. O que atemoriza a personagens
autoritários como Recep Erdogan é o número de adeptos da pregação do clérigo Gülen,
e por isso o tirano de plantão cuida de atribuir-lhe todo tipo de intentona,
dadas as carismáticas características da ideologia libertária de clérigo
que, não obstante viver no exterior, comanda o respeito de muitas pessoas no
estamento turco. Por outro lado, dada a situação de desconforto intelectual
advinda da repressão implantada por mais esse tirano oriental, o regime turco
sofre dos mesmos sintomas que atenazam as ditaduras de outras paragens do
planeta, demasiado afeitas à hipertrofia de imaginários perigos, que, em
verdade, correspondem à demasiado explicável insegurança de regimes que vivem no
medo e sob o temor de que as próprias falsidades sejam expostas.
Por isso, o novo governo
brasileiro deve dissociar-se das patranhas de Recep Erdogan, e não acolher a processos de extradição como aquele ora intentado
contra o empresário Ali Sipahi,
detido desde seis de abril, por acusações espúrias que enodoam a democracia
brasileira.
O governo nacional brasileiro não está a serviço de ditaduras, nem de
regimes autoritários e repressivos, em que os lobos se vestem com a roupagem da
democracia, como a versão turca de Recep Erdogan, eis que felizmente
vivemos sob a égide da liberdade, que não costuma lobrigar em cada esquina
supostas ameaças ao próprio regime, como sói acontecer aos ditos homens fortes que, na verdade, vivem transidos
sob o terror de que o seu mundo de mentiras seja desmascarado pelos intrépidos
e perigosos sequazes do regime democrático, que é o anátema de ditadores como Erdogan.
O Brasil, enquanto
democracia, não deve servir de gendarme das ditaduras, tanto as expostas,
quanto aquelas disfarçadas como o atual regime turco.
(
Fonte: O Estado de S. Paulo )
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