Para
os ex-ministros Celso Amorim (governos Lula e Dilma) e Aloysio Nunes (governo Temer), segundo a coluna de Bernardo Mello
Franco, apoiar uma intervenção na Venezuela seria "insensatez" e
"delírio".
Considerar esse caminho seria uma postura que se distanciaria de nossa
política externa, que privilegia o consensualismo e a criação de soluções
pacíficas, que evitem o derrame de sangue.
Mas a
podridão do regime chavista é evidente e agride as democracias da América
Latina, sobretudo diante da corrupção perniciosa da administração de Nicolás
Maduro que, cortinas de fumo e hipocrisias partidárias à parte, se vê diuturna
e penosamente rejeitada pela gente pobre da Venezuela, forçada a penosamente emigrar
com os pés, através das longas, árduas, amiúde perigosas, estradas do exílio,
que deixam de ter o voluntarismo de outras opções, não mais apenas pelo
desgoverno econômico e financeiro, mas pelo horror da hiper-inflação que se
traduz na negação do essencial ao Povo, assim como o desgoverno chavista, não
apenas com a sua opressão política - que se aplicaria apenas aos ricos - mas
tampouco esquece os pobres, com as mortes nos hospitais desprovidos de meios
básicos para assegurar a sobrevivência de infantes e de gente adulta. Tudo isso
resulta da hiperinflação, que se tornada permanente, desmoraliza a todos, pois
ataca sem distinção de fronte.
Tampouco posso concordar em que o apoio a Juan Guaidó haja sido um erro. É muito cômodo apostrofar as
atitudes de outrem, sobretudo se tais posturas são consequência de situações
extremas, em que a coragem pessoal tem de comparecer, em não mais se tratando
de anódinas atitudes de gabinete.
O
que acontecerá com Juan Guaidó é ainda um segredo da deusa Fortuna, quando
adotou, depois das consultações devidas, a sua postura, que a recepção mundial
veio contribuir no que concerne a quanto já amadurecera a sua coragem, a deixar
a cadeira de presidente da Assembleia Nacional, democrática é verdade, mas
despojada pela violência chavista de qualquer poder, ao ser entronizada a
Câmara chavista, saída de eleição ilegítima, que até a empresa européia que
cuidara dos trâmites da votação não se pejara de denunciar-lhe o caráter
espúrio.
É
fácil criticar a atitude de Guaidó, enquanto permanece em dúvida o êxito da
empresa. Corajosa, mas constitucional, e pela própria coragem Juan Guaidó se expõe a críticas de
muitas nobres cadeiras. Até agora, não se sabe como terminará a destemida e nobre
tentativa do deputado Guaidó que, críticas à parte, já amealhou cinquenta e
quatro reconhecimentos por esse mundo, vasto mundo de Drummond de Andrade. Se o denodo e a coragem
pessoal de Juan Guaidó que, apoios
de poderosos à parte, não hesitara em pôr a propria vida a perigo, não só
calando as vozes vizinhas da corrupção e do cinismo, mas também criando di persona uma situação que muito
contribui para expor o desfazimento moral de um regime já podre desde décadas, e
que conveniências, tao inconfessáveis quanto reais, terão preponderado por
demasiado tempo, a ponto de animar a certas figuras de acoimar de erradas as decisões de apoiar Guaidó ? Muita vez,
seja na lembrança da tranquilidade dos respectivos gabinetes, seja na
melancolia de que a política deles os terá afastado, algumas figuras não se dão
conta de que a História não é feita de tibiezas e de posturas consentâneas aos
aveludados gabinetes. A coragem alheia, até a que a deusa Fortuna se digne
expor-lhe seja o erro, seja o acerto, estará sempre exposta à palavra fácil da
crítica feita à distância.
Mas
será aos Juan Guaidó do passado, do
presente e do futuro que muita vez dependerá que calamitosas injustiças sejam
enfim arrostadas e, quem sabe?, vencidas. Já imaginaram acaso um mundo que
fosse ditado pelos trépidos cortesãos?
(Fontes: Carlos Drummond de Andrade, O Globo, coluna de Bernardo Mello Franco (Apoiar Guaidó foi erro, dizem ex-ministros)
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