O
presidente assume uma premissa com possíveis graves consequências. No seu
entender seria impossível governar o Brasil, enquanto respeitando as instituições
democráticas, e, em especial, o Congresso. Na visão presidencial, tais
instituições estariam sob o domínio de corporações - que ele, por algum motivo,
prefere não designar - que inviabilizam a Administração Pública, situação que
abriria caminho para uma "ruptura institucional irreversível" -
consoante ele o afirma em texto que fez circular por Whatsup a dezessete do
corrente.
Ao
compartilhar o texto, a que qualifica de "leitura obrigatória"
para "quem se preocupa em se
antecipar aos fatos", o Presidente expressa de maneira inequívoca que,
sendo incapaz de garantir a governabilidade pela via democrática - por meio da
articulação política com o Congresso legitimamente eleito - considera natural
e até inevitável a ocorrência de uma "ruptura".
Como reporta o editorial do Estadão, "não é de hoje que o
presidente se mostra inclinado a soluções autoritárias. Depois da posse, Bolsonaro mais de uma vez manifestou desconforto
com a necessidade de se lançar a negociações políticas para fazer avançar a
agenda governista no Congresso. Confundindo deliberadamente o diálogo com deputados
e senadores com corrupção, o presidente na verdade prepara terreno para desqualificar
os políticos e a própria política -
que não é atitude surpreendente
se nos ati- vermos ao seu comportamento pregresso. Tampouco, o próprio
Congresso parece não fazer fé em que Bolsonaro venha a esforçar-se em dialogar
e resolveu tocar por conta própria a agenda das reformas.
Para quem não nasceu ontem, o exemplo presente relembra em demasia de
uma não tão longínqua crise institucional ocasionada por ímpetos autoritários
em outro carismático presidente. De uma forma desanimadora, tudo parece
colaborar com a crise que foi longa nas suas consequências na ruptura
ocasionada por um também carismático e populista presidente, como o foi, por
breve espaço de tempo, Jânio Quadros.
O quadro atual, pelo seu nível baixo, não é por certo a dar-nos muito
otimismo no que concerne ao desfecho de tais aventuras. Como refere o Estadão, "com exceção de um punhado de assessores que realmente parecem saber o que fazem,
porém o governo está apinhado de sabujos cuja única função ali parece ser a de
confirmar os devaneios do presidente, dos filhos deste e de um ex-astrólogo que
serve a todos eles de guru, dando a fantasias conspiratórias ares de
realidade."
O texto que Bolsonaro divulgou - recomendando que fosse passado adiante
- diz que "bastaram cinco meses de um governo atípico, 'sem jeito', com o
Congresso e de comunicação amadora para nos mostrar que o Brasil nunca foi, e
talvez nunca será, governado de acordo com o interesse dos eleitores".
Segundo o referido texto, o presidente "não aprovou nada, só tentou e
fracassou", porque "a agenda
de Bolsonaro não aprovou nada, só tentou e fracassou", porque "a
agenda de Bolsonaro não é do interesse de praticamente nenhuma corporação'.
Nas atuais circunstâncias, "a continuar como está, as corporações vão
comandar o governo Bolsonaro na marra" - e, "na hipótese mais provável", prossegue o texto,
"o governo será desidratado até morrer de inanição, com vitória para as
corporações". Mas diz também que é "claramente possível' que o País
fique "ingovernável', na prática igualando-se à Venezuela. Aí entraria a
tal "ruptura institucional" de que fala o texto chancelado por
Bolsonaro - que o usou para ilustrar o risco que diz correr de assassinado pelo
"sistema".
O Estado de S.Paulo, em seu editorial, qualifica o que precede como
"claramente uma ameaça à Nação."
Ainda no raciocínio do Estadão, "conforme se considere o estado
psicológico de Bolsonaro e de seus filhos, a ameaça pode ser o tsunami de uma renúncia ou o tsunami de um golpe de Estado em preparação". Com o efeito, no
dizer do editorialista do Estado, "o presidente não apenas distribuíu o
texto, como mandou seu porta-voz dizer que, embora esteja 'colocando todo o meu
esforço para governar o Brasil' , a mudança~na forma de governar não agrada
àqueles grupos que no passado se beneficiavam das relações pouco republicanas."
Mas ainda de acordo
com o jornal paulista, Bolsonaro "fez um apelo às ruas: "Quero contar
com a sociedade para juntos revertermos essa situação" - e,adianta o Estadão "já no próximo dia 26 está
prevista a realização de uma
manifestação bolsonarista, contra ministros do Supremo Tribunal Federal e a
favor do pacote anticrime do ministro da Justiça, Sérgio Moro."
E após tais
considerações, assim se conclui o editorial de O Estado de S. Paulo:"Ao
contar com a sociedade, para enfrentar o 'sistema', Bolsonaro repete o roteiro
de outros governantes que, despreparados para a vida democrática - em que a
vontade do presidente é limitada por freios e contrapesos institucionais -
flertaram com golpes em nome da 'salvação' nacional. Se tudo isso não passar de
mais um devaneio, já será bastante ruim para um país que mergulha cada vez mais
na crise,que tem seu fulcro não nas misteriosas "corporações" - as
suas "forças ocultas" -, mas na incapacidade do presidente de
governar."
( Fonte: O Estado de S. Paulo )
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