terça-feira, 4 de setembro de 2018

Ao Deus Dará


                              

          Dado o tratamento dispensado à conservação do Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista, Rio de Janeiro, restarão acaso dúvidas sobre a qualidade política dos diversos governos republicanos sobre a preservação de bens nacionais?
             E não me refiro decerto às promessas feitas sob o látego de mais um desastre anunciado.
             E logo ao Museu Nacional, de que a história guarda a torpe maneira com que foi despachado o segundo imperador, que descera a serra pensando ainda valer-se da habilidade política do Conselheiro Saraiva, para ao invés ser mandado às carreiras para o exílio, como se fora alguma potestade de Latino America?
              Aos povos que não sabem preservar as instituições, sejam políticas, sejam culturais, está reservada a servida humilhação de prato frio da própria ignara estupidez da prolongada desatenção aos bens e aos monumentos nacionais.
               Em meio às lágrimas de crocodilo dos poderosos da hora, resta à gente brasileira deplorar a própria desventura, ao ver-se fustigada a respectiva herança por mais um sinistro que costuma ser cruel e impiedoso?
                  Queimadas as cortinas, então se desvenda a fieira de avaras e torpes  recusas, quando sob o empurrão da verdade se desvenda a nossa cultura do Deus Dará, que é a um tempo torpe o bastante para ignorar a ameaça dos acidentes da sorte, que se costuma reservar àqueles que mal entendem os monumentos que se acham sob a própria guarda?
                   Na dança das verbas se desnuda a estúpida inação do Deus dará. As entidades defensoras dos bens culturais nada fazem por preservá-los.
                     A crueldade dos incêndios é fenômeno que só a crassa estupidez de nada fazer pela preservação dos bens que o passado nos lega torna possível, negando por uma nomeação aqui, e por outra acolá, a indispensável proteção ao insubstituível bem cultural  que os nossos maiores criaram e, por conseguinte, passaram ao futuro a responsabilidade da preservação.
                      Para cada protegido, por um lado, e para todo dispêndio do presente, se recomenda às autoridades da hora que cuidem de proteger os monumentos do passado. Ao ignorá-los, o responsável da hora corre não pequeno risco, ao mostrar-se o bastante estúpido para não cuidar de herança que, se parece nos cair do céu, tem o peso das passadas gerações, que tiveram seja o valor, seja a sorte de levantá-las.
                        Aos povos que têm a desculpa para todos os sinistros na ponta da língua, resta o dúbio consolo do alheio menosprezo, por não serem sequer capazes de preservar os monumentos da própria nacionalidade.              

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