Doris (2)
Não estranhou o quartinho. Era apertado, mas tinha janela de basculante pra área, cama-patente junto da parede, estante com três tábuas no fundo e um caixotinho, que podia servir de mesinha.
Do lado da área, viu o banheiro e tanque. Pra quem já dormira em barracos cheios de rachas, buracos, o chão de terra, bichos entrando e até ratos nada a reclamar...
Sentada no colchão, pensava na roupa de cama que a dona daria para ela.
Esquisito que não tivesse falado com ela, pra dizer das condições e tal. A Genoveva, que não era de muita conversa, cortara logo o papo, quando perguntou o que devia fazer.
“Não esquenta menina. A seu tempo, a patroa vai te dar as instruções.”
Só isto e mais nada ela disse.
Então, achou melhor esperar.
*
Passam as horas. Bate o cansaço. Recosta, então, a cabeça na trouxa e se espicha no catre. Tenciona descansar só um pouquinho, enquanto a dona não vem...
Mas a correria dos últimos dias, a incerteza da mudança, a longa viagem só com uma xícara de café preto a empurram para sono pesado, que de tão profundo a patroa custa a despertá-la, quando, pela tardinha, afinal aparece.
“ Ó menina, acorda!”
Devagar, ela se senta na borda da cama. Por instantes, confusa, não atina aonde está.
“Hmm, vejo que por fim acordou... Isso é lá hora de dormir ?”
“ Ué, tava cansada, a senhora não veio falar comigo...”
“ Calma, menina, que na minha casa cuido eu do compasso da música.”
Doris a encarou com a expressão vazia de quem não compreendeu.
Então Sonia a pegou pelo braço. Na cozinha, mostrou o lugar das panelas,dos pratos, talheres. Depois, em tom monocórdio, continuou com os mantimentos, temperos, como guardar os alimentos, a manteiga, o queijo, os refrigerantes e bebidas na geladeira...
“ Você está me seguindo, Doris ?”
“ Como, patroa ?”
“ Você tá me entendendo ou não ?”
“ Mais ou menos, patroa.”
“ O que é isso ! Tou te falando em português, ora essa!”
“ É que é muita coisa nova, patroa...”
“ Tou vendo que não entende patavina de cozinha, não é ?”
“ Tou aqui, patroa, pronta pra aprender.”
Sonia suspirou fundo. Depois, a fitou nos olhos.
“ Doris, me diz, o quê que você sabe cozinhar ?”
“ Um pouco, lá eu sei, patroa.”
“ Um pouco ou muito pouco ?”
“ Muito pouco.”
*
terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
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