sábado, 28 de outubro de 2017

Peso de Xi Jinping

                                  

         Semelha algo prematuro tentar-se avaliação da eventual importância política de Xi Jinping.
         Sem embargo, o  19º Congresso do Partido Comunista da China o põe no mesmo nível de Mao e Deng. Colocá-lo em vida em tal posição o igualaria ao seu admirado Mao, eis que Deng só foi lá posto depois de morto, embora tal se deva neste caso a que o Congresso para tanto só se realizou depois da passagem de Deng.
         É notória a relatividade de tais conceitos coletivos. Embora desde o advento da Revolução Vermelha e a expulsão do Kuo-mintang de Ciang Kai-chek, o regime autoritário tenha prevalecido sempre - alguns lampejos de liberdade só foram entrevistos no período em que Deng tinha como seu principal auxiliar a Zhao Ziyang (e todos sabemos como acabou, no massacre de Tiananmen) - a presença preponderante de Mao por trinta anos, e as suas 'revoluções internas' foram a personificação da anomia na RPC.  
          A instabilidade política na China só seria superada com o afastamento definitivo da viúva de Mao e de seu grupo, já na década de setenta, por Deng Xiaoping. Começam, dessarte, os anos de Deng, com a restauração da economia chinesa e de outras iniciativas políticas e econômicas, assinaladas pela abertura da RPC à economia mundial,  com importantes medidas econômicas e políticas, em que Zhao Ziyang figurou como virtual vice de Deng, com grande êxito a princípio, até que cesse em fins de maio a influência política de Zhao por força das circunstâncias já conhecidas.
           Já era demasiado conhecida a admiração de Xi Jinping no que tange a Mao. Xi, no entanto, ao assumir o poder não adotou o estilo de Mao.
           O seu referido culto pela figura carismática do principal líder comunista chinês no século passado já pode ser visto delinear-se claramente desde a sua assunção e agora com medidas em que algo do estilo maoista reponta. Ao invés de seus regrados antecessores - na fase burocrática pós-Deng - Xi, além de não fazer segredo acerca das respectivas preferências políticas, se dissocia de forma marcante do estilo burocrático dos demais líderes que sucederem a Deng,  entre os quais  o seu imediato antecessor Hu Jintao. Para que não se tenha dúvida de que o estilo maoista está parcialmente de retorno,  este Congresso não lhe colocou qualquer limite temporal ao exercício do respectivo poder, a "nova era" que ora se inicia.
              Com a frieza que caracteriza tais líderes, não trepidou em livrar-se do fiel auxiliar que lhe fora instrumental no combate à corrupção na China, que representou um problema de peso nos períodos dos demais líderes burocráticos que sucederam a Deng Xiaoping. Com efeito, Wang Qishan, com sessenta e nove anos, fora a éminence grise do grande chefe em termos de investida contra a corrupção (e da manutenção da disciplina no PCC).  Esperava-se que Wang permanecesse em alguma posição de relevância, mas o silêncio a respeito não semelha trazer indicações de sua eventual permanência.
               Assim como tantas outras figuras autoritárias do comunismo, Xi tem especial predileção pelos discursos-rio. Como já assinalara, um de seus predecessores - na fase burocrática da liderança chinesa - Jiang Zemin daria aos fotógrafos do Congresso a oportunidade cruel de rasgar-lhe o incontrolado bocejo diante do discurso interminável  de  Xi Jinping para o ávido público internacional.
                 Xi, portanto, corroborou durante o seu primeiro quinquenio muitas indicações anteriores: a sua força política própria, o que o distingue dos antecessores, em um período essencialmente de índole burocrática, que o separa de Deng Xiaoping; a sua admiração por Mao Zedong, o que mostra o seu veio doutrinário comunista, além do pendor para o autoritarismo.
                  Sendo formal, controlado, é difícil que se diferencie dos líderes autoritários que o precederam no passado.
                 Cessa, portanto, a fase dos líderes que chamei burocráticos, cuja autoridade não se pode comparar com a de Deng. Xi sai do Congresso também com a perspectiva de mais do mesmo em termos da patética presença feminina nos órgãos diretivos da China. Sofre também a liberdade, com o envolvimento sempre sufocante do Partido Comunista da China, as ambições imperialistas que se refletem nas ilhas artificiais que ameaçam povoar os ditos mares do Sul da China, e a continuada presença do obscurantismo - lembram-se do pobre Liu Xiaobo, Prêmio Nobel, que foi deixado morrer em hospital interiorano da China, há tão pouco tempo, e que padecera onze anos de prisão pelo crime de propor um regime constitucional para a China, cousa que a Imperatriz Cixi (1835-1908) já outorgara ao Império chinês nos princípios do século XX ? E que dizer da viúva de Liu XiaoboLiu Xia,  há onze anos em prisão domiciliar?


(Fontes:  Empress Dowager Cixi, de Jung Chang; Prisoner of the State - The Secret Journal of Premier Zhao Ziyang; O Estado de S. Paulo; The New York Times)

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