quinta-feira, 1 de setembro de 2016

O Golpe Final

                                    

       Para quem falou tanto de golpe, como o Partido dos Trabalhadores, assim como a própria Dilma, será com naturalidade que, graças a um conjunto supostamente feliz de circunstâncias, a minoria no Senado cuidou de apresentar medida de exceção, diante da sentida inevitabilidade da condenação.
       Com efeito, a Constituição determina que o mandatário condenado pelo Senado por impeachment, tenha automaticamente suspensos os direitos políticos por oito anos, não podendo inclusive ser contratado para cargos públicos.
       Dada a arrolada e verificada gravidade das causas do impeachment, esta disposição adicional não foi prevista em requinte de crueldade suplementar do legislador. É curial que a ré deveria ser afastada igualmente no que concerne à inabilitação provisória para a vida pública.
       Essa 'bondade', outorgada para a presidente cassada, se deveu, não só ao apoio do PT e dos demais partidos da aliança, mas sobretudo ao presidente da sessão, Ministro Ricardo Lewandowski.  Como refere oportunamente Merval Pereira, o presidente do STF "revelando afinal sua benevolência com a 'presidenta' que transformou o documento de pronúncia em uma 'proposição', que é sujeita a destaques de votação. Sendo assim, foi vitoriosa a proposta de separar do texto principal a punição acessória de inabilitação, que acabou sendo recusada."
       Como se verifica, portanto, o fatiamento - que ora parece  estar em moda - poderia ser encarado como meio seguro de contornar a severidade da legislação.
        Contudo, não é à toa que, na disposição constitucional, consta tal exigência suplementar. Ela aí está inserida pelo simples motivo que a cassação, sendo reservada aos altos cargos, afigura-se por conseguinte necessário que a sua influência seja cerceada por algum tempo prudencial, para evitar a aglutinação de um núcleo contrário ao interesse público. Trata-se de criar a proteção necessária para que o fator havido por desagregador (e por isso cassado) fique impedido de obstaculizar por um tempo apropriado as forças políticas que prevaleceram (no que se presume seja pelo interesse público).
        Concordando em fatiar a norma constitucional, dando ao Senado a oportunidade de tratá-la como se fora matéria ordinária, não foi decerto pequena a gentileza prestada pelo presidente Ricardo Lewandowski.
         O precedente é grave. Conhecer de tal recurso - excluída a eventual simpatia do presidente Lewandowski (em outras questões tão estrito na afirmação das próprias limitações processuais, enquanto presidente da sessão) não é coisa de somenos e poderia inclusive merecer de quem de direito a conhecida ADI (ação direta de inconstitucionalidade) para a qual o Supremo deverá proporcionar a atenção devida.
        Com efeito, não é decerto todo dia em que uma assembleia, mesmo com a hierarquia do Senado Federal, inventa um rito deveras especial para derrogar disposição constitucional.
         No entanto, forçoso será reconhecer que a matéria é controversa. Mestre Joaquim Falcão, no Globo de hoje, "Lewandowski plantou a dúvida" assevera notadamente: "Ninguém pode dizer  qual será a decisão do Supremo. Ela é, por natureza, incerta. É justamente na gestão da incerteza política, ou A ou B, que reside seu poder. O Supremo assim se aumenta. Ele é hoje o gestor das incertezas nacionais.Até quando? (...) O bom senso sugere que as instituições tomem decisões que colaborem  para a manutenção de seu próprio poder. Dificilmente o Supremo tomara decisão que anule o impedimento de Dilma. (...) Colocaria em dúvida sua própria legitimidade. É ônus pesado demais. Mas ninguém garante o bom senso."


( Fontes: Joaquim Falcão, O Globo, Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo )

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