Há certas coisas difíceis de entender em termos de política externa, de parte do governo Lula da Silva. Dentre elas, a relação amistosa – com visita presidencial marcada para maio p.f. – com o regime dos ayatollahs em Teerã.
Difícil de entender diante de um governo oriundo de eleições manifestamente fraudulentas, e que desde muito ultrapassou a defunta monarquia Pahlevi em matéria de opressão. Pois o regime iraniano – em que a presença dos chamados Guardas da Revolução (o exército) se torna sempre mais evidente – veste os trajes sombrios das mais hediondas tiranias.
Já em 2009 foram computadas pelo menos 388 execuções, sendo 112 nas oito semanas após as ‘eleições’ presidenciais de 12 de junho. Assinale-se que os cômputos de Amnesty International se cingem às penas capitais ditas oficiais, não sendo obviamente incluídas as pessoas mortas pela tortura e nos calabouços da ditadura.
No regime clérico-castrense de Teerã, corrupção e opressão se dão despejadamente as mãos. Em paroxismo da intentada intimidação, manda seus esbirros apreender simples manifestantes de passeatas, e que as masmorras transformam em ‘inimigos de Deus’ prontos para o sacrifício, chegando muitos a serem enforcados em praça pública.
As imagens de infelizes pendurados em cadafalsos de Shiraz nos parecem transportar para despotismos da noite dos tempos, quando, em verdade, refletem a obnóxia realidade de ditadura supostamente moderna. E tais visões dizem desafortunadamente muito mais do que os discursos do inexorável e inelutável progresso do homem no caminho de um futuro sempre mais radioso e promissor.
Em um mundo onde ainda pululam os autocratas, os tiranos e os que mal disfarçam a ânsia de empolgar o poder inconteste – e haverá continente que deles esteja realmente liberto ? – mais do que espanta, indigna e conturba o deslavado cinismo de Lula e seus pressurosos consortes nas suas mesuras para com os representantes do regime dos ayatollahs.
A par da discrepância com a posição do Ocidente no que tange à política nuclear de Teerã, a persistência da Administração de Lula em continuar a associar-se com um pária internacional, ao apertar-se o cerco dos Estados Unidos contra o Irã, faz pairarem nuvens sobre as relações empresariais entre Petrobrás e sua congênere iraniana.
A perplexidade aumenta defronte da vindoura Missão de empresários, encabeçada pelo Ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, que além do Egito e do Líbano, tenciona visitar o Irã.
É de notar-se que, desde o governo Fernando Collor, se fala sobre as róseas perspectivas do intercâmbio com Teerã. Quanto aos resultados desse propósito, a única coisa que perdura é o incompreensível otimismo.
Por sua vez, o Presidente Barack Obama se movimenta em duas frentes no que tange ao regime dos ayatollahs. Propõe-se incrementar as pressões para que o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprove novo pacote de sanções econômicas, e, igualmente, no Congresso estadunidense se discute legislação que imponha sanções internas a empresas que mantenham negócios com Teerã (inclusive com os Guardas Revolucionários, cujo gosto pela atividade econômica tem crescido deveras ultimamente).
Nesse contexto, a Petrobrás, apesar dos desmentidos oficiais, pode ser visada, eis que mantém escritório na capital do Irã. Assinale-se que, a despeito de ser grande produtor de petróleo, o Irã não tem capacidade de refino para atender ao consumo interno, carecendo importar pelo menos 40% do total.
Por sua própria escolha, o desenvolto Zelig se encaminha para insidiosa encruzilhada. Os personagens camaleônicos neste mundo global se deparam com existência sempre mais difícil, na sua crença espertalhona de adequar a própria imagem às diversas situações.
Nas várias culturas há expressões em que se marca a entrada em cena da verdade. Entre nós, é costume referir à hora da onça beber água. Para alguns pode tardar, mas acaba sempre acontecendo.
( Fonte: O Globo )
quarta-feira, 31 de março de 2010
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