quarta-feira, 24 de março de 2010

A Censura como ferramenta das Ditaduras

Venezuela: dois pesos e duas medidas

O coronel falastrão Hugo Chávez se serve sem cerimônia da faculdade de falar através de televisão e rádio aos seus concidadãos. Ao contrário das democracias, em que os discursos dos presidentes são reservados às grandes ocasiões, com a eventual exceção de curta alocução radiofônica semanal, o caudilho venezuelano costuma ter programas de mais de hora com ‘conversas’ com o povo de seu país. Por outro lado, mediante o artifício das chamadas “cadeias nacionais”, que se repetem com farsesca frequência, todas as estações, inclusive as de cabo são obrigadas a integrar-se na grande corrente chavista.
Se o direito de falar ao eleitorado se afigura praticamente irrestrito para o presidente bolivariano, estarão mui equivocadas as personalidades políticas que, porventura, julgarem que dispõem de direito recíproco.
Acaba de acontecer naquele país mais uma demonstração do cerceamento da liberdade de expressão, que é tão característica dos regimes ditatoriais. O ex-governador do Estado de Zulia e ex-candidato à presidência da república, Oswaldo Álvarez Paz se tornou, a partir da madrugada de segunda-feira, 22 de março, mais um preso político nos domínios do coronel Chávez Frias.
Em um programa de Globovisión, o único canal de livre opinião ainda remanescente na república bolivariana, ao ensejo de entrevista, reportou-se ele a investigações divulgadas na Espanha (e referidas por este blog), que apontam membros da comunidade de inteligência venezuelana de estarem envolvidos no treinamento de guerrilheiros das Farc (Colômbia) e do grupo terrorista Eta, da região basca.
Segundo Álvarez Paz, o regime chavista possui relações com estruturas internacionais que servem ao narcotráfico (Farc e Eta). Por causa disso, o Ministério Público o indiciou por conspiração, incitação ao ódio e difusão de informação falsa (pena de oito a dezesseis anos de reclusão), e o Judiciário, que é também alinhado com o regime, determinou a prisão do ex-candidato governador e ex-candidato a presidente.
Chávez rechaçou de plano pedido do presidente do conselho espanhol, José Luis Zapatero, com a afirmação: “não damos apoio a nenhum grupo terrorista”.
Álvarez Paz continua detido na sede do Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin) e deverá apresentar-se hoje, em audiência, para apresentar em tribunal de Caracas a sua defesa.
Apesar da Carta Democrática da OEA, a vetusta organização até hoje não se animou a contestar os títulos democráticos do regime do coronel Chávez . Entrementes, outro recurso que acusa o presidente bolivariano de pôr em risco a liberdade de expressão, foi dirigido à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), pelo Presidente do Conselho Nacional de Jornalistas (CNP), da Venezuela. Servirá para algo ?

O Contencioso Google – República Popular da China.

A contradição na China entre duas faces da liberdade - a política (censurada) e a econômica (livre, segundo as leis do mercado) – é, como se sabe, direta consequência do afastamento do então Secretário-Geral do Partido, Zhao Ziyang, por ordem do octogenário Deng Xiaoping. Em maio de 1989, Deng optou pela imposição da lei marcial, na linha sugerida pelo Premier Li Peng. A sucessiva tragédia na praça Tiananmen mostrou ao mundo o que implicava tal fatídica opção.
Colocadas as bases burocrático-autoritárias do regime chinês, em que os líderes têm mandato quinquenal, passível de uma reeleição, a receita preconizada por Deng, de liberdade econômica e absoluto controle do partido, ora restrito à faixa do poder político, tem sido aplicada com evidente êxito em termos de crescimento do PIB. Com efeito, a RPC está posicionada para ultrapassar em breve a economia japonesa, passando a ocupar o segundo lugar, inferior apenas à superpotência.
O conflito entre Google e o governo chinês, diante da decisão da multinacional de não mais conformar-se à censura na internet, evoluíu nos ultimos dias com o redirecionamento de seus milhões de usuários continentais para o site em Hong Kong.
No entanto, essa tentativa de Google de contornar a censura de Beijing através do site de Hong Kong – em que vige a democracia, por força das características do antigo território da Coroa britânica e das condições que presidiram à sua transferência para a China – não parece estar surtindo os efeitos desejados. Desrespeitando a liberdade do território de Hong Kong, as autoridades chinesas se valem da chamada muralha de fogo na internet, fazendo com que os consulentes não logrem acessar o site da Google.
A contraofensiva chinesa se subdivide em dois planos: defronte do redirecionamento de milhões de usuários chineses continentais para o seu site em Hong Kong, de imediato as operações da Google que permaneceram na RPC passaram a ser pressionadas, não só por parceiros comerciais chineses, mas também pelo próprio governo de Beijing.
Dessarte, China Mobile, a maior companhia chinesa de celular, estaria prestes a cancelar um acordo que coloca o sistema de procura da Google na ‘home page’ de seu celular (o qual é empregado por milhões de chineses diariamente). Por outro lado, a segunda maior operadora de celular na RPC, China Unicom, estaria considerando adiar ou abandonar a sua iminente introdução de aparelho celular baseado na plataforma Android da Google.
Existe, outrossim, a possibilidade de ações ainda mais drásticas de parte das autoridades, como o fechamento do serviço dessa companhia de acesso à internet chinesa, seja pelo bloqueio do acesso ao endereço continental da Google na RPC, google.cn, ou para seu site em Hong Kong, google.com.hk
Como assinala o comentário inicial do International Herald Tribune, nesta luta, tanto o governo chinês, quanto Google – duas forças dominantes no mundo moderno – se arriscam a perder prestígio (lose face), dinheiro e poder.
A escolha do autoritarismo como solução – que pareceu natural a Deng, um comunista da velha escolha – pode, na verdade, acirrar contradições e, ironicamente, tornar-se um fator complicador de inimaginável potencialidade.

( Fontes: O Globo e International Herald Tribune)

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