O juiz Baltasar Garzón, pela sua ação meritória, tem sido referido, e em várias oportunidades, por este blog. Desta feita, no entanto, se uma vez mais ele se torna o objeto principal do comentário, há de intuir-se que preferiria não ter de postar este artigo.
O que seria inacreditável em qualquer outro país democrático, agora está ocorrendo na Espanha. Em uma reversão de papéis, que mais pareceria artifício novelesco em outros cenários, o corajoso juiz que tanto se assinalou no direito penal, ora enfrenta processo que lhe é movido por várias associações direitistas, e que para espanto de muitos está tomando rumo assaz desfavorável a Garzón.
Não será o juiz Baltasar Garzón o primeiro a ser perseguido não por alegados erros ou faltas, mas pelas suas qualidades. No que lhe concerne especificamente, pelo próprio esforço de que sejam julgados os crimes do franquismo contra a Humanidade.
O andamento da ação contra Garzón mostra a influência da direita – e das tendências franquistas – na Justiça espanhola. A tal propósito, semelha bastante ilustrativa a declaração de diretor da ONG Human Rights Watch, José Miguel Vivanco: “ Os tribunais espanhóis rotineiramente fracassam na investigação de alegações de horrendos crimes do passado, mas estão sendo surpreendentemente ativos em perseguir (prosecuting) um juiz que se empenhou em que sejam responsabilizados os envolvidos.”
O Primeiro Ministro José Luis Rodriguez Zapatero defendeu publicamente o juiz Garzón. Nesse sentido, autoridades governamentais apoiaram a solicitação deste magistrado, que a ação fosse tornada sem efeito.
Em vão. Apesar de o principal jornal espanhol, El País, definir como ‘acosso judicial’ o processo contra Garzón, a sua tramitação na justiça espanhola continua a avançar e não em favor de célebre juiz que indiciou Pinochet e investiga os terroristas do ETA.
A Suprema Corte espanhola, através de câmara de cinco membros, decidiu contra o apelo de Garzón para que a ação que lhe é movida seja arquivada. Os juízes não viram impedimento legal ou processual para a continuação da ação.
O caso volta para o juiz Luciano Varela da Suprema Corte. Tendo a cargo a investigação de Garzón, compete a Varela determinar se cabe a acusação. Embora a matéria esteja pendente, já em fevereiro Varela dissera que Garzón “conscientemente decidira ignorar ou contornar” a anistia promulgada em 1977 dos crimes cometidos na ditadura de Francisco Franco. A posição do juiz Garzón é a de que a anistia não se aplica aos crimes contra a Humanidade.
Se o magistrado Luciano Varela manifestar-se pelo indiciamento, Baltasar Garzón será automaticamente suspenso de suas funções.
Importa ter presente que Garzón ainda tem abertas opções de recurso, mas diante do surpreendente andamento desse estranho processo, a sua margem de atuação judiciária se vai estreitando progressivamente.
Com a conivência de muitos, a direita pode até vencer nesta ação (há ainda outra similar pendente de julgamento). A sua vantagem será no entanto provisória, porque é uma construção fundada em artifícios e vinganças burocráticas.
Mais cedo ou mais tarde, Baltasar Garzón prevalecerá. Sobre as liliputianas hostes que hoje intentam manietá-lo, para que os crimes do franquismo continuem soterrados, assim como suas tantas vítimas.
(Fonte: International Herald Tribune)
sábado, 27 de março de 2010
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