De acordo com estimativa do Banco Central, o balanço de pagamentos do Brasil será deficitário em 2010. O rombo previsto está orçado em 49 bilhões de dólares.
Não é pouca coisa. Para chegar a tal cômputo, o Banco Central se baseia, entre outros elementos, no deficit de fevereiro p.p., que foi de US$3,3 bilhões no balanço de transações correntes (o resultante da balança comercial mais o balanço de serviços e rendas). Esse resultado mensal negativo foi o pior do mês, desde 1947, quando se iniciou a série estatística organizada pelo B.C.
Desde 2007, em que se registrou o último saldo positivo do balanço de transações correntes (apenas US$ 1,6 bilhão), as nossas contas com o exterior assinalam acentuado viés negativo.
Isto se deve notadamente à depreciação do dólar estadunidense, em relação ao real. O fato de o Brasil dispor de moeda apreciada quanto à principal divisa internacional, se representa dado positivo para o mercado externo, repercute negativamente na balança comercial, eis que (a) aumenta o preço em dólar de nossos produtos exportáveis e (b) barateia a cotação em moeda nacional na aquisição de bens e serviços.
Em outras palavras, encarecendo as nossas exportações, as torna menos competitivas, e, por conseguinte, tende a reduzi-las. Por sua vez, barateando as importações, o efeito sobre elas será inverso, pois as fará crescer. Por certo, não se limita a esse aspecto a sua contribuição para o incremento das despesas, eis que a depreciação relativa do dólar torna igualmente mais atraente o turismo, com a consequente pressão sobre o ítem ‘invisíveis’, e o resultante desequilíbrio no balanço de bens e serviços.
Certamente não é por acaso que a República Popular da China, mantendo artificialmente baixa a cotação do yuan renmimbi, vem coletando enormes superavits em sua balança comercial. Tampouco surpreende que os Estados Unidos venham gestionando com crescente insistência a adequação da moeda chinesa a níveis reais de mercado, de forma a diminuir a artificial vantagem usufruída pela RPC no intercâmbio com a superpotência.[1]
Há um outro dado nas previsões do B.C. que tende a tornar ainda menos favoráveis as perspectivas relacionadas com o deficit de US$ 49 bilhões. É que igualmente se antecipam investimentos estrangeiros no montante de US$ 45 bilhões durante o ano de 2010. Se as inversões estrangeiras são altas – praticamente equivalentes ao nível máximo atingido em 2008 – US$45,1 bilhões – tal montante não é suficiente para equilibrar as transações correntes.
Assim, haverá saldo negativo de US$ 4 bilhões – sempre se nos ativermos às estimativas referidas – em que o Brasil dependerá de empréstimos do setor financeiro, além de outros recursos do mercado de capitais para equilibrar a conta, o que, e é bom que se frise, não acontece desde 2001.
Esta eventual contingência de o Brasil achar-se a descoberto para realizar a indispensável equalização dos balanços terá, é verdade, importância relativa bastante inferior àquela verificada no começo da presente década. Com efeito, se em 2001, o resultado das transações correntes representava 65% de nossas reservas internacionais, o total projetado para 2010 corresponderia a 20% dessas reservas.
Tal diferença sublinha a considerável melhora na posição economico-financeira do Brasil. Sem embargo, o que preocupa no caso presente, é a tendência declinante de nossos saldos na balança comercial e o incremento da pressão deficitária na balanço de serviços e rendas. Os resultantes deficits na balança de transações correntes vinham sendo mascarados pelos investimentos estrangeiros e pelas entradas de capital de risco.
É um sinal de alerta em nossos dados macroeconômicos, a que se deve atribuir atenção maior do que aquela até o momento evidenciada pela mídia.
( Fonte: Folha de S. Paulo )
[1] Não é ocioso indicar que a China, em função desse desequilíbrio que lhe favorece na balança bilateral de comércio com os EUA, passou a ser a principal credora (em trilhões de dólares) de Washington.
quinta-feira, 25 de março de 2010
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