quinta-feira, 4 de março de 2010

CIDADE NUA ( II )

Doris (11)

“ Epa, menina ! O que é que ‘cê tá querendo ?”
Tangida pela calentura, Doris se metera debaixo da barraca atrás de um pouco de sombra. O abrigo, apesar de grande, pelo seu formato circular, não dava espaço que não estorvasse a movimentação das pessoas.
“ Ah, moça!... Não posso ficar mais no sol... veja que vermelhão na minha pele... vim pra cá branca desse jeito, sem protetor, sem barraca...”
Na fisionomia curtida da dona do abrigo, entreviu um leve sorriso.
“ Até aí eu já cheguei, ô menina. Se ‘cê tem dinheiro, tenho tudo que precisa...”
“ Moça, preciso da sua compreensão...”
“ Olha, menina, compreensão, isso eu não tenho pra vender !”
“ Será que a senhora me podia dar uma ajuda... eu prometo que reponho...”
“ Lamento, menina, mas se fosse trabalhar na base da caridade, o dinheiro não me levava nem até o meio da semana...”
“ Dona, pelo amor de Deus ! Me deixa pelo menos ficar onde estou, aqui não incomodo ninguém...”
“ Nem pensar ! por favor, vamos circulando...”
“ Moça, por favor !!”
“ Quer que eu chame o meu ajudante ?”
Apesar do desespero, Doris viu que a mulher não cederia. Sem pressa, tirou o vestido do saco. Ajeitou-lhe os panos sobre os ombros, procurando recobrir no que podia as costas. Não sabia ainda o que fazer. Não tinha dúvidas porém de que na praia, naquelas condições, não mais podia ficar. Estava sendo assada viva. Tinha mesmo a impressão de que os raios do sol a atacavam por todos os lados e não só de cima. Por reflexo e até nas passadas pelas areias escaldantes, o calor abrasador a perseguia.
Por isso, Doris correu com o ânimo que lhe restava na direção da calçada. Lembrada do guarda simpático, investiu em diagonal pelo tórrido espaço de areias ardentes a queimar-lhe a planta dos pés, na desabalada corrida até o posto, só pensando nos momentos em que refrescaria a cabeça com as águas da torneira.
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