A direita na Europa, nunca à vontade sob a
liderança de Ângela Merkel,
conseguirá livrar-se da firme, avuncular, corajosa Frau Merkel, diante da
ameaça do crescimento da direita e da intolerância nas relações humanas?
Aparentemente, o desafio colocado
pela União Cristã Social, de Horst
Seehofer seria apenas resultante do temor excessivo diante da ameaça
colocada pela dita Alternativa para a
Alemanha, que ressurgiu no verão passado, sob o inesperado empurrão da
penada da Merkel, corajosamente contrariando a covardia de rigueur de tantos
líderes, e abrindo, com incômodo estrépito, para os refugiados da guerra na
Síria os portões das aduanas germânicas.
Cerca de um
milhão de infelizes, escorraçados pelo tirano Bashar al-Assad, salvo não de Sunset
Boulevard, como para onde os áugures da imprensa já se apressavam em
despachá-lo, mas por gospodin Vladimir Putin, que o recebeu em
audiência no Kremlin, e com a habitual frieza soube entrever o quão proveitoso
lhe seria salvá-lo da estrada para o Tribunal Penal Internacional (TPI).
Com efeito, a secular busca pela
Rússia dos mares de águas quentes seria afinal satisfeita, com as bases russas
bem plantadas na Ásia ocidental, em terras de al-Assad, que in extremis lhe
suplicava a vassalagem. A partir de então, sobre a indômita revolução
síria cresceram as sombras da tirania, máxime quando Barack Obama responderia
com um não a proposta de Hillary Clinton, então Secretária de
Estado, de que fosse dado à revolução síria um apoio mais efetivo do que o
prestado até então. Pelas indecisões estadunidenses, o estandarte contra a
feroz ditadura de Assad já não contava com o apoio de antes. Hillary, apoiada por todos os chefes de
secretarias americanas com participação naquela luta infinda contra a infame
ditadura dos al-Assad, propunha que a
liga dos partisans tivesse o apoio dos Estados Unidos, apoio este que não se refletiria em mandar para aquelas velhas
terras soldados de Tio Sam.
Para quem movia por tantos anos uma campanha expedicionária contra o taliban
no Afeganistão, com as perdas inelutáveis de G.I.s, haveria de surpreender que
o Presidente Obama não haja mostrado qualquer entusiasmo pela sugestão de seus
Chefes de Departamento, com competência na matéria, a que Hillary, sua
Secretária de Estado, encabeçava.
Por essa razão, a sua companheira de partido, e que na campanha
eleitoral de 2008 lhe fora forte concorrente, mas que, quando se abria a
Convenção Democrata, contrariando o que lhe sugeria o marido, o ex-Presidente
Bill Clinton, renunciou a nela adentrar como candidata à Presidência, por
estimar que dividiria o Partido Democrata, e prejudicaria a campanha de Obama.
Teve ela naquela oportunidade a nobreza de enjeitar até mesmo os apelos de seu
devotado esposo.
São difíceis de determinar os motivos porque Obama negaria mais tarde a proposta, ratificada por todos os seus
chefes com competência na matéria, de uma coordenação da capacidade americana
não de entrar no atoleiro sírio, mas de reforçar aqueles que combatiam por uma
Síria livre da infame ditadura dos Assad.
Tanta prudência em negar apoio a quem se batia, em desigualdade de
condições, contra o tirano Assad, fará parte das interrogações da História, e
dos males que se teria podido evitar - e sequer surgira no horizonte a
carantonha horrenda do Exército Islâmico. Ter presente que a dita aliança dos
Chefes de Departamento, a que a Secretária de Estado Hilllary Clinton encabeçava, combateria a infame Santa
Aliança, que a redesperta cobiça do
Senhor do Kremlin saberia empregar a bom termo.
Em trabalho meu sobre a
Guerra Civil Síria, datado de 22 de fevereiro do corrente ano, reportei-me
ainda uma vez à sonora negativa de Barack Obama à solicitação da então
Chefe do Departamento de Estado, Hillary
Clinton, que, em próprio nome e no de todas as demais autoridades do
governo americano, com competência na matéria, ponderou ao 44º presidente "do
grande interesse estadunidense de apoiar
de todas as formas, excluído o envio de tropas americanas, os rebeldes na
Síria, que tinham o apoio da Liga Árabe e que defendiam nessa conflagração a
bandeira da democracia, e não a da ditadura."
Sem querer cansar o leitor, creio importante que se tenha presente essa
grande oportunidade de defender a causa da democracia - ou da maior liberdade, neste mundo, vasto mundo de
condicionamentos cruéis - que se busque recordar a fotografia de uma criança de
três anos de idade, refugiada ela também, trazida por pais igualmente nessa condição,
e cujo corpo se transforma em anti-monumento à crueldade estúpida daqueles que
se crêem poderosos. Por artes de tantos grandes
homens, alguns por fraqueza, e outros por crispada má-disposição, o seu corpo
inerme foi carregado pela mídia e, em um mundo empedernido e indiferente, tocou
a muitos pela sua inexpressa mensagem de uma paz que a colusão da tibieza e da
estupidez mal cobria e tornava a anti-imagem de um tempo desgraçado, que confrontará
em clamoroso silêncio, os poderosos de turno, então na balbúrdia da mídia, e
mais tarde nos desvãos da memória, que se tarda por vezes em contemplar a
inocência dos desgraçados e dos infelizes, cujas imagens jamais atingem os
poderosos de turno, nos seus pomposos gabinetes. Só muito mais tarde, quando o
bulício dos cortesãos e dos obsessivos do poder, será talvez dado o ensejo de
inteirar-se, quem sabe até conscientizar-se de quanto mal tenham feito, apenas
assinando despachos, e acreditando construir a própria imortalidade.
(Fontes: blogs
sobre a política americana e a guerra civil síria; Carlos Drummond de Andrade)
Nenhum comentário:
Postar um comentário