Nunca
o abuso do instrumento do impeachment
aparece tão claramente quão mostrado pela cínica manobra do presidente e do
ex-presidente dos círculos de liberdade
da Casa de Representantes, os Deputados Mark Meadows e Jim Jordan, da Carolina
do Norte e de Ohio, respectivamente,
acusando o Subprocurador-geral Rod
Rosenstein com base em cinco artigos
de impeachment (crimes e faltas
graves).
O
objetivo da manobra, como assinalado pelo editorial do Times, não é, na reali-dade, acerca da recusa de Rosenstein de
apresentar este ou aquele documento
relativo à investigação sobre os delitos da Rússia no que tange à campanha de
Hillary Clinton, mas sim em jogar algo suculento para os eleitores, por mais
falso e absurdo que seja.
Primo, o editorial faz um breve resumo
das estripolias de Meadows e
companhia: em 2015, Mr Meadows se tornou uma celebridade da noite para o dia,
quando entrou com resolução para derrubar John Boehner, o então Speaker.
A tentativa colou e Mr Boehner caíu.
As duas seguintes não tiveram o êxito da primeira: em 2016, os membros
do Círculo da Liberdade entraram com moção para forçar o impeachment do comissário do Imposto de Renda, John Koskinen; e no
último verão, entraram com peti-ção para que Obamacare (a reforma da saúde, de Obama) fosse rejeitada.
O intento de derrubar Rosenstein não aparenta ter
chance de sucesso. A par de Mr Jordan e
Mr Meadows, já citados, esse projeto tem
apenas o co-patrocínio de nove representantes. O próprio Trey Gowdy, o chefe do
comitê de supervisão, não evidenciou entusiasmo algum pela proposta.
Essa
tentativa tem tão pouca probabilidade de prosperar, que o Procurador-Geral Jeff Sessions houve por
bem não só defender o seu substituto, mas também sugerir que os legisladores
procurem utilizar melhor o tempo respectivo.E a democrata Sally Yates, que exerceu as
funções de Procurador-Geral substituta, e que, para a sua honra, foi exonerada por se recusar a defender a
proposta de Trump que cerrava o ingresso nos States de visitantes árabes, adverte pelo twitter acerca do prejuízo a longo prazo "de servir-se do Departamento
de Justiça como instrumento de teatro político".
É
de esperar-se que Sally Yates seja candidata na próxima eleição para uma
cadeira na Câmara - e até mesmo no Senado. Nesse contexto, é importante recordar
que Ms. Yates pôs para correr o Senador republicano pelo Texas, Ted Cruz, que
pensara humilhar a democrata em sessão de subcomitê judiciário do Senado, ao perguntar-lhe
sobre se conhecia a 8.USC Seção 1182. Ms. Yates a princípio disse que não, mas então o Senador pensando dar-lhe lição, leu um trecho do estatuto. Nessa ocasião, ela
surpreenderia Ted Cruz, no momento em
que o Senador pensava humilhá-la, ao recordar-lhe o instrumento legal que ela
se recusara a implementar, o que determinou a sua exoneração. Nesse momento,
Ms. Yates surpreenderia Cruz ao dizer-lhe que ela também conhecia o estatuto
legal. E acrescentou, para sua honra e
renome: "e estou também familiarizada com uma determinação adicional da Lei
sobre a Imigração e a Nacionalidade, que
reza que nenhuma pessoa receberá
tratamento preferencial ou será discriminada, na expedição do visto, por causa
de sua raça, nacionalidade ou lugar de nascimento, que, segundo creio, foi
promulgado depois do estatuto que o senhor acaba de citar".
Ms. Yates
acrescentou que, além do texto da Lei, ela tinha de julgar se o Decreto
executivo de Trump violava a Constituição dos Estados Unidos.
Escusado dizer que o video da resposta de Ms. Sally Yates se tornou uma
sensação na internet. Também será interessante assinalar que o Senador Ted
Cruz, republicano do Texas, não mais foi
visto naquela sessão do subcomitê...
Mas voltemos, ainda que por breve
instante, ao nível atual do Grand Old
Party. Parece importante
sublinhar que Trump não inventou a mensagem apocalíptica com que ganhou a base
republicana. Ele simplesmente a distilou até a própria essência. Assim não surpreende que a turma do Freedom Caucus procure deslegitimizar o
governo, que seria sempre o problema, e que todos os experts são idiotas (sic).
Tudo
leva, portanto, a supor, que, dado o nível dos membros do Freedom Caucus, o seu esforço em afastar Mr Rosenstein não possa
ser levado a sério. Dominado por gente tão intelectualmente limitada, esse
estranho objetivo do "Círculo da
Liberdade" mostra o baixo nível que tem caracterizado o GOP nos últimos anos. A podridão do
partido já existia antes que Mr Trump aparecesse para dela servir-se, e tudo
leva a crer que tal condição permanecerá mesmo depois que o presidente desça
pelo Sunset Boulevard que o espera...
(Fontes:
Transcrição da Junta editorial do New
York Times; quanto a Sally Yates, vide The New Yorker, May 29, 2017)
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