domingo, 31 de dezembro de 2017

Papa Francisco

                                        

        Os grandes inovadores da Igreja de Cristo não costumam ter a vida fácil e monótona reservada às mediocridades  e  àqueles que confundem a aparente vontade da Cúria romana ao sentir da maioria.
         Para ficarmos nos tempos modernos, bastaria, talvez, referir-nos a Angelo Giuseppe Roncalli, João XXIII, o  Papa Buono,  que trouxe o Concílio para uma Igreja demasiado afastada da modernidade e de seus desafios,  e à mais recente dádiva para a Religião católica e apostólica romana,  Jorge Mario Bergoglio, quem traria de novo a originalidade criadora na fé para a Igreja de Pedro, ao assumir o nome de um grande santo das gentes, Francisco, até então ignorado pelos seus antecessores, desde a Idade Média.
         Para que melhor entendamos o Papa do Concílio e o seu exemplo de bondade, abertura à modernidade, semelha importante traçar breve retrato desse grande inovador da Igreja de Cristo. Não são poucos os respectivos traços similares aos do atual Pontífice. Escolhido pela sua idade, como Papa de transição - depois do longo e formalista parêntese do papado de Papa  Eugenio Pacelli, Pio XII - Papa Giovanni traria realmente a transição para a Igreja. Mas não terá sido aquela em que muitos de seus eleitores pensaram - vendo a transição como a acomodação ou preparação para o advento de seu eventual sucessor, por conta da própria idade avançada (77 anos ao ser escolhido). Sem embargo, desde a sua resposta ao diácono quanto ao nome que escolheria como Papa - João - mostrou ao dizer Johanem que tinha outras ideias quanto à transição que pretendia promover. Ao tomar como nome o do apóstolo das gentes, João XXIII adumbrava que tinha em vista outra transição bem diversa daquela que proporcionaria um pontífice setuagenário, dobrado pelos achaques de velhice. Tampouco Papa Giovanni recuou diante desse nome que servira no passado longínquo a um anti-Papa, i.e. um pontífice cuja legitimidade fora invalidada pela Igreja.
         Não é, decerto, meu propósito estender-me sobre o pontificado desse grande Papa.  Outrossim, não terá sido por acaso que a sua bem-aventurança e santidade tanto tardaria a ser ratificada por seus sucessores, muitos deles da linha conservadora, que não mostraram pressa alguma na confirmação da própria beatitude e posterior canonização. Se o passar dos anos não apagara a memória do Papa do Concílio, o grande culto que lhe é votado se manifesta bem cedo muito forte, e é a tal pujança que o seu antigo Secretário particular, D. Loris Capovilla dedicou  série de opúsculos, para mostrar o legado do 'Papa bom' que desmontaria as barreiras das facções conservadoras do alto-clero. Tanto a beatificação, quanto a canonização são conquistas da áurea de santidade de um grande Papa, cuja imensa popularidade junto ao Povo de Deus, venceria todas as barreiras colocadas pela ala triunfalista do alto clero conservador.
         Hoje, os desafios que enfrenta o ânimo e a coragem desse novo Papa, que a Argentina doou ao mundo,  têm muito a ver com a batalha que terá levado, no passado, ao chamado Papa do sorriso, João Paulo I, que julgou possível juntar no próprio nome a João XXIII e ao respectivo sucessor, Paulo VI, que culminaria a obra do Concilio Vaticano II, embora em certos pontos recuasse como na sua Encíclica Humanae Vitae fizesse pesadas concessões ao pensamento conservador.
          A luta desenvolvida pelo novo Papa Francisco deve continuar. Os grandes pontífices, seja no passado, seja no presente próximo, podem ter tido surdos embates com prelados dessa Cúria, em que por  vezes se aninham as feições menos confessáveis dessa legião de anônimos que amiúde constituem a chamada vanguarda do atraso. Os seus eventuais êxitos são marcados pela transitoriedade. Quem se há de lembrar acaso daqueles supostos prelados que terão acaso brindado, no infausto três de junho de 1963 a morte desse grande Papa do século XX, cercado este último pelo elogio de seu sucessor imediato, que se chamaria Paulo VI, pela silenciosa multidão na Praça São Pedro, pelos seus colaboradores diretos,  dobrados pela aura de santidade,  daquele que o porvir mostraria como o maior Pontífice do século passado.
           O preconceito, a inveja, são reações mesquinhas, que costumam abrigar-se na sombra e nos encontros furtivos.
            A bondade, o ânimo reto e justo, a clarividência sóem dispensar os rebuços da gente pequena, que nas sombras se encontra, e para elas semelham confluir, porque o suposto segredo que as envolve, e de que tanto carecem,  lhes pouparia  do incômodo de deparar no espelho refletidas as marcas inconfessáveis da própria maldade.
               Continue Papa Francisco a sua luta, porque nela encontrarás mais do que a própria realização, senão a certeza de que enfrentas o bom combate, e que assim agindo segues o exemplo de outros grandes Pontífices, que tanto agregaram ao rebanho do Senhor.


FontesPope John XXIII, de Peter Hebblethwaite; Annuario Pontificio  1988;  Veja - artigo de Adriana Dias Lopes sobre Papa Francisco - De Costas para a Cúria.




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