sábado, 30 de dezembro de 2017

A corruptonite e suas marcas

                 

        Que os leitores me relevem esse retorno a questões que revejo nos jornais que me aguardavam na volta das brevíssimas férias de Natal.
    Como os menos moços leitores da coluna terão bem presente, o terror do Superhomem dos quadrinhos estava sobretudo nos malfeitores que sabiam de sua fraqueza diante da terrível criptonita, a qual o despojava, ainda que temporalmente, de seus super-poderes.
        Se me permitem a liberdade do comentarista, esse fenômeno dos quadrinhos de certa forma se transporta à triste realidade da América Latina, em que a corrupção é uma praga capaz de rivalizar com os bandidos adversários do campeão da justiça, no mundo binário e juvenil das antigas revistinhas.
        Já se escreveu - e muito bem - sobre essas veias que constituem autêntica praga de Latino América. Nesse contexto nauseabundo, diga-se de passagem, que o meu emprego do termo castelhano não se insere no contexto de eventual tentativa de buscarmos reivindicar um magnífico isolamento ético na matéria.
        Primo, porque a realidade o contradiz.  Secondo, porque seria vizinho do ridículo fazê-lo, tantos são os exemplos na realidade hodierna na América Latina que mostram quão presente está esse gérmen insidioso em todo o Continente americano. Se os Estados Unidos, sacudidos pelo incôngruo triunfo de candidato que é inferior a sua rival em tantos aspectos, cuidam de pôr ordem na casa através da designação do Conselheiro especial Robert Mueller III no que tange às eventuais irregularidades na eleição de Donald John Trump, vemos por sua vez em nosso continente quão largas são as teias de mãe-corrupção.
         Há por um lado a firma brasileira que reponta em muitas obras e construções do subcontinente. Não é só nos hirtos esqueletos de abandonado concreto-armado que existem na hoje miserável Venezuela e que apontam para a extensão de suas teias, na sucessão de obras inacabadas da visão fantasmagórica, como se a brusca mudança de condições desvendasse o que Eduardo Galeano já indica no seu livro pressago, sobre as veias de América Latina.
             Tampouco,  não é só o corrupto Nicolás Maduro que está envolvido nos turvos negócios com a empresa tão favorecida pelo regime petista de Lula e  Dilma Rousseff, aquele já objeto do intenso e oportuno trabalho desse grande juiz que é Sérgio Moro.
            Na verdade, vê-se quão largo é o campo lavrado pela Odebrecht. E se ela longe está de ser um cordeiro entre lobos, o que a realidade demonstra na sua exposição pelos tribunais, é que ninguém é santo nesse turvo jogo, em que se fez aposta temerária de impunidade que uma série de fatores, entre os quais a imprensa, a mídia e a sociedade enfim contribuiriam para arrancar-lhe o pluri-decenal véu de suposta mítica virtude.
            Se vemos a corrupção por tantas partes - inclusive até no futebol nacional e, nesse contexto, me pergunto por que o Brasil deva fingir que não é com ele, em termos de corrupção nas entidades de classe, subdelegando ao FBI a prisão dos ladravazes, como no caso do paredro Marin, e deixando que outros continuem à frente de seus postos, como se nada fora - pode-se verificar quão largo é o amplexo da corrupção em Latino América.
          Por ora, o gélido abraço da corrupção envolve boa parte do continente americano - norte, meso e sul - e tão triste narrativa há de repontar na Argentina e alhures.
       Essa estória continuará - e esperemos que de forma a ensinar às gerações presentes e futuras do proveito de trilhar o bom caminho - eis que, além das virtudes e benefícios inerentes às retas vias, os atalhos presentes tendem a acabar mal para os seus eventuais protagonistas.


(Fontes: O  Globo, Veias abertas da América Latina, de Eduardo Galeano)       

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