quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

A perigosa iniciativa de Trump

                    

       Como referi ontem à noite, pela Colcha de Retalhos E 52, no seu segundo ítem "Jerusalém Capital de Israel",é não só com preocupação, mas também com um misto de indignação e perplexidade que nos cabe deparar mais este propósito de extremamente dúbios motivos, e que não parece trazer nada de promissor para o futuro da causa da Paz e do respeito ao Povo palestino.
       Aquela clássica advertência de evitar confrontar questões demasiado entranhadas e que jazem dormentes por longos períodos de tempo, não deveria ser ignorada por aqueles que delas não têm o conhecimento que vem prevenindo por décadas que  sejam levantadas.
        Não se confunda, porém, essa respeitosa inação com a ignorância dos trêfegos. Será decerto por demasiado saber que um grande número de líderes árabes preferem deixá-la como está.
        A velha prudência e, sobretudo, o constrangimento do demasiado saber terá motivado  todos os governantes americanos até a assunção deste senhor Trump a evitarem envolver a cidade de Jerusalém ainda mais fundo na questão médio-oriental.
         Somente os néscios e os indivíduos dobrados pelas más intenções se animam a suscitar questões como a presente, que ao invés de aproximarem,  rasgam ainda mais fundo as chagas do Povo Palestino, e o brutal desequilíbrio que prevalece neste torrão de terra considerado sacro por tantas nações, mas que vem sendo vilipendiado pela liderança de uma dessas etnias.  
          Há um outro alarme que é sinalizado por estranhas, na aparência contraditórias manifestações.  Sabemos do nível dos assessores que, na matéria, informam e orientam o Presidente Donald Trump. Basta dizer que a chefia desse grupo de supostos expertos cai sobre os frágeis ombros do jovem Jared Kushner, cujo principal título para assumir esse delicado mister é o de ser genro do Presidente.
           A outra justificativa é o de uma alegada promessa de campanha do candidato Trump. À chamada Superpotência coube a triste sorte de ser presidida por alguém que tem a liderança contestada por muitos, e por motivos que dão vagar aos observadores, eis que não pressagiam nada de bom sobre as perspectivas do atual Presidente. No entanto, o passado continua a dar as cartas.
            Através do noticiário, no entanto, nota-se estranho silêncio. Bibi Netanyahu não se manifesta, como se o ganho fosse demasiado e ao exceder as próprias expectativas, ele prefere não externar a própria alegria.
            Não é que aquele velho dito - não desejes muito uma coisa, porque ela pode acontecer - o preocupe,  mas há de inquietá-lo que a própria fortuna se acresça tanto, e o outro lado fique de mãos abanando.
            As reações no mundo árabe são as previsíveis. Externam, pelo menos, preocupação e mesmo inquietude, pois não é sem razão que, apesar da aspiração da liderança israelense e de sua crescente afirmação - como se verifica desde Richard Nixon e o Secretário de Estado Henry Kissinger, quando cresceu notadamente a afirmação israelense no que toca à Superpotência,  jamais os presidentes americanos consideraram tal hipótese, pelo grande desequilíbrio que acarretaria.
             O simbólico é importante, e o ganho para um dos lados é tão demasiado que tende a criar um elemento desestabilizante na questão oriental.
              Mesmo a injustiça, ela carece de ser medida e de evitar-se que, de repente, um estranho no ninho venha acrescentar ao velho problema uma modificação que é de tal forma desestabilizante, que retira do Povo palestino qualquer resquício de Justiça e de direitos iguais.
             Há uma herança comum, forjada pelos séculos, que é, por assim dizer, a garante no relativo equilíbrio entre Israel e os povos árabes-palestinos.
             A isonomia entre judeus e palestinos tem sofrido duros golpes, com a continuada situação ancilar da Autoridade Palestina, e dos repetidos avanços da presença judaica no que antes era a Palestina. Se, pela flagrante injustiça da posição do Povo palestino, e sua  condição crescente de um enorme Bantustam, que por definição não dispõe de soberania autêntica, os líderes palestinos se tem empenhado por um maior reconhecimento internacional, enquanto o Estado de Israel, dominado por partidos de direita e com líderes da natureza de Bibi Netanyahu, permanece na prática um pária internacional, mas que tem a serventia de um grande trunfo, que é o do poder estadunidense.
             O pleito americano de 2016 condensou na sua campanha, na inacreditável imisção da Rússia de Putin nas fases finais da campanha e até, se tal crível seja,  na inglória conclusão com a vitória de um dos candidatos menos habilitados historicamente falando  para arrebatar, de maneira incôngrua é verdade, mas tristemente veraz a pobre eleição de 2016.
            Seria demasiado fácil dizer se houvesse do Presidente Barack Obama um pouco mais de firmeza na defesa da candidata democrata Hillary Clinton, essa "vitória" de Donald John Trump não teria jamais ocorrido. Foi aliás um funcionário, partidário do GOP, que como diretor do FBI teve desastrosa participação não só na preparação da eleição, com as suas observações fora de lugar no que tange ao uso do computador público pela Secretária Hillary Clinton - o que se efetivamente teria dado em nada, tendo em vista a correção da candidata e a sua paciência diante das grosserias deste senhor James Comey, que culminaria a sua missão com uma carta circular a oito comitês do Congresso, exatamente no período da votação antecipada, para levantar o que se provaria uma falsa lebre, eis que nada foi encontrado em mais um computador, este último do  marido separado da secretária Huma Abedin. Mas diante da inação de Mr Barack Obama, este funcionário terminou sua participação histórica com o "feito" de modificar a votação antecipada, que então ocorre, e com isso tornou possível que este senhor  Donald Trump - que já mostrara o bastante da própria inadaptação  a ser presidenciável - virasse presidente, afastando Hillary do quadro, um resultado deplorável para os Estados Unidos, e que poderemos ter presente o quanto a possibilidade de eleger alguém que, dentre os seus inúmeros erros até o presente, já congrega um invejável fardo, a começar por aqueles de que se ocupa o respeitado Conselheiro Especial Robert Mueller III.
            Não surpreende, portanto, que  o antes nunca levado sequer em consideração pelos predecessores  do atual Presidente, venha de súbito a ser retirado do cesto de Mr Trump, em estranha, bizarra manobra que nunca foi sequer cogitado  por seus muitos predecessores desde que Israel modificou pelas armas o que a novel Assembleia Geral das Nações Unidas tentara, através da chamada Partilha,  criar para a inserção de Israel, um espaço destinado a um novo país independente.
                 Cabe lamentar, portanto, a solução proposta por Mr Trump, que na verdade desestabiliza esse difícil cenário, contrariando, regido pela própria sólida ignorância, o que seus maiores cuidaram até hoje de evitar, o que infelizmente não é possível para Mr Trump e aqueles que pensam informá-lo.   



( Fontes: The New York Times; A Tangled Web, de William Bundy; A Peace to end all Peace, de David Fromkin )

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