sábado, 13 de maio de 2017

Norman

                                          

       Depois de fazer o galã em diversos filmes,  Richard Gere aceita protagonizar o papel de Norman, um fixer[1] novaiorquino, que não tem residência  e mora em dependências da sinagoga do bairro.
       Ele tem a oportunidade de sua vida ao privar, ainda que de forma ocasional, com alto político israelense, a quem, sob o impulso de um palpite, dá ao personagem encarnado por Lior Ashkenazi (Micha Eshel) um par de sapatos caríssimos que lhe cáem à maravilha.
       Ainda desconhecendo na realidade a situação social de Norman,  Micha  diz o quanto lhe é grato. Essa amizade entre o futuro Primeiro Ministro e, na prática, o morador de rua, Norman, será ainda mais realçada quando Eshel se torna Primeiro Ministro de Israel.
        Esses laços serão no futuro realçados pela mídia israelense. Lançado à fama pela relação entre o fixer e o primeiro ministro de Israel - que professa integral confiança naquele personagem humilde que lhe ajudou por um gesto de nobreza, sem qualquer objetivo interesseiro - muitos buscam o fixer para valer-se de sua influência junto a Micha Eshel.
        Viajando no metrô, Norman sente simpatia por uma mulher, a quem abre o seu coração, fazendo confidências a respeito de seu relacionamento com o primeiro Ministro de Israel. Ele ignora que ela tem atribuições oficiais e irá notificar as autoridades israelenses sobre esse suposto tráfico de influência.
         Cercado por muitos que desejam aproveitar-se de sua relação com Eshel para dela tirar proveito, o quase morador de rua busca salvar o amigo através de doações que por serem ilegais complicam ainda mais o quadro. Então o "amigo" Eshel lhe telefona, fala uma vez mais da amizade, mas consegue do vagabundo a promessa de que não implicará o seu nome, posto que acrescente que como Primeiro Ministro terá de atacá-lo. Micha Eshel dirá que a amizade deles há de perdurar, mas logo em seguida se desembaraça da carta de Norman, com o que sinaliza o corte definitivo da relação, por raison d'état (razão de estado) que lhe permite cortar a amizade e a gratidão que deve a Norman.
           Norman, ao dar-se conta da traição, se mostra moralmente superior ao Primeiro Ministro, ao pagar com os próprios fundos a melhoria na sinagoga - assim sob a assinatura de doador anônimo salva o nome de Micha Eshel - e, em seguida, comete suicídio ao comprar pacotinho de nozes, que sabia lhe causariam imediata e violenta asfixia .Basta uma noz para causar-lhe a morte.
         Norman dá oportunidade a Richard Gere de grande interpretação, talvez o  papel de sua vida. O personagem tem evidentes traços chaplineanos (Luzes da Cidade), mas o desfecho para Norman é pior ainda de o que sofre Carlitos ao ajudar a florista cega (que o reconhece pela textura da manga do casaco ao acariciá-la), eis que o vagabundo (que ela pensava fosse milionário) lhe pagara a operação que lhe devolveria a visão...
         Obviamente, param por aí as semelhanças,  porque  Norman não tem a profundeza sentimental do eterno vagabundo, e dos seus imortais personagens (o ricaço que só quando bêbedo é amigão de Carlitos), o corte espetacular da película para o cabaré e a hilariante cena em que Carlitos desce à pista para 'salvar' a moça dançarina dos safanões de seu par apache...
         Bom, mas tampouco dá pra esquecer que Joseph Cedar, o jovem diretor de Norman, não é Charlie Chaplin, nem Norman tem algo a ver com o eterno personagem do chapéu de coco e a bengalinha...



[1] não há tradução para fixer (aquele que dá jeito em coisas ou situações), papel geralmente exercido por quem não tem emprego fixo, e se vale do próprio conhecimento local para arrumar as coisas - o precário faz parte desse papel  de dar um 'jeito' em situações. 

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