Em
entrevista à Folha, publicada em 1ª
página, o presidente afirmou que ' não
renuncia; se quiserem, me derrubem'.
Sobre a entrevista em si, disse o Presidente: "Eu tenho demonstrado
com relativo sucesso que o que o empresário fez foi induzir uma conversa."
Acerca de eventual culpa, Temer respondeu: "Ingenuidade. Fui ingênuo
ao receber uma pessoa naquele momento."
Folha:
O Sr estabeleceu que ministro denunciado será afastado e, se virar réu,
exonerado. Caso o PGR o denuncie, o sr. vai
se submeter a essa regra?
Michel
Temer: Não, porque eu sou chefe do Executivo. Os ministros são agentes do
Executivo, de modo que a linha de corte que eu estabeleci para os ministros,
por evidente, não será a linha de corte para o presidente.
Folha:
Mas o sr. voluntariamente poderia se afastar.
M.T. : Não
vou fazer isso, tanto mais que já contestei muito acentuadamente a gravação
espetaculosa que foi feita. Tenho demonstrado com relativo sucesso que o que o empresário
fez foi induzir uma conversa. Insistem sempre no ponto que avalizei um
pagamento para o ex-deputado Eduardo Cunha, quando não querem tomar como
resposta o que dei a uma frase dele em que ele dizia: "Olhe, tenho mantido
boa relação com o Cunha".(E eu disse): "Mantenha isso". Alem do
quê, ontem mesmo o Eduardo Cunha lançou uma carta em que jamais pediu
(dinheiro) a ele (Joesley) e muito menos a mim. E até o contrário. Na verdade,
ele me contestou algumas vezes. Como eu poderia comprar o silêncio, se naquele
processo que ele sofre em Curitiba, fez 42 perguntas, 21 tentando me incriminar?"
Folha:
O Joesley falar em zerar, liquidar pendências. Não sendo dinheiro,
seria o quê ?
M.T.:
Não sei. Não dei a menor atenção a isso. Aliás, ele falou que tinha (comprado) dois
juízes e um procurador. Conheço o Joesley de antes deste episódio. Sei que ele
é um falastrão, uma pessoa que se jacta de eventuais influências. E logo depois
ele diz que estava mentindo.
Folha: Não é prevaricação se o sr. ouve um empresário
dentro da sua casa relatando crimes?
MT : Você sabe que não? Eu ouço muita gente, e muita gente me diz as maiores
bobagens que eu não levo em conta. Confesso que não levei essa bobagem em
conta. O objetivo central da conversa não era esse. Ele foi levando a conversa
para um ponto, as minhas respostas eram monossilábicas...
Folha: Quando o sr. fala "ótimo,
ótimo", o que o sr. queria dizer?
MT:
Não sei, quando ele estava contando que
estava se livrando das coisas, etc.
Folha: Era nesse contexto da
suposta compra de juízes.
MT: Mas veja bem. Ele é um
grande empresário. Quando tentou muitas vezes falar comigo, achei que fosse por
questão da [Operação] Carne Fraca. Eu disse: "Venha quando for possível,
eu atendo todo mundo" [Joesley disse]: 'Mas eu tenho muitos interesses no
governo, tenho empregados, dou muito emprego". Daí ele me disse que tinha
contato com Geddel [V.Lima, ex-Ministro], falou do Rodrigo [Rocha Loures],
falei: "Fale com o Rodrigo quando quiser, para não falar toda hora
comigo."
Folha:
Ele buscou o sr. diretamente?
MT: Ele tentou três vezes me
procurar. Ligou uma vez para a minha secretária, depois ligou aquele rapaz, o
[Ricardo] Saud, eu não quis atendê-lo. Houve um dia em que ele me pegou,
conseguiu o meu telefone, e eu fiquei sem graça de não atendê-lo. Eu acho que
ele ligou ou mandou alguém falar comigo, agora confesso que não me recordo bem.
Folha: Por que não estava na
agenda? A lei manda.
MT: Você sabe que muitas
vezes eu marco cinco audiências e recebo 15 pessoas. Às vezes à noite, portanto
inteiramente fora da agenda. Eu começo recebendo às vezes no café da manhã e
vou para casa às 22hs, tem alguém que
quer conversar comigo. Até pode-se dizer, rigorosamente, deveria constar da
agenda. Você tem razão.
Folha: Foi uma falha?
MT: Foi, digamos, um hábito.
Folha: Um hábito ilegal,
não?
MT: Não é ilegal porque não é da minha postura ao
longo do tempo [na verdade, está na lei 12.813/13]. Talvez eu tenha de tomar
mais cuidado. Bastava ter um detector de metal para saber se ele tinha alguma
coisa ou não, e não me gravaria.
Folha: É moralmente
defensável receber tarde da noite, fora da agenda, um empresário que estava
sendo investigado?
MT: Eu nem sabia que ele estava sendo investigado.
Folha: O sr. não sabia?
MT: No primeiro momento, não.
Folha: Estava no noticiário o
tempo todo, presidente [Joesley naquele momento
era investigado nas operações Sepsis, Cui Bono? e Greenfield].
MT: Ele disse na fala comigo que as pessoas estavam tentando apanhá-lo,
investigá-lo.
Folha:
Um
assessor muito próximo do sr.[Rocha Loures] foi filmado correndo
com uma mala pela rua. Qual sua avaliação?
MT: Vou esclarecer direitinho. Primeiro, tudo foi montado. Ele [Joesley]
teve treinamento de quinze dias, vocês que deram [refere-se à Folha], para
gravar, fazer a delação, como encaminhar a conversa.
Folha: A imagem dele correndo
com dinheiro não é montagem.
MT: [Irritado] Não, peraí, eu
vou chegar lá, né, se você me permitir... O que ele [Joesley] fez? A primeira
coisa, o orientaram ou ele tomou a deliberação: "Grave alguém
graúdo".
Depois, como foi mencionado o nome do Rodrigo, certamente disseram:
"Vá atrás do Rodrigo". E aí o
Rodrigo certamente foi induzido, foi seduzido por ofertas mirabolantes e
irreais.
Agora, a pergunta que se impõe é a seguinte:a questão do CADE foi
resolvida? Não foi. A questão do BNDES foi resolvida?Não foi."
Folha: O Rocha Loures errou ? MT: "Errou, evidentemente".
Folha:
O Sr. se sente traído?
MT: Não vou dizer isso,
porque ele é um homem, coitado, ele é de boa índole, de muito boa índole. Eu o
conheci como deputado, depois foi para o meu gabinete na Vice-Presidência,
depois me acompanhou na Presidência,mas um homem de muito boa índole.
Folha: Ele foi filmado com R$ 500 mil, que boa índole é essa?
MT: Sempre tive a convicção de que ele tem muito
boa índole. Agora, que esse gesto não é aprovável.
Folha: O sr. falou com ele
desde o episódio?
MT: Não.
Folha: O sr. rompeu com ele?
MT: Não se trata de romper ou não
romper, não tenho uma relação, a não ser uma relação institucional [com ele].
Folha: Quando o Sr. diz para o Joesley
que ele poderia tratar de "tudo" com o Rodrigo Rocha Loure, o que o
sr. quer dizer?
MT: Esse tudo são as matérias
administrativas. Não é tuuudo [alongando o 'u']. Eu sei a insinuação que
fizeram: "Se você tiver dinheiro para dar para ele, você entregue para
ele". Evidentemente que não é isso. Seria uma imbecilidade, da minha
parte, terrível.
Folha: O senhor o conheceu há quantos anos
?
MT: Quando ele era deputado, portanto,
há uns dez anos.
Folha: E mesmo o conhecendo há dez
anos, ele tendo sido seu assessor...
MT: Mas espera aí, eu conheço
513 deputados há dez anos.
Folha: Mas apenas ele foi seu
assessor próximo.
MT: Como são próximos todos
os meus assessores.
Folha: E mesmo próximo era
apenas uma relação institucional?
MT:
Institucional, sem dúvida.
Folha: Nos últimos
dias, o sr. veio numa escalada nas declarações. Acha que a Procuradoria-Geral
armou para o senhor?
MT: Eu percebo que você é
muito calma [risos]. Espero que você jamais sofra as imputações morais que eu
sofri.Eu estava apenas retrucando as imprecações de natureza moral gravíssimas,
nada mais do que isso.Agora, mantenho a serenidade, especialmente na medida em
que eu disse: eu não vou renunciar, especialmente na medida em que eu disse: eu
não vou renunciar. Se quiserem, me derrubem, porque, se eu renuncio, é uma
declaração de culpa.
Folha: No pronunciamento o
sr. foi muito duro com o acordo de delação.
MT: Não faço nenhuma
observação em relação à Procuradoria. Agora chamou a atenção de todos a tranquilidade com que ele [Joesley] saíu do
país, quando muitos estão na prisão. Ou, quando saem, saem com tornozeleira.
Além disso, vocês viram o jogo que ele fez na Bolsa. Ele não teve uma
informação privilegiada, ele produziu uma informação privilegia-da. Ele sabia,
empresário sagaz como é, que no momento
em que ele entregasse, o dólar subiria e as ações de sua empresa cairiam. Ele
comprou US$l bilhão e vendeu as
ações antes da queda.
Folha: Se permanecer no
cargo, em setembro tem de escolher um novo procurador. O Sr. acha que tem
condição de conduzir tal processo sem estar contaminado depois de tudo isso que
está acontecendo?
MT: Contaminado por esses
fatos? Não me contamina, não. Aliás, eu tiro o "se". Porque eu vou
continuar.
Folha:
É preciso alguma mudança na maneira como esses acordos são feitos? Mudança na
lei?
MT: Acho que é preciso muita
tranquilidade, serenidade, adequação dos atos praticados. Não podem se
transformar em atos espetaculosos. E não estou dizendo que a Procuradoria faça
isso, ou o Judi-ciário. Mas é que a naturalidade com que se leva adiante as
delações... Você veja, as delações estão sob sigilo. O que acontece? No dia
seguinte, são públicas. A melhor maneira de fazer com que eles estejam no dia
seguinte em todas as redes de comunicação é colocar uma tarja na capa dizendo:
sigiloso.
Folha: Esse processo dá novo
impulso ao projeto de lei de abu-so de autoridade ?
MT: É claro que ninguém é a
favor do abuso de autoridade. Se é preciso aprimorar toda a legislação
referente a abuso de autoridade, eu não saberia dizer. Abusar da autoridade é
ultrapassar os limites legais.
Folha:
O Sr. falou muito do Joesley. Mas qual é a culpa que o sr. tem?
MT: Ingenuidade. Fui ingênuo ao receber
uma pessoa naquele momento.
Folha:
Além dos áudios, há depoimentos em que os executivos da JBS fazem outras acusações. Por exemplo,
que o sr. pediu caixa dois em 2010, 2012 e 2016. Inclusive para o [marqueteiro]
Elsinho Mouco, para uma campanha da internet.
MT: No caso do Elsinho, ele fez a
campanha do irmão do Joesley, e por isso recebeu aquelas verbas. Fez trabalhos
para a empresa Diz que até recentemente,
esse empresário grampeador pediu se o Elsinho poderia ajudá-lo na questão da
Carne Fraca.
Folha: Empresário grampeador?
MT: Mas qual é o título que ele tem de
ter? Coitadinho, ele tem de ter vergonha disso.Ele vai carregar isso pelo resto
da vida.E vai transmitir uma herança muito desagradável para os filhos.
Folha: Nos depoimentos, há conversa do
Loures com o Joesley sobre a suposta compra do Cunha que é muito explícita.
MT:
Por que é explícita?
Folha: Porque eles conversam sobre
pagamentos.
MT: Você está falando de uma conversa
de Joesley com o Rodrigo. De repente, você vai me trazer uma conversa do
Joesley com o João da Silva.
Folha: O Rocha Loures não é um João da
Silva.
MT (irritado) Eu sei, você está
insistindo nisso, mas eu reitero que o Rodrigo era uma relação institucional
que eu tinha, de muito apreço até, de muita proximidade. Era uma conversa
deles, não é uma conversa minha.
Folha: Um desembarque do PSDB e do DEM
deixaria o sr. em uma situação muito difícil. O sr. já perdeu PSB e PPS.
MT: O PSB eu não perdi agora, foi
antes, em razão da Previdência. No PPS, o Roberto Freire veio me explicar que
tinha dificuldades. Eu agradeci, mas o Raul Jungmann, que é do PPS, está
conosco.
Folha: Até onde o sr.acha que vai a
fidelidade do PSDB?
MT: Até 31/12 de 2018.
Folha: Até que ponto vale a pena
continuar sem força política para aprovar reformas e com a economia debilitada?
MT: Isso é você quem está dizendo.Eu vou revelar
força política precisamente ao longo dessas próximas semanas com a votação de
matérias importantes.
Folha: O sr. acha que consegue?
MT: Tenho absoluta convicção
de que consigo. É que criou-se um clima que permeia a entrevista do senhor e
das senhoras de que vai ser um desastre, de que o Temer está perdido. Eu não
estou perdido.
Folha: O julgamento da chapa
Dilma-Temer recomeça no TSE em seis de junho. Essa crise pode influenciar a
decisão?
MT: Acho que não. Os
ministros se pautam não pelo que acontece na política, mas pelo se passa na
vida jurídica.
Folha:
Se o TSE cassar a chapa, o sr. pretende recorrer ao STF?
MT: Usarei os meios que a
legislação me autoriza a usar. Agora, evidentemente que, se um dia, houver uma
decisão transitada e julgada eu sou o primeiro a obedecer.
Folha: O sr. colocou ênfase
no fato de a gravação ter sido adulterada. Se a perícia concluir que não há
problemas, o sr. não fica em situação complicada?
MT: Não. Quem falou que o
áudio estava adulterado foram os senhores, foi a Folha [com base em análise de
um perito feita a pedido do jornal]. E depois eu verifiquei que o
"Estadão" também levantou o mesmo problema. Se disserem que não tem
modificação nenhuma eu direi: a Folha e o "Estadão" erraram.
Folha: Como o Sr. vê a OAB
pedir o seu impeachment?
MT: Lamento pelos colegas
advogados. Eu já fui muito saudado, recebi homenagens da OAB. Tem uma certa
surpresa minha, porque eles me deram espada de ouro, aqueles títulos
fundamentais da ordem, agora se comportam dessa maneira. Mas reconheço que é
legítimo.
Folha: Em quanto tempo o
sr.acha que reaglutina a base?
MT: Não sei se preciso reaglutinar. Todos os
partidos vêm dizer que estão comigo. É natural que entre os deputados... Com
aquele bombardeio, né? Há uma emissora
de televisão (TV Globo) que fica o dia inteiro bombardeando.
Folha: Essa crise atrasou quanto a retomada da economia?
MT: Tenho de verificar o que vai acontecer nas próximas semanas.
[Henrique] Meirelles (Fazenda) me contou que se não tivesse acontecido aquele
episódio na quarta [dia da divulgação do caso], ele teria um encontro com
duzentos empresários, todos animadíssimos. (Essa crise) causa um mal para o
país.
Folha: Como o sr. está sentindo a repercussão de seus dois
pronunciamentos, mais incisivo?
MT: Olha, acho que eles gostaram desse novo modelito [risos]. As pessoas
acharam que eu... Enfim temos presidente.
(Transcrito
na íntegra da Folha de S.Paulo, de 2ª feira, 22 de maio de 2017)
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